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Domingo, 25 de Maio de 2025, 07h55

GASTRONOMIA CRIATIVA

Chef europeu descobre inspiração em Chapada dos Guimarães

GAZETA DIGITAL

 

Residindo há 16 anos em Chapada dos Guimarães (67 km ao norte de Cuiabá), o basco Salomón Morales, 49, se dedica à prática de cozinha criativa, em que reinventa pratos da culinária tradicional com o uso de ingredientes mato-grossenses típicos. O chef de cozinha e ferista é apaixonado por gastronomia e encontrou na regionalidade sua inspiração. “Um quilômetro quadrado do cerrado tem espécies, plantas e frutas que jamais entrariam na imaginação de um europeu. É uma coisa louca, que lá não tem”, diz o basco.

O estrangeiro, conhecido como Sal, nasceu na região de Navarra, que integra o País Basco, uma comunidade autônoma no norte da Espanha. Desde pequeno, Morales cresceu em um ambiente gastronômico, costumava ajudar no restaurante familiar em que sua mãe era dona.

Outro hábito da infância era ir até a biblioteca local e devorar livros. Em uma dessas leituras, o basco encontrou em uma obra a existência de Cuiabá. Por meio da literatura, o Brasil e a América Latina se tornaram um fascínio. “Era uma coisa que estava no meu inconsciente, sempre foi o meu sonho poder vir para o Brasil”, comenta o chef.

Já adulto, Sal mudou-se para Granada, cidade no sul da Espanha, para cursar antropologia. Durante o curso, em 2009, teve a oportunidade de acompanhar uma amiga brasileira que realizava um estudo sobre juventude indígena na Terra Indígena Tereza Cristina, habitada pela etnia Boe (Bororo) e situada em Mato Grosso. Assim, o basco chegaria ao Brasil e nunca mais voltaria ao país de origem.

“Eu nem pensei duas vezes, deixei família, peguei minhas malas, vendi tudo o que tinha e vim para cá. Isso foi uma coisa fantástica, eu comecei a ter uma noção do que é Mato Grosso do ponto de vista que não é ocidental, de certa maneira”, afirma.

Quando chegou aqui, ele não pensava em se mudar fixamente. Entretanto, viu em Chapada a oportunidade de voltar a trabalhar com o que ama: a culinária. De início, trabalhou gerenciando e criando pratos para um restaurante vegano de um amigo.

Em 2011, conseguiu abrir o próprio ateliê gastronômico chamado “Dom Quixote”, em que criava paelhas espanholas tradicionais. No entanto, de início houve certo estranhamento do público, e ele então passou a produzir uma experiência gastronômica que mistura a culinária espanhola com toques regionais; os pratos eram exclusivos e criados diariamente.

 “Pensei em fazer gastronomia espanhola. De início, teve um choque cultural, as pessoas não estão acostumadas com uma gastronomia na qual o prato não tem uma socialização com elas”, explica o chef.  

O ateliê ficou aberto durante 2 anos, no entanto, Sal teve de ser operado por causa de uma hérnia, o que o impediu de cozinhar durante um ano. Em 2017, o basco começou a cursar geografia na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), com o intuito de adquirir um conhecimento sobre os alimentos regionais para introduzir aos seus pratos.

“A geografia me impulsionou a ter um conhecimento sobre a flora e fauna da região, produtos típicos do cerrado e saber a sazonalidade dos produtos. Poder entender o cerrado de outra maneira, poder conhecer comunidades ribeirinhas, comunidades do interior da Chapada”, argumenta.

Em paralelo aos estudos, Sal criou sua marca “Chef Sal Cozinha Criativa”, em que fabrica produtos em conserva gourmet, como geleias e molhos de pimenta, em que mistura sua experiência espanhola e também mediterrânea, por já ter visitado países do norte da África, como Marrocos.  

Durante esse percurso, ele conheceu sua esposa, que também trabalha na área de gastronomia, a chef Noeli. O casal inaugurou, no final de 2024, o Ateliê Gastronômico da Tapioca, localizado na Rua Coberta em Chapada dos Guimarães. No empreendimento, eles produzem cuscuz e tapioca especiais.

 Entre as mais diferentes, têm a tapioca indiana feita à base de um ketchup com araticum, molho de acerola e tamarindo, leite de coco e especiarias picantes. Outro destaque é a tapioca doce que leva uma burrata artesanal feita por produtores de Chapada, com goiabada cascão e maria bonita.

Com esses pratos que combinam a experiência dos chefs com a culinária brasileira e regional, o casal espera trazer ao público uma gastronomia afetiva que explode sabores.

“A gastronomia ou alimentação é uma questão social. Quando você nasce, você tem elementos emocionais ligados à gastronomia. A gente pretende fazer sempre esse link, o produto regional não é só porque é uma fruta aqui da região, mas porque as pessoas que experimentam ela já têm uma carga emocional com o produto. Acho isso mais interessante. O que queremos fazer é trazer essa questão emocional, uma gastronomia afetiva para desfrutar com os 5 sentidos”, finaliza.

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