Economia

Sábado, 19 de Março de 2022, 08h20

TRABALHISTA

Justiça anula acordo que demitiu motorista durante pandemia

Transportadora terá que quitar todas verbas rescisórias ao trabalhador

Da Redação

 

Foi julgado nulo o acordo feito por uma empresa de transporte e um motorista para pôr fim ao contrato de trabalho durante a pandemia da covid-19. O distrato havia se baseado na justificativa de ocorrência de factum principis (fato do príncipe) durante a crise sanitária mundial. A decisão é da 6ª Vara do Trabalho de Cuiabá.

Dispensado do serviço em maio de 2020, o motorista procurou a Justiça do Trabalho para cobrar verbas rescisórias, sustentando que foi obrigado a assinar o termo de acordo individual de rescisão do contrato, produzido de forma unilateral pela empresa. Disse ainda que os empregados foram coagidos sob a ameaça de que se não assinassem não receberiam as verbas rescisórias, FGTS e nem o seguro desemprego.

A transportadora, que faz parte de um grupo de empresas de viação e turismo, não contestou essas informações, o que levou o juiz Jessé Cenci a aplicar a lei e presumir como verdadeiras as alegações do trabalhador.

O magistrado também analisou o acordo de extinção contratual que enquadrou a pandemia da covid-19 como sendo “fato do príncipe”. Previsto no artigo 486 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o factum principis se caracteriza por um ato imposto à sociedade por autoridade do Estado, com base em seu poder de império, que venha a frustrar ou impedir a continuidade do contrato de trabalho independemente da vontade dos envolvidos.

Entretanto, conforme destacou o juiz, a pandemia não pode ser enquadrada como “fato do príncipe”, pois não se trata de ato de autoridade estatal, “mas sim de um evento natural imprevisível, caracterizando-se como força maior ou caso fortuito, de modo que tal hipótese não se enquadra no art. 486 da CLT”.

A mesma conclusão também pode ser observada, apontou o magistrado, ao se examinar a Medida Provisória 927, editada pelo Governo Federal em março de 2020, com as medidas trabalhistas para enfrentamento da covid-19.

Força maior

Também não se aplica à transportadora os trechos da CLT que tratam de motivo de força maior. Isso porque conforme consta na legislação, a força maior é aquela que afeta substancialmente a situação econômica da empresa, causando inclusive sua extinção, o que não ocorreu com as empresas do grupo.

Além de não comprovar graves prejuízos causados pela pandemia, a empresa não demonstrou ter tentando soluções alternativas para a superação da crise, “a exemplo de inúmeras medidas do Governo Federal colocadas à disposição das empresas de todo o país, o que me permite concluir pela inaplicabilidade dos artigos 501 e seguintes da CLT”, registrou o magistrado.

Dessa forma, declarou nulo o acordo e determinou o pagamento de verbas como aviso prévio e férias proporcionais, 13º salário e FGTS acrescido de 40%. O motorista também terá direito a receber multas pelo atraso na quitação das verbas rescisórias. A obrigação pela quitação dos valores recai sobre todas as empresas, que formam o grupo econômico, conforme pedido feito pelo trabalhador e não contestado por nenhuma delas. 

Confira também: Veja Todas