Domingo, 15 de Junho de 2025, 18h00
BIRA PRESIDENTE
Morre fundador do Cacique de Ramos e do Fundo de Quintal
O GLOBO
Morreu aos 88 anos, na noite deste sábado (14), o sambista Ubirajara Félix do Nascimento, mais conhecido pela alcunha artística de Bira Presidente. Fundador do bloco Cacique de Ramos e um dos criadores do grupo Fundo de Quintal, o bamba foi responsável por uma importante transformação no circuito das rodas de samba na capital fluminense, com a criação de uma estética sonora que prevalece até hoje no gênero musical. O músico, que estava internado no Hospital da Unimed Ferj, na Barra da Tijuca, desde o início da última semana, enfrentava complicações relacionadas ao câncer de próstata e ao Alzheimer.
Nas redes sociais, diversos artistas manifestaram pesar pela morte do sambista. A longa lista inclui nomes como os cantores Belo, Xande de Pilares e Marcelo D2. Ainda não há informações sobre o local do velório e do sepultamento do músico, que deixa as filhas Karla Marcelly e Christian Kelly, os netos Yan e Brian, e a bisneta Lua, além de amigos e admiradores do seu trabalho em prol do samba.
Revolucionário do samba
Mais velho de quatro irmãos, filho de um serralheiro e de uma mãe-de-santo, Ubirajara Félix do Nascimento foi criado em meio às rodas de samba que Seu Domingos, o pai, o levava na infância, no subúrbio do Rio de Janeiro. Aos 7 anos, foi batizado na Estação Primeira de Mangueira, convivendo, então, com lendas do gênero musical, como Donga, João da Baiana, Pixinguinha, Carlos Cachaça, Aniceto do Império, entre outros bambas, todos amigos de seu pai.
Na juventude, ao lado dos irmãos e de amigos, criou um bloco para pular carnaval pelas ruas do bairro de Ramos, onde vivia — o cordão, inicialmente, tinha o nome de "Os homens da caverna". Depois, o grupo se fundiu com outros dois já existentes. Nascia, então, em janeiro de 1961, o Grêmio Recreativo Cacique de Ramos, tendo Bira como presidente (vem daí o apelido).
Na década seguinte, a conselho da mãe-de-santo Menininha do Gantois ("Ela dizia que eu tinha que buscar um lugar com uma árvore forte", contou, numa entrevista ao GLOBO), o carioca largou um emprego como funcionário público e se instalou sob os galhos resistentes de duas tamarineiras, num terreno em Olaria, para se dedicar com mais afinco à labuta na música.
Naquele espaço — sede oficial do Cacique de Ramos até hoje — frutificaram nomes como Jovelina Pérola Negra, Beth Carvalho, Arlindo Cruz e Zeca Pagodinho, além do próprio grupo Fundo de Quintal, do qual Bira fez parte. A tamarineira, aliás, é uma atração à parte no terreiro: aos domingos, durante as rodas de samba, todos querem encostar em seus troncos, que têm a parte de baixo pintada de branco.
— Quem passa por aqui é agraciado pelas árvores, de alguma forma. Gente de todo o Brasil vem fazer pedidos. Em dias de feijoada, recebemos uma média de 15 ônibus. Fica até difícil circular — celebrou Bira, na mesma entrevista ao GLOBO, em 2018.
Sob a sombra da espécie frondosa, o samba viveu uma revolução. Até aquele período, o gênero musical se resumia a "surdo, tamborim, violão, entre outras coisas", como costumava rememorar Bira. Junto aos irmãos Ubirany, que morreu em 2020, e Sereno — todos parte do grupo Fundo de Quintal —, os músicos introduziram novas sonoridades às rodas de samba, com a criação de instrumentos a partir de elementos simples do dia a dia, como baldes, latas e papel de cimento. Assim surgiram o tantã, o repique de mão, o banjo de quatro cordas adaptado para o samba... E Bira se notabilizou com o pandeiro, elevando a importância do instrumento por meio de um jeito de tocar diferente da, até então, consolidada "levada dura" do choro, em estilo que se tornou norte para os grupos de pagode surgidos no país da década de 1970 em diante.
A gênese do Fundo de Quintal se deu, a rigor, no fim dos anos 1970. Nesse período, Bira participou de um show no Teatro Opinião com um grupo de samba em que ele atuava como pandeirista ao lado de Ubirany (no repique de mão), Sereno (no tantã), Almir Guineto (no banjo), Jorge Aragão (no violão), Sombrinha (igualmente no violão) e Neoci (também no tantã). O show foi batizado de "Samba é no fundo de quintal", mesmo nome do disco que a turma lançou em 1980. Era o início de uma das mais emblemáticas formações de samba da história, que revelou, além dos integrantes originais, outros nomes que vieram depois, como Arlindo Cruz.
A trajetória de Bira no universo do samba, junto ao Cacique de Ramos, foi documentada pelo artista plástico Carlos Vergara com o Cacique de Ramos. A parceria entre ambos, aliás, está detalhada no livro "Carnaval-Ritual: Carlos Vergara e Cacique de Ramos" (finalista do 64º Prêmio Jabuti), do escritor e professor universitário Maurício Barros de Castro. "Tudo isso faz deste livro um documento histórico e de crítica cultural precioso", explica, no prefácio da obra, o curador Luiz Camillo Osório.
A obra traz uma análise do encontro artístico entre Vergara e Bira. Nos anos 1970, o artista plástico decidiu voltar "seu olhar e sua câmera fotográfica" para o carnaval de rua do Rio, mais precisamente para o bloco Cacique de Ramos, momento em que Bira (enquanto liderança máxima e fundador do bloco) se tornou o principal parceiro do colega na execução do trabalho documental.
Patrimônio cultural
O estrelato do Cacique de Ramos veio por meio de Beth Carvalho, que gravou, em 1978, o álbum "De pé no chão", que popularizou o tal estilo "sem parafernália", como ela dizia, de se fazer samba defendido pelos bambas do bloco de Olaria. O álbum fez enorme sucesso, impulsionado pelo clássico "Vou Festejar", que permanece como um dos sambas mais emblemáticos do país até hoje.
Em 2005, o Cacique de Ramos virou Patrimônio Cultural Carioca e, em 2012, enredo da Estação Primeira de Mangueira. Detalhe: o nome do bloco, que tem foliões desfilando com trajes indígenas, foi inspirado por Conceição Nascimento, mãe de Bira. Após uma visita à Bahia, onde conheceu Mãe Menininha do Gantois, Conceição se tornou mãe-de-santo e incentivou os filhos a valorizarem a ancestralidade refletida em seus nomes — Ubirany, Ubirajara (só conhecido pelo apelido Bira) e Ubiracy. "Ela disse: 'Coloca esse nome, porque tem uma força espiritual'", recordou Bira, em outra entrevista.
Fundo de Quintal
Além de Bira Presidente (pandeiro e vocais), o grupo de samba formado no final dos anos 1970 tem como sua formação mais recente Sereno (tantã e vocais), Ademir Batera (bateria e vocais), Júnior Itaguay (cavaquinho e vocais), Márcio Alexandre (banjo e vocais) e Tiago Testa (repique de mão e vocais). Ao longo do tempo foram 33 álbuns lançados, entre trabalhos de estúdio e ao vivo.
Ao longo dos anos, diferentes músicos participaram do grupo, como Walter Sete Cordas, Cleber Augusto, Mário Sérgio, Ronaldinho, Flavinho Silva, Délcio Luiz e Milsinho.
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