Opinião

Quarta-Feira, 14 de Maio de 2025, 13h04

Rodrigo Furlanetti

O transporte de animais de propriedades do mesmo dono

Rodrigo Furlanetti

 

O ICMS incide sobre operações mercantis e sobre prestações de serviço de transporte interestadual e intermunicipal.

Essa incidência está condicionada à ocorrência de uma circulação de mercadorias ou à prestação de serviços onerosos.

Ato contínuo, no caso de transporte de bens entre estabelecimentos do mesmo titular, contudo, não há operação mercantil propriamente dita, pois não há transferência de titularidade dos bens.

Nesse contexto, se uma pessoa física ou jurídica possui duas propriedades rurais em cidades distintas, o transporte de animais entre elas, sem mudança de dono, não caracteriza operação tributável pelo ICMS.

A razão disso é que não ocorre circulação jurídica, apenas física dos animais, o que é elemento essencial para a incidência do imposto.

Além disso, alguns estados adotam o entendimento de que, quando os estabelecimentos possuem inscrições estaduais diferentes, podem ser considerados como contribuintes individuais.

Com base nessa interpretação, esses estados acabam exigindo o pagamento de ICMS sobre a entrega entre os próprios estabelecimentos do contribuinte.

Essa exigência, contudo, é juridicamente contestável , tanto na via administrativa quanto na judicial, com fundamento na Constituição Federal e na jurisdição.

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ) já firmou entendimento relevante sobre o tema: não incide ICMS sobre operações entre estabelecimentos do mesmo titular, ainda que situados em estados distintos, sendo o julgamento do REsp 1.125.133/SP (Tema 259/STJ), no qual se decidiu que tais operações não representam circulação de mercadorias, por ausência de transferência de titularidade.

O impacto desse entendimento pode, por analogia, ser aplicado ao transporte de animais vivos entre as propriedades do mesmo dono, reforçando a tese de não incidência do imposto.

Por outro lado, apesar do entendimento consolidado de que não incide ICMS sobre a entrega de bens entre estabelecimentos do mesmo titular, é importante destacar questões que podem justificar a cobrança do imposto.

Uma dessas propostas ocorre quando a legislação estadual prevê de forma expressa que o transporte de bens — inclusive animais — entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, com inscrições estaduais distintas, o que caracteriza fato gerador de ICMS, mormente, se esse transporte realizado mediante prestação onerosa.

Nessa linha, caso o produtor rural contrate um transportador para realizar a entrega de animais entre suas propriedades, poderá incidir ICMS sobre a prestação de serviço de transporte intermunicipal ou intermunicipal.

Além disso, algumas legislações estaduais sustentam que, ao se tratarem de estabelecimentos com CNPJs diferentes por exemplo, matriz e filial com personalidades jurídicas autônomas ou pertencentes a grupos empresariais distintos, poderão haver caracterização de circulação jurídica, especialmente se houver escrituração contábil distinta e autonomia operacional.

Cumpre ressaltar ainda, quando a entrega de animais estiver vinculada a operações comerciais disfarçadas, como antecipação de vendas futuras ou remessas para engorda em outra fazenda com posterior comercialização.

Ou seja, nestes casos, a fiscalização poderá entender que houve incidência comercial, atraindo incidência tributária.

Assim sendo, conclui-se que não é correta a cobrança de ICMS sobre o transporte de animais entre propriedades rurais do mesmo titular, salvo se houver disposição expressa legal estadual que configure essa transferência como prestação de serviço onerosa ou como circulação jurídica de bens.

Rodrigo Furlanetti é Advogado Tributarista em Mato Grosso.

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