Um guia ou cartilha contendo procedimentos que assegurem cuidado integral às crianças e adolescentes abrigados deve ser confeccionado para a orientação dos profissionais que atuam nas instituições acolhedoras de todo o país. Além disso, serão feitas modificações no critério de escolha dos profissionais que atuam na área da adoção, priorizando a vocação individual. Estes foram alguns dos encaminhamentos do XIX Encontro Nacional de Apoio à Adoção – Enapa, Desafios da Maturidade, realizado entre os dias 1º e 3 de maio no Centro de Eventos do Pantanal em Cuiabá. Participantes de todo o Brasil discutiram o sistema de adoção e propuseram melhorias.
“O encontro atendeu as expectativas. Esse contato favoreceu uma maior compreensão de todas as partes envolvidas no processo de adoção. Trabalharemos melhor daqui para frente. A Justiça tem muito há melhorar, mas está fazendo sua parte. O Provimento nº 36 do CNJ nos dará melhores condições de atender à sociedade”, ponderou a vice-presidente da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja), desembargadora Maria Erotides Kneip Baranjak. O provimento que terá vigência nos próximos meses determina entre outras ações a exclusividade dos magistrados que atuam nas varas da infância e deve ser aplicado em comarcas com mais de 100 mil habitantes.
Ao longo dos três dias de evento foram realizados um workshop, duas palestras, seis mesas redondas, sete apresentações culturais (entre crianças e artistas como a compositora e escritora do interior de São Paulo, Cida Ajala) e o “Enapinha”, destinado às crianças, como uma forma de convívio e estabelecimento de vínculos relacionados à adoção. Quase 800 pessoas participaram. Uma das cerimonialistas do Poder Judiciário, Vanessa Oliveira revelou ser adotada e defendeu a adoção. “Vejo como um ato de Deus. Tive uma família adotiva que mesmo com oito filhos me deu chance de estudar e crescer como ser humano, além do colo e do carinho. Esse é um ato que exige corpo, alma e coração”.
Para a presidente da Associação Mato-Grossense de Amparo à Adoção (Ampara), Lindacir Rocha Bernadon, responsável por acompanhar pais e crianças em processo de adoção, conhecer os problemas e discutir soluções é essencial para mudar para melhor o atual sistema. “Os problemas referentes à adoção foram apontados com muita coragem neste Enapa. Também tivemos várias propostas para soluções, como alteração de legislações específicas. É um sinal que também pretendem e apoiam mudanças”.
“A responsabilidade quase sempre recai sobre a Justiça, mas temos um problema maior. Devemos ter maior efetividade para atender nossas crianças, chamar mais a responsabilidade das instituições. E não digo apenas em relação ao processo de adoção, mas também no desenvolvimento e aplicação de políticas públicas que assegurem o futuro dessas crianças. É uma corresponsabilidade que deve ser trabalhada e o Enapa pode reforçar isso”, opinou o juiz auxiliar da Corregedoria, José Antônio Bezerra Filho.
A Associação dos Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), que desenvolve ações para a promoção da convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes em acolhimento institucional e a reintegração familiar, apoiou o Enapa. “Ainda temos muitas distorções em relação aos procedimentos de adoção. A partir deste Enapa poderemos sugerir correções significativas e também cobrar mais de nossos parceiros. Todos queremos o melhor para nossas crianças. A participação e apoio da Justiça são importantíssimos. Sabemos que enfrentam inúmeras dificuldades, como falta de recursos e equipes multidisciplinares. Aproveito a oportunidade para ressaltar que a desembargadora Maria Erotides foi um ganho ao evento. Saio daqui empolgada com o que foi debatido e o nível de nosso encontro”, disse a presidente da Angaad, Suzana Schettini, que ainda informou que atualmente existem 45 mil crianças e adolescentes acolhidos e cerca de 6 mil aptos para adoção em todo o Brasil.
O encontro também foi uma oportunidade de troca de experiências. A desembargadora de Mato Grosso do Sul, coordenadora da Infância e Juventude, Maria Isabel Rocha, falou sobre programas e ações desenvolvidas em seu Estado. “Muito embora a Ampara desenvolva um bom trabalho aqui, em meu Estado temos mais grupos de apoio e isso facilita o trabalho de todos. Lá também desenvolvemos ações diferenciadas, como a Justiça Restaurativa. Montamos equipes com psicólogas, cedidas pelo Estado e agimos preventivamente, evitando a judicialização de atos que podem ser reparados de forma consensual. Isto acontece em reuniões com os menores infratores, vítimas, pais, professores e a equipe. Gostei muito do Enapa e levo comigo mais conhecimentos sobre o assunto, além dos bons exemplos de Mato Grosso, como a participação maciça de magistrados e servidores daqui”, revelou.
“Para a rede de atendimento é muito interessante esta oportunidade de conhecer as dificuldades dos parceiros. A troca de experiências favorece a possibilidade de errarmos menos”, pontuou a responsável pelo Lar da Criança de Cuiabá, Eloina Rodiguere. A secretária de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria Izabel da Silva também destacou a oportunidade. “Identificamos uma série de situações que podem ser melhoradas. Ouvimos diversas sugestões e devemos fortalecer as políticas públicas para a inclusão dos adolescentes na sociedade e maior apoio aos grupos de adoção. Logo começaremos a elaborar matrizes de formação para a capacitação das famílias. O encontro foi bastante positivo”, concluiu.
O Enapa foi promovido pela Associação dos Grupos de Apoio à Adoção (ANGAAD), realizado pela Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara) e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, com o apoio do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Ministério Público, Governo do Estado e Prefeitura de Cuiabá. Em 2015, o Enapa será realizado em Belo Horizonte (MG).