Cultivar uma boa forma física e aderir a um estilo de vida “fitness” está em alta. Conteúdos de dicas de treinos dispararam nas redes sociais e o mercado das academias tem crescido expressivamente no Brasil, com estimativas de movimentar mais de R$ 20 bilhões por ano. No entanto, essa busca pelo “corpo ideal”, para além da saúde, tem feito com que muitos recorram a medicamentos sem prescrição médica para potencializar a performance dos treinos. É o caso da tadalafila.
Indicado para tratamento da disfunção erétil e ingerido como estimulante sexual, contudo, seu uso tem sido cada vez mais presente nos centros de treinamento e principalmente jovens têm feito o uso dessa substância para o ganho de massa muscular de forma rápida, o que envolve diversos riscos. É o que explica o membro do Comitê de Ética e Qualidade Assistencial da Sociedade Brasileira de Cardiologia, médico cardiologista Fábio Argenta.
“O uso da tadalafila não deve ser encorajado como pré-treino, pois sua indicação é para ereção sexual, o que pode causar um ‘roubo’ de fluxo sanguíneo das artérias do coração. No ‘roubo de fluxo’ coronariano, o sangue é desviado de áreas do coração que mais precisam de oxigênio, geralmente devido à dilatação exagerada de vasos coronarianos normais, enquanto regiões com estreitamento (por placas de gordura, por exemplo) não conseguem se adaptar. Isso reduz ainda mais o suprimento nessas áreas críticas, podendo causar arritmias e infarto”, alerta.
Levantamento feito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) revela que foram vendidas 21,4 milhões de caixas de tadalafila no país em 2020. Três anos depois, esse número havia subido para 47,2 milhões. No primeiro semestre de 2024 (o dado mais recente disponível), 31,1 milhões de caixas da medicação foram comercializadas.
De acordo com o cardiologista, o perigo é ainda maior quando combinado com anabolizantes. A aplicação destas substâncias, que não é nova nas academias, somada ao uso da tadalafila representa um grande risco. “Uso de anabolizantes aumenta em nove vezes a chance de doença do músculo do coração e em duas vezes e meia a incidência de arritmias. Aumenta em 3 vezes a chance de se ter um infarto”, explica.
Além disso, o consumo destas substâncias pode causar danos irreversíveis ao coração mesmo o paciente tendo feito um número pequeno de ciclos de esteroides, sendo que a associação de diversos tipos de anabolizantes, juntamente com seu uso prolongado, causam um estrago ainda maior ao aparelho cardiovascular.
Para a vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC-MT), Cristina Gama, o número de casos de jovens com infarto ou arritmia cardíaca nas emergências hospitalares tem aumentado devido ao abuso de esteroides anabolizantes.
Ela descreve que o uso de esteroides torna o sangue mais viscoso aumentando a chance de infarto devido à formação de trombo (coágulo) no paciente, mesmo jovem. “Não há na literatura nenhuma dose segura indicada para o uso de ganho de massa muscular ou estética”, adverte.
Os casos de infarto têm aumentado entre as pessoas mais jovens. Dados do Instituto Nacional de Cardiologia (INC) apontam que o total de casos registrados por mês no Brasil mais que dobrou nos últimos 15 anos. As internações aumentaram 160% e entre jovens de até 30 anos, o crescimento foi 10% acima da média.
“Todo praticante de atividade física, sobretudo aquelas de competição, necessita passar por uma avaliação cardiológica com médico especialista em cardiologia e exames médicos específicos podem ser solicitados para se afastar doenças do coração. A manutenção da boa forma física, hábitos alimentares saudáveis e exercícios constantes, são recomendados por todas as sociedades médicas. Entretanto, a busca incessante pela beleza estereotipada pode estar, ao invés de trazendo saúde, acobertando problemas de autoestima, que por sua vez podem refletir problemas psicológicos, tão comuns na sociedade contemporânea”, analisa Cristina.
Anvisa proíbe medicamento à base de tadalafila
Resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicada nessa quarta-feira (14) no Diário Oficial da União proíbe a comercialização, a distribuição, a fabricação, a manipulação, a propaganda e o uso de todos os lotes do medicamento Metbala, à base de tadalafila, da empresa FB Manipulação Ltda.
Em nota, a agência reguladora informou que a medida foi adotada porque o produto em questão, uma bala do tipo gummy, não tem qualquer tipo de regularização junto à Anvisa. “Além disso, a empresa identificada não tem autorização da Anvisa para fabricar medicamentos”, completou o comunicado.
“Cuidado! A automedicação coloca sua vida em risco. Esses produtos não são inofensivos. Quem faz a propaganda de produtos irregulares também comete infração sanitária e está sujeito a penalidades, incluindo multas”, concluiu a Anvisa.