A SLC Agrícola , maior produtora de grãos do país, anunciou nesta segunda-feira, 4, que revisou em 3% sua projeção de área plantada na safra 2023/2024, especialmente de soja. A correção acontece por causa de condições climáticas adversas provocadas pelo fenômeno El Niño — e serve como sinal de atenção para toda a produção de grãos brasileira.
Segundo a companhia, as condições climáticas foram "inadequadas para o desenvolvimento da soja, principalmente no Oeste do Mato Grosso, região mais afetada pela seca"."Tendo em vista a otimização do potencial produtivo das culturas será necessário realizar a descontinuação de 16 mil hectares de soja, com a transferência dessa área, inicialmente projetada para plantio de soja + algodão 2ª safra, para unicamente o plantio de algodão 1ª safra, pois possui melhor potencial produtivo", disse a companhia em comunicado ao mercado.
"Além disso, devido ao replantio de 19 mil hectares de soja, a área de do milho 2ª safra sofrerá uma redução de 7,7 mil hectares em relação ao inicialmente projetado."Para os analistas Thiago Duarte, Henrique Brustolin e Pedro Soares, do banco BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME ) , a notícia não é totalmente surpreendente. Relatos recentes sobre as condições climáticas na Região Centro-Oeste do Brasil, especialmente no estado de Mato Grosso, como EXAME vem mostrando, preocupam. "Temperaturas elevadas e chuvas irregulares comprometeram o desenvolvimento da soja plantada precocemente em diversas partes do estado, resultando em replantios. Em alguns casos, agricultores optaram por desistir da soja e antecipar o plantio do algodão", escrevem em relatório.
Na avaliação deles, apesar da redução na área total plantada, a SLC não está alterando as expectativas de custo por hectare. "Embora otimista", alertam os analistas, a meta parece alcançável. "Se incorporarmos a nova área, produtividade e assumirmos custos unitários constantes com as projeções anteriores, nossa estimativa de Ebitda para 2024 passaria de R$ 2,5 bilhões para R$ 2,3 bilhões, uma variação de -9%", diz o relatório.
Mas o grande recado para o agronegócio nacional talvez seja o reflexo que a decisão da SLC pode ter no mercado como um todo. "A SLC Agrícola é a maior e provavelmente a mais diversificada produtora de algodão e soja no Brasil. O fato de a SLC enfrentar um impacto significativo sugere que o Brasil como um todo pode enfrentar revisões para baixo nas projeções de safra de soja e, principalmente, milho", afirmam.
As últimas estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para 2023/24 apontam para uma produção total de soja e milho de 162 milhões e 119 milhões de toneladas, respectivamente (+5% e -10% ano a ano). "Achamos isso excessivamente otimista. Estamos esperando revisões para aproximadamente 150 milhões de toneladas e 115 milhões de toneladas, respectivamente, uma redução de 3% e 13% em relação ao ano anterior", dizem os analistas do BTG.
No Mato Grosso, por exemplo, o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) reduziu a área de soja prevista para a temporada 23/24 em 0,74% na relação com novembro — para 12,13 milhões de hectares. "Isso foi pautado pelo alto percentual de replantio apontado pelos informantes do Imea, estimado em 5,04% da área total prevista para o estado. Além disso, o clima quente e os longos períodos sem chuvas em vários municípios de MT têm impactado o desenvolvimento das lavouras e, em alguns talhões, já é observado o encurtamento do ciclo da soja, o que pode prejudicar no potencial produtivo da planta", informou o instituo.
No caso, a produtividade estimada também caiu, em 3,07%, na relação com a estimativa passada, ficando projetada em 57,87 sacas de soja por hectare. "Por fim, com as modificações na área e na produtividade, a produção da safra 2023/24 ficou projetada em 42,13 milhões de toneladas, queda de 3,78% ante o relatório anterior", diz o Imea, que revisou a produção da safra 2023/24 para 42,13 milhões de toneladas, queda de 3,78% em relação a novembro.
E há um ponto positivo para os resultados agrícolas: a situação deve levar a um impacto ligeiramente positivo nos preços globalmente, mas também reduzir os custos de frete para os agricultores.
Em relatório, a consultoria Céleres avaliou que os estados com produção mais robusta, como Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Goiás, passam agora por um quadro climático de estabilidade e, em alguns casos, uma melhora expressiva. "Entre eles destaca-se o Rio Grande do Sul, que, após enfrentar perdas de produtividade na safra 22/23, evidencia uma recuperação significativa no atual cenário climático", avalia a consultoria.
De forma geral, diz a Céleres, apesar do início turbulento em termos climáticos e de planejamento operacional das lavouras de soja no Brasil, a retomada de chuvas no fim de novembro e expectativas para próximo trimestre podem trazer algum alívio para potencial produtivo e limitar perdas produtivas ainda maiores para o ciclo 2023/24.
"Tendo em vista que a soma das regiões prejudicadas representa cerca de 17% da produção de soja e 13% da produção de milho nacional, é bem provável que a média
de produtividade no Brasil não seja prejudicada de forma significativa por esse fator específico", diz o relatório. "Entretanto, é possível que essas regiões sofram com uma queda de produtividade."
O atraso no plantio da safra verão apresenta um risco relevante na produtividade nacional na safra 2023/2024, podendo impactar não só a safra verão, mas também a safra inverno. Segundo a análise, mesmo com a melhora no padrão climático esperada para as próximas semanas, o ritmo de colheita de soja e plantio da próxima safra de milho inverno deve atrasar e se aproximar de "períodos não ideais para a cultura".
Diante desse cenário, aponta a consultoria, a produtividade da safra inverno tende a contar com maiores riscos e já incluir um certo prêmio climático sobre as cotações de milho em 2024. E finaliza:
"Com margens operacionais baixas para o milho inverno e janela operacional estreita, a Céleres mantém a visão de queda de área plantada na cultura de inverno para a temporada 2023/24 em quase 400 mil hectares. As condições de mercado e clima ainda deverão interferir nas decisões de planejamento da 2ª safra até meados de fevereiro, aumentando atrasos e incertezas nos mercados dentro, antes e depois da porteira."
As ações da SLC acumulam queda de 9% no ano, ante alta de 19% no índice Ibovespa.