Nunca imaginei que um dia diria isso…, mas sou mãe de oito.
Oito filhos de quatro patas, olhos estendidos e rabos que abandonam como se o mundo estivesse sempre começando.
Eu, que já fui do tempo das indiferentes — aquela que ficou que casa limpa e silêncio eram sinais de ordem — me rendi ao caos maravilhoso de patas apressadas, pelos nos tapetes e latidos que preenchem os vazios da alma.
A vida, com seu jeitinho sutil de virar a gente do avesso, me colocou diante dessas seres travessas. E bastou um olhar para que tudo mudasse.
Hoje, não me reconheço mais que não entendia o amor por um animal. Hoje, entendo tudo.
Acredito, com toda a fé que cabe no peito, que Deus olhou para mim e disse: "Essa menina precisa de bagunça. Precisa de amor que não fala, mas lambe. Precisa de companhia que não julga, só deita do lado e fica". E Ele mandou cada um deles — em doses exatas de alegria e de lição.
Mas, ah… o que Ele não me contornou foi sobre a dor. A dor da ausência, das caminhadas vazias, do pote esquecido no canto. Do silêncio que grita quando dois deles se foram.
Foi aí que descobri: amar também é saber perder.
E doeu mais quando alguém me disse que eles não têm alma. Que simplesmente... deixa de existir. E eu, no auge da minha dor, me rebelei. Como pode?
Como pode um ser que ama mais do que muitos humanos — que nos acolhe nos dias ruínas, que se alegra com nosso riso, que se entristece com nossas dores — simplesmente desaparecer?
Não. Eu me recuso a acreditar. Esses seres são anjos. Mas não de asas e auréolas. São anjos de pelos e patas.
Anjos que nos protegem com latidos no escuro, que adoecem no nosso lugar, que sentem o que nem sabemos nomear. Anjos que enxergam o que a gente ignora, que intuem, que salvam — mesmo sem sabermos fazer isso. Talvez eles não se tornem estrelas no céu. Talvez estejam por aqui, em outro plano, em outra forma... Ou talvez só morra dentro da gente, para sempre.
O que eu sei — e sei com todas as células do meu corpo — é que amar um cão é ser tocado por algo divino. É viver um amor puro, que não exige nada em troca, que só quer estar por perto. E quem tem a sorte de experimentar… nunca mais é o mesmo.
Hoje, sigo aqui. Com saudade. Com lágrimas, sim. Mas também com gratidão. Porque fui escolhido. Porque eles me amaram primeiro, antes mesmo de eu aprender a amar. E se há algo eterno nesse mundo, é isso: o amor de um anjo de quatro patas.
Jéssica Lima é formada em Artes Visuais e atua como professora de arte, com ênfase em pintura em tela e mural. Com ampla experiência no ensino e na prática artística, dedica-se a inspirar seus alunos a explorarem a criatividade e a transformarem espaços pelo meio da arte.