A juíza Celia Regina Vidotti, da Vara Especializada em Ações Coletivas de Cuiabá, negou um recurso apresentado pela Andrade Gutierrez Engenharia S.A e manteve um processo que apura um suposto pagamento indevido de R$ 2,6 milhões em um precatório. Na ação de improbidade administrativa, o Ministério Público de Mato Grosso (MP-MT) pede o ressarcimento de R$ 182 milhões aos cofres públicos, valor referente ao prejuízo oriundo dos repasses irregulares.
Respondem a ação o ex-governador Blairo Maggi, além de Eder de Moraes Dias, Francisco Gomes de Andrade Lima Filho, João Virgílio do Nascimento Sobrinho, Edmilson José dos Santos, Valdir Agostinho Piran, Piran Participações e Investimentos Ltda, Luiz Otávio Mourão, Rogério Nora de Sá, além da Andrade Gutierrez, que teria se beneficiado dos pagamentos.
O ex-presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), José Geraldo Riva, deu detalhes da suposta fraude em seus depoimentos de colaboração premiada. Ele apontou que o ex-governador Blairo Maggi estava “preocupado” com dívidas de membros do “Executivo” e do “Legislativo” com Valdir Piran, alegando temer pela “governabilidade” de sua gestão.
Inicialmente, Maggi teria “resistido” à ideia de colocar o esquema em prática – mas no final acabou “delegando” a tarefa ao também ex-governador Silval Barbosa (que na época era seu vice), e ao ex-secretário de Fazenda (Sefaz-MT), Eder de Moraes.
Com a tarefa de viabilizar o pagamento ao proprietário de factoring, Eder de Moraes “sugeriu” ao ex-governador Blairo Maggi que utilizassem um precatório, com a Andrade Gutierrez, de cerca de R$ 300 milhões, para quitar o débito com Valdir Piran. O esquema já investigado pelos Ministérios Públicos Federal e pelo MP-MT -, revelou que o empresário iria adquirir o precatório da construtora por apenas 45% de seu valor, prática que não é comum no mercado.
O Governo, por sua vez, pagaria 100% da dívida (45% seriam da Construtora e 55% foram utilizados para o pagamento das “dívidas” dos agentes públicos com Piran). José Riva contou no documento que o próprio Blairo Maggi teria confessado a realização do esquema. O Executivo estadual teria pago irregularmente R$ 276,5 milhões à empreiteira entre março de 2009 e maio de 2011, causando um prejuízo de R$ 182,9 milhões.
No recurso, a defesa da construtora alegou que os cálculos realizados no processo comprovariam a inexistência de prejuízo aos cofres públicos e que, em alguns casos, a empresa teria recebido valores menores do que em outros precatórios. Segundo a tese, ao se considerar todos os títulos, haveria um saldo credor a favor da Andrade Gutierrez, o que afastaria a necessidade de prosseguir com a coleta de provas.
Os advogados também pediram que o juízo encerrasse a fase instrutória ou, alternativamente, esclarecesse qual seria o objeto das provas orais e documentais autorizadas. A empresa sustentou ainda que não restariam pontos controversos a serem analisados, e que as provas solicitadas pela parte contrária seriam inúteis para o julgamento.
O MP-MT, no entanto, contestou a argumentação, reforçando que a Contadoria Judicial constatou pagamento a maior no precatório citado no montante exato de R$ 2.689.043,95, configurando prejuízo ao erário. Para o órgão ministerial, a discussão sobre eventuais créditos que a construtora teria direito, em outros precatórios, deve ser feita em ação própria e não pode servir para compensar o valor pago a mais.
Na decisão, a juíza destacou que os embargos de declaração só podem ser usados para sanar omissão, contradição, obscuridade ou erro material e não para rediscutir o mérito da causa. A magistrada frisou ainda que não há autorização legal para compensar valores de precatórios distintos e que, no caso, cada pagamento foi processado individualmente.
A magistrada apontou que, mesmo que a empresa alegue prejuízo em outros títulos, isso não afasta a obrigação de ressarcir o pagamento indevido, e que a fase de instrução será mantida justamente para apurar se houve dolo na conduta dos envolvidos, ressaltando ainda que o recurso seria um mero inconformismo da construtora.
“Com efeito, há que se considerar que a pretensão de rediscussão do que foi analisado e decidido, com intuito de modificar a decisão para prevalecer os fatos e teses que sustentam, pode resultar em uso do recurso dos embargos de declaração como expediente meramente protelatório. Diante do exposto, conheço dos embargos opostos pelos requeridos para julgá-los improcedentes, permanecendo a decisão embargada como foi publicada”, diz a decisão.