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Sexta-Feira, 08 de Agosto de 2025, 16h58

PARALISIA CEREBRAL

Justiça mantém fornecimento de medicamentos a jovem atendido pela DPEMT após mais de 15 anos de tratamento

Da Redação

 

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) manteve decisão de 2007, que garantiu o fornecimento contínuo de insumos e medicamentos, apesar de não estarem na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), para o tratamento de uma paralisia cerebral grave, a P.H. de A.C., hoje com 22 anos.

Em fevereiro de 2007, quando tinha apenas 4 anos, ele teve uma parada cardiorrespiratória, devido a uma intercorrência em uma cirurgia de apendicite no Pronto-socorro de Cuiabá, e desenvolveu um quadro de tetraplegia espástica, considerada a forma mais grave de paralisia cerebral.

Com isso, durante muitos anos, P. teve que utilizar uma sonda nasoenteral para ingerir alimentos e medicamentos, apresentando rigidez muscular e dificuldade de mobilidade das pernas e braços.

De acordo com o relatório médico do Hospital Geral Universitário (HGU), para onde ele foi transferido depois de passar 7 dias em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) no pronto-socorro, P. deveria tomar uma série de remédios, como Artane, Baclofeno, Clonapezanina, e Ranitidina, por tempo indeterminado.

“Diante do exposto, mantenho o entendimento anteriormente adotado, nego juízo de retratação e confirmo o v. acórdão que manteve a sentença de primeiro grau que julgou procedente a ação”, diz trecho do voto da desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos, relatora do caso.

Por unanimidade, a Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo do TJMT rejeitou o recurso da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), no dia 31 de julho deste ano.

A ação de obrigação de fazer, com pedido expresso de tutela de urgência, foi ajuizada no dia 12 de abril de 2007 pela defensora pública Maria Luziane Ribeiro de Castro, atual defensora pública-geral de Mato Grosso.

No dia seguinte (13), a liminar foi concedida pela Primeira Vara Especializada da Fazenda Pública de Várzea Grande, onde a família mora até hoje.

Em seguida, o Estado recorreu da decisão. Porém, no dia 17 de setembro, a Terceira Câmara Cível não acatou o recurso e manteve a sentença.

Contra a decisão, o ente público ingressou com um recurso extraordinário e um recurso especial, que foram suspensos pelo Tribunal de Justiça, em razão do julgamento do Tema 6 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que trata do fornecimento de medicamentos fora do rol do SUS.

Após o julgamento definitivo do tema pela Corte Suprema, os autos retornaram ao TJMT, para avaliar a eventual necessidade de retratação da decisão.

Desde 2022, o caso vem sendo acompanhado na segunda instância pelo defensor público Silvio Jeferson de Santana.

Em maio deste ano, o defensor solicitou à Justiça o prosseguimento do feito, mantendo o fornecimento dos remédios, considerando as particularidades do caso, como o fato do medicamento não ter substituto na lista do SUS, ter eficácia comprovada e uso essencial ao tratamento do paciente.

De acordo com a decisão do TJMT, o conjunto probatório dos autos, especialmente o laudo médico, demonstra que o paciente sofre de crises convulsivas desde os 13 anos de idade, com piora progressiva e de difícil controle.

“No caso em análise, não se vislumbra a possibilidade de retratação, seja à luz do conteúdo da tese firmada pelo STF, seja diante da realidade fática consolidada ao longo do tempo”, sustentou a desembargadora.

Além disso, ele já teria se submetido, sem sucesso, ao uso de outros medicamentos, o que justifica a indicação específica do medicamento para o tratamento de epilepsia, atuando no controle de crises convulsivas.

“A prescrição médica é fundamentada e circunstanciada, apontando o caráter imprescindível do fármaco para a estabilização da condição clínica da Requerente e demonstrando, portanto, a necessidade da medicação em questão como única alternativa terapêutica viável”, afirmou.

Outro ponto destacado pela magistrada é que os autos evidenciam a incapacidade financeira da família para custear o tratamento por meios próprios.

“Observa-se, ainda, que, a liminar foi deferida há mais de 15 (quinze) anos, com confirmação no mérito. Consolidou-se, assim, uma situação de fato cuja reversão, neste momento, importaria em grave violação aos princípios da segurança jurídica, da confiança legítima e da dignidade da pessoa humana”, ressaltou.

Conforme a decisão, o fato consumado é uma exceção aplicável apenas em situações muito específicas, nas quais a desconstituição do ato geraria prejuízos irreversíveis.

 

Entenda o caso – O pai levou o filho até o Pronto-socorro de Cuiabá no dia 7 de fevereiro de 2007, com dores fortes e incessantes na região abdominal.

Após exame clínico, o médico constatou que ele estava com apendicite e recomendou a imediata intervenção cirúrgica.

O pai solicitou a realização de um exame mais preciso para confirmar o diagnóstico, mas a máquina de raio-X estava quebrada. Então, ele teve que pagar pelo exame, mesmo com poucos recursos financeiros.

Com o resultado do exame, a família autorizou a cirurgia, que ocorreu no mesmo dia no Pronto-socorro. Porém, o menor teve uma parada cardiorrespiratória e ficou 7 dias internado em uma UTI.

Conforme a ação, P. teria sido vítima de um erro médico, em decorrência da aplicação de “uma quantidade exorbitante de substância anestésica”, e sofreu um edema cerebral grave, afetando sua coordenação motora.

Ele obteve alta médica e foi para a sala de pediatria do Pronto-socorro, onde ficou até o dia 26 de fevereiro, quando, por falta de remédios, foi transferido para o Hospital Geral Universitário.

O médico aconselhou a família a levá-lo para casa para realizar o tratamento, longe de possíveis infecções hospitalares.

Em fevereiro, o pai da criança registrou um boletim de ocorrência (BO), relatando o que ocorreu no Pronto-socorro Municipal.

Conforme o relatório do HGU, o paciente apresentava tetraplegia espástica grave, considerada a forma mais crítica de paralisia cerebral, necessitando de uma sonda nasoenteral para ingerir alimentos e medicamentos, e sem comunicação verbal.

O quadro de paralisia cerebral grave afeta os quatro membros (braços e pernas), com músculos rígidos, dificultando movimentos voluntários.

“Hoje, graças a Deus, ele consegue tomar líquidos e comer sozinho, do jeito dele. Ele usa um andador para se locomover. A mãe dele nunca mais voltou a trabalhar para cuidar dele”, explicou o pai, E.M. de C., 56 anos.

O marceneiro revelou que também acionou a Justiça para buscar a reparação pelo suposto erro médico que resultou no quadro de paralisia cerebral do filho.

“Foi uma situação difícil para toda a família. Ele era uma criança normal, feliz, antes da cirurgia. Não gosto nem de lembrar disso”, desabafou.

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