Cidades

Domingo, 11 de Maio de 2025, 08h37

TRANSFORMAÇÕES

Mães destacam os novos desafios e admitem medo; confira relatos

DANTIELLE VENTURINI

A Gazeta

 

Criar filhos no contexto atual, repleto de rápidas transformações, rotinas exaustivas e um cenário de crescente violência, somado ainda à presença digital, tornou-se um dos maiores desafios para as mães contemporâneas. Neste Dia das Mães (11), a sobrecarga emocional e mental, a exposição precoce às telas, a insegurança nas ruas e nas redes sociais estão entre os maiores obstáculos relatados por elas. Em diferentes fases da maternidade, para muitas, a palavra que mais se repete é medo, sentimento crescente em um cenário onde maternar exige força, equilíbrio emocional, limites rígidos e, muitas vezes, uma resistência à pressão do mundo ao redor. 

Tem dias em que eu me pego chorando sozinha, com medo do que está por vir. Não do parto, mas do mundo, revela Mariana*, 17 anos, grávida de sua primeira filha. Mesmo ainda jovem, sobre um dos seus muitos desafios como mãe, ela resume o temor de muitas: o medo de um futuro incerto e perigoso. Com oito meses de gestação, Mariana conta que sua ansiedade é constantemente alimentada pelos noticiários, pelas redes sociais e até mesmo pelo que vê na rua perto de sua casa. Penso em como vou protegê-la das coisas que vejo todos os dias na TV, na cidade, até no meu bairro. 

Suellen Jardim de Mello, 33 anos, mãe de três meninas, com idades entre 6 e 14 anos, afirma que um dos seus maiores desafios está na proteção das crianças. A maternidade, para ela, não é mais apenas sobre cuidados com a saúde e o bem-estar, mas sobre livrá-las das inúmeras ameaças que surgem a cada esquina. Suellen, que trabalha como confeiteira, conta que o medo passou a ser uma presença constante em sua vida. Medo da violência, medo de faltar o básico, medo de que alguém machuque minhas filhas, medo de não saber criar e acabar prejudicando a vida delas. 

Esse temor é mais forte quando ela reflete sobre o processo de educar suas filhas adolescentes, uma fase em que é difícil encontrar o equilíbrio. Ela compartilha que, por muitas vezes, sente vontade de mantê-las dentro de casa, em um esforço para guardar as filhas da violência e da vulnerabilidade. 

Desconstrução do machismo

Katia Nonato, 39, mãe de Felipe, de 20 anos, lembra que um dos desafios é criá-los com responsabilidade e ensinando o respeito às mulheres. Ainda vemos muitas mulheres, mesmo sem perceber, reforçando comportamentos machistas na criação dos filhos. 

Segundo Kátia, é comum que essas mães, até mesmo sem perceber, instiguem esse comportamento com pequenas atitudes do dia a dia, uma piada, uma frase, na forma como se dividem as tarefas de casa ou até nas escolhas das roupas, onde reforçam padrões preconceituosos, alimentando a cultura de violência contra a mulher. Para ela, é essencial que as mães se posicionem diante de qualquer atitude machista dos filhos. É preciso deixar claro que esse tipo de comportamento não é aceitável. 

Mundo digital

Essa ideia de proteção também é algo presente no discurso de mães que buscam, de alguma forma, controlar a vida digital dos filhos, uma tarefa que se mostra cada vez mais desafiadora. A infância, agora mediada por telas, exige da mãe um esforço constante para filtrar o conteúdo e garantir que os filhos não se percam nas armadilhas digitais. O espaço virtual, ao mesmo tempo em que oferece novas oportunidades, também abre portas para perigos como o cyberbullying, pedofilia, conteúdo impróprio e o contato com desconhecidos. 

Clarice Paulino, mãe de um adolescente de 15 anos, relata a dificuldade de acompanhar o comportamento digital do filho. De acordo com ela, o desafio maior é ser equilibrada em meio a tudo isso. Está sempre no celular. Tentei proibir, mas isso gerou apenas conflito. Agora, tento negociar, mas é difícil saber até onde estou sendo presente ou apenas controladora

Sobrecarga e planos adiados 

Em meio a esse turbilhão de desafios, muitas mães apontam o abando, pelo menos temporário, de estudos, da carreira, além das críticas, pressão social para dar conta de tudo e a ausência de uma rede de suporte como questões que tornam a maternidade um exercício de resistência, especialmente quando se é mãe de primeira viagem. 

Ethiane Gomes, 28, mãe de Ana Alice, de 1 ano e 11 meses, conta que sempre foi muito independente, estudava, trabalhava e não dependia da família ou marido. Quando engravidou, precisou deixar o último ano da faculdade de direito e até hoje não conseguiu retornar. Ela também não conseguiu um emprego flexível, o que faz com que se dedique exclusivamente a Ana Alice. Lidar com essas mudanças na rotina, com a dupla jornada em casa, além da culpa e das expectativas que a maternidade traz, tem sido um desafio. Desafio é no dia a dia, cansaço, estresse, dupla jornada, pressão, julgamentos. Sobre o futuro, sobre perder um pouco quem você é, não conseguir conquistar seus objetivos como você idealizou. 

Embora reconheça as dificuldades que enfrenta, ela destaca que sabe também que tudo isso irá passar e que se sua filha se tornará uma grande mulher. 

Limites

Janete Ferreira, 52 anos, criou quatro filhos e hoje é avó de oito netos. Com a experiência de quem viveu a maternidade em outra época, ela observa com preocupação os desafios das mães de hoje. Para ela, embora cada geração enfrente suas próprias batalhas, o contexto atual exige das mães um nível de firmeza e presença que, muitas vezes, é dificultado por fatores como o avanço da tecnologia, trabalho e a falta de pulso dos pais. Hoje as crianças mandam nos adultos. Os pais têm medo de dizer não e de impor limites. 

Para ela, a tecnologia é um dos maiores desafios e tem ocupado um espaço exagerado na infância e na adolescência, dificultando a convivência familiar e tornando a educação mais desafiadora. Os filhos não conversam mais com os pais. Estão sempre com a cara no celular. E os pais, às vezes cansados, acabam cedendo, porque é mais fácil. Janete lembra que o problema não está apenas nas telas, mas na ausência de autoridade firme e consistente em casa. Criança precisa de carinho, mas também de limite. Se não tiver os dois, cresce sem base.

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