Cidades

Segunda-Feira, 20 de Março de 2017, 23h00

“Maior Picareta do Brasil” é denunciado por dar golpes em venda de aparelhos médicos ao Governo

Justiça de Mato Grosso aceitou denúncia por improbidade administrativa

DIEGO FREDERICI

O empresário Marcelo Nascimento Rocha, conhecido como o “Maior Picareta do Brasil”, foi denunciado pelo Ministério Público Estadual (MPE-MT) por improbidade administrativa num esquema de fraudes na venda de aparelhos oftalmológicos com a participação de servidores da Secretaria de Estado de Administração (SAD-MT, atual Seges-MT). Um dos agentes públicos que faziam parte da golpe era a própria esposa de Marcelo, Hellen Cristina Carmo de Lima, que possuia acesso a contatos telefônicos das vítimas.

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) aceitou a denúncia, que também é investigada na esfera criminal da Justiça Estadual – no Direito, as instâncias criminal, administrativa e civil são independentes, podendo prever penalidades diferentes para o mesmo tipo de infração. As fraudes denunciadas teriam ocorrido entre agosto e novembro de 2010. Além de Marcelo Nascimento Rocha e sua companheira, Patricia Aparecida Ferreira, outra servidora a época da SAD-MT, também foi apontada como integrante do esquema ilegal.

Segundo a denúncia, Marcelo e as duas servidoras da SAD-MT teriam cometido estelionato oriundos de tentativas de golpes financeiros contra médicos e profissionais liberais, oferecendo a eles equipamentos oftalmológicos, utilizados para “exame de vista”, por preços abaixo do que os praticados no mercado. Para conseguir os contatos das vítimas, o “Maior Picareta do Brasil” utilizava o fácil acesso que as servidoras da SAD-MT possuíam para obter informações pessoais de seus “clientes”  - como contatos telefônicos, por exemplo.

Para aplicar os golpes, Marcelo Nascimento Rocha também se passava por “Auditor da Receita Federal”, segundo a denúncia. De acordo com o MPE-MT, ele, de posse dos referidos dados telefônicos, apresentava-se como “Wagner Monteiro”, da Receita Federal, e dizendo, inicialmente, “que precisava obter informações sobre o aparelho auto refrator Topcon, vez que um desses equipamentos havia sido apreendido em uma fiscalização e seria levado a leilão pela Receita federal”.

O “auto refrator Topcon” é um equipamento oftalmológico especializado no mapeamento de córneas. Em pesquisas na internet, é possível encontrar aparelhos usados deste tipo por mais de R$ 30 mil.

A denúncia do MPE-MT afirma ainda que Marcelo oferecia os aparelhos abaixo do preço de mercado dizendo que “bastaria efetuar um cadastro no site da Receita Federal, na página de leilões”. Assim que aprovado, segundo o golpista, seria emitido um boleto bancário (DARF) para posterior pagamento.

Porém, tudo era inventado: as vítimas não conseguiam entrar no site para efetuar o cadastro, sendo orientadas, então, a passar os dados pessoais pelo telefone para que Marcelo efetuasse a falsa inscrição dizendo que estava com o “sistema funcional aberto”. Em seguida, o falso vendedor de aparelhos oftalmológicos tentava convencer seus “clientes” a realizarem uma transferência bancária para a conta corrente “para uma tal de despachante aduaneira, em nome de Lucineia Almeida, no Banco do Brasil”, segundo a denúncia.

Em seguida, o dinheiro seria transferido para a esposa de Marcelo Nascimento Rocha, Hellen Cristina Carmo de Lima. De acordo com a denúncia, Patrícia Aparecida Ferreira, além de servidora da SAD-MT, também efetuava ligações e as transferia para o fraudador. O MPE-MT, porém, afirma que o golpe não chegou a ser concretizado pois as vítimas “não efetuaram o depósito na conta corrente fornecida”.

A denúncia ressalta ainda que “o denunciado Marcelo Nascimento da Rocha responde por outros crimes de estelionato, sendo inclusive conhecido pela mídia nacional como o maior estelionatário do Brasil.”

Todas essas informações constam no processo que tramita na 3ª Vara Criminal da Capital, do TJ-MT, que, por sua vez, baseou-se em interceptações telefônicas autorizadas pela justiça e que foram realizadas pela Polícia Federal de Mato Grosso, que investiga o roubo da aeronave Seneca II, prefixo PT-EZC – um avião bimotor que teria sido roubado por Marcelo Nascimento Rocha, em 2010, num caso investigado pela Justiça Federal.

Para justificar o uso das interceptações telefônicas, o MPE-MT argumentou que é “incontestável a importância da utilização das interceptações telefônicas, legal e licitamente, para revelar fatos ocultos e de difícil constatação, seguramente, as interceptações telefônicas, revestidas da legalidade devida, devem ser realizadas sempre quando houver o objetivo de provar que determinada infração penal está sendo praticada.”

O promotor de justiça, que assinou a denúncia em janeiro de 2014, determinou valor da causa em R$ 678,00.

Localização desconhecida

O MPE-MT solicitou ao TJ-MT que Marcelo Nascimento da Rocha seja notificado da referida denúncia que envolve seu nome, que tentava vender aparelhos oftalmológicos utilizando dados telefônicos obtidos por duas servidoras da SAD-MT, “por edital” – recurso judicial quando o órgão denunciante não consegue localizar o réu de um processo justamente para notifica-lo, sendo necessária a publicação do ato na imprensa (oficial ou particular), além de ser afixada no próprio TJ-MT.

A justiça acatou o pedido, determinando que o MPE-MT providencie a publicação de citação de Marcelo Nascimento da Rocha “em jornal local, de ampla circulação”.  A decisão é do dia 1º de março 2017.

“Maior Picareta do Brasil”

Marcelo Nascimento da Rocha ficou famoso após fingir ser Henrique Constantino, filho do proprietário da Gol Linhas Aéreas, durante uma entrevista ao programa “Amaury Junior”. O apresentador o entrevistava durante uma festa em Recife (PE), em 2001.

Se passando pelo filho do empresário, Marcelo namorou modelos e atrizes globais, pilotou jatos e helicópteros, bebia e comia do bom e do melhor a custa de “puxa-sacos”, até ser preso no Rio de Janeiro, quando dava uma carona num jato aos atores Ricardo Macchi e ao então casal Marcos Frota e Carolina Dieckman.

Porém, o comportamento do Bon Vivant foi além. Ele também se passou por repórter da MTV, baterista da banda Nenhum de Nós, guitarrista do Engenheiros do Hawaii, empresário musical, olheiro da seleção brasileira, e outros personagens da sociedade.

Marcelo Nascimento da Rocha foi preso em 2009 em Cuiabá – local escolhido por ele para morar pois “é a terra das oportunidades” -, por tráfico de drogas e roubo de avião. Ele ficou preso até 2014, quando foi beneficiado com a progressão do regime, cumprindo em casa o restante da pena.

Ele já foi preso doze vezes em diversos Estados e conseguiu fugir de nove prisões, muitas vezes, pela porta da frente.

Em março de 2014, o filme VIPS – Histórias Reais de Um Mentiroso, inspirado em sua história de vida, estreou em mais de 180 salas de cinema brasileiras . Wagner Moura interpretou Marcelo Nascimento.

Hoje, o homem conhecido como o “maior picareta do Brasil” é produtor artístico em Cuiabá, e já trouxe shows como Capital Inicial, Biquini Cavadão, Paralamas do Sucesso, além da funkeira Ludmilla e até o Mr. Catra.

 

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