Domingo, 27 de Julho de 2025, 16h38
Andrea Maria Zattar
Mandela e a Advocacia como Símbolo Universal de Resistência
Andrea Maria Zattar
No dia 18 de julho, celebra-se o Dia Internacional de Nelson Mandela, instituído pela Organização das Nações Unidas em 2009, em reconhecimento à sua contribuição inestimável para a paz, a justiça social e os direitos humanos. Inspirado por esse marco, escrevo este artigo como forma de reflexão sobre o papel transformador da advocacia — profissão que Mandela também exerceu — e seu poder como instrumento de resistência, recursos e liberdade.
Advogado por formação, Mandela fundou, em 1952, o escritório Mandela & Tambo — o primeiro escritório jurídico negro da África do Sul. Ao lado de seu sócio, atendiam centenas de pessoas negras que não tinham a quem recorrer. Em plena vigência do regime do apartheid, eles transformaram a advocacia em trincheira de resistência.
Mandela via o Direito como ferramenta de luta pela dignidade, pela humanidade, pela restituição da liberdade que o Estado retirava sistematicamente de muitos.
É impossível não fazer o paralelo com tantas realidades brasileiras. Como advogada, vejo diariamente pessoas que também estão impedidas de exercer sua autonomia: pela razão da pobreza, do cor da pele, pela precarização do trabalho, pela exclusão das políticas públicas, e pela existência de profundas diferenças sociais, econômicas e culturais.
A advocacia representa mais do que luta — representa resistência. Cabe aos profissionais militantes, comprometidos com a justiça social, resgatar o Direito como espaço de cura, de peças e de residência do humano.
A Constituição Federal de 1988 nos assegura que “a dignidade da pessoa humana” é um dos fundamentos do Estado brasileiro (art. 1º, III). Também afirma que a advocacia é indispensável à administração da justiça (art. 133).
Não se trata de comparar dores ou contextos, mas de consideração que o Direito só faz sentido se for instrumento de liberdade — não apenas a liberdade formal, mas aquela que permite ao sujeito escolher, viver, existir com dignidade.
A atuação profissional não se limita aos tribunais, mas se estende à defesa de numerosos trabalhadores — especialmente aqueles que foram calados por contratos opressores ou acordos fiscais pela necessidade de subsistência.
Mandela atravessou 27 anos de cárcere físico — e sua prisão proporcionou a liberdade de muitos. No dia em que foi libertado, fez o impensável: cumprimentou e apertou a mão de seus carcereiros. Um gesto simples, mas grandioso, que demonstrou que sua luta era pela justiça — e não pela vingança.
Ele sabia que não teria liberdade verdadeira se o ódio o mantivesse prisioneiro por dentro. É essa lição que atravessa gerações, continentes e também alcança a nossa atuação jurídica: agir com firmeza, mas também com humanidade. Defender direitos sem perder a ética. Lutar, sem nos tornarmos iguais àquilo que combatemos.
E é diante disso que nossa missão se renova: usar o Direito como ponte, não como muro.
Como advogados e advogadas, nossa atuação deve ser movida por ideias — não por rótulos. Por justiça — e não por conveniências.
Finalizo este artigo com uma frase de autoria de Nelson Mandela, que resume com precisão o espírito dessa luta:
"Estamos lutando por uma sociedade em que o povo deixará de pensar em termos de cor. Não é uma questão de raça, é uma questão de ideias."
E, assim como ele declarou em seu discurso após sair da prisão, eu também o faço:
“Saúdo todos vocês em nome da paz, da democracia e da liberdade para todos.”
ANDREA MARIA ZATTAR é advogada, membro da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS MULHERES DE CARREIRA JURÍDICA – ABMCJ
Citizenship | 28/07/2025 10:10:29
Excelente artigo da integrante da Associação Brasileira das Mulheres da Carreira JurÃdica. Assume uma importante perspectiva para compreender a atuação da advocacia. Mas, não sei se por uma questão de foco apenas, o artigo deixa de observar uma dimensão absolutamente essencial da prática de Nelson Mandela que não pode ser esquecida, a saber: Mandela, desde muito cedo, apercebeu-se dos limites da prática jurÃdica se estivesse dissociada das lutas sociais e dos esforços por mudanças institucionais significativas da sociedade, razão pela qual integrou e exerceu forte liderança num partido polÃtico, o CNA - Congresso Nacional Africano, que, sob os prismas especÃficos da sociedade sul africana, seria o equivalente ao partido comunista naquele paÃs. A "Carta da Liberdade", por exemplo, uma espécie de manifesto principal do partido, propugnava, dentre outras questões, a reforma agrária, exigindo a redistribuição de riquezas no paÃs, como forma de suplantar as desigualdades de raças, em pleno perÃodo da guerra fria, quando essa pauta era nitidamente associada à s lutas socialistas. Assim, por exemplo, hoje, no Brasil, na lutas pela Reforma Agrária, há um significativo grupo de advogados apoiadores ou diretamente provenientes dos filhos dos participantes do MST, que poderÃamos considerar como os mais dignos representantes da perspectiva do exercÃcio da advocacia segundo Nelson Mandela.
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