Mato Grosso não possui Plano de Adaptação às Mudanças Climáticas (PNA) ou estratégias para enfrentar os impactos destas mudanças. Apesar de previsto na Lei n.º 14.904, sancionada em 2024, que estabelece diretrizes para a elaboração de planos, somente oito estados brasileiros possuem o documento. É o que revela o Anuário Estadual de Mudanças Climáticas, que investiga como os estados estão se preparando para enfrentar e se adaptar a eventos extremos provocados pela crise climática. O anuário foi um dos temas debatidos no seminário A Socioeconomia do Clima, promovido pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), no Rio de Janeiro, com jornalistas de 16 capitais, organizado pelo e-mundi (Encontro Mundial de Jornalistas), no qual o Jornal A Gazeta representou Mato Grosso.
O anuário, produzido pelo Instituto Clima e Sociedade e Centro Brasil no Clima, com apoio do Instituto Itaúsa, revela que, no caso de Mato Grosso, de 2000 a 2023, os desastres naturais afetaram 5,18 milhões de pessoas. Seca e incêndios florestais estão entre os eventos mais recorrentes. O estudo indica que o aumento dos dias de seca afetou a fauna e flora do Pantanal, tornando grandes áreas suscetíveis a incêndios e alterando o ciclo natural de enchentes e secas.
Pouquíssimos estados têm os planos e menos estados ainda colocam em prática. É indispensável que o estado desenvolva o seu plano estadual de adaptação. É importante lembrar que não estamos falando de uma pauta ambiental separada da realidade das pessoas. Estamos falando de um estado que depende da agropecuária, de uma região onde a agricultura vai precisar responder às mudanças que estão acontecendo e vão acontecer no clima. Então, um plano de adaptação abrange toda uma atividade econômica que vai ser impactada por uma mudança nas chuvas, nos períodos de seca e precisamos adaptar isso, pois estamos falando do modelo de desenvolvimento do Estado, destaca Walter De Simoni, gerente de Política Climática do iCS.
De acordo com o estudo, os principais prejuízos públicos dos desastres naturais foram para o esgotamento sanitário e o setor de ensino, enquanto os privados afetaram principalmente a agricultura. Mato Grosso é o 7º estado do Brasil com maiores perdas privadas devido a desastres naturais, destacando-se incêndios florestais em municípios como Sorriso e Nova Ubiratã.
Área reduz de 87% para 60%
Conforme o Anuário Estadual de Mudanças Climáticas 2025, nos últimos 39 anos Mato Grosso apresentou mudanças significativas na vegetação nativa e de pastagem. A área de vegetação nativa, que correspondia a 87% do estado em 1985, reduziu para 60%. Enquanto, no mesmo período, aumentou em quatro vezes a área de pastagem em Mato Grosso, saindo de 6% para 24%. Outros tipos de áreas aumentaram de 7% para 16%.
O desmatamento em Mato Grosso é um fenômeno de importância nacional, sendo a maior parte das emissões decorrentes do desmatamento ilegal, que vem alterando o uso da terra no estado: em 2023, a área de vegetação nativa correspondia a 60% do território mato-grossense, uma diminuição de 27% em relação a 1985, enquanto as áreas de pastagens aumentaram em 18% no período, enfatiza o levantamento.
Mudança no uso da terra é imperativo
O Anuário Estadual de Mudanças Climáticas 2025 destaca que lidar com a mudança no uso da terra em Mato Grosso é imperativo para alcançar a descarbonização do Brasil. Os pesquisadores afirmam que o longo período de desmatamento em Mato Grosso, decorrente de pressões agropecuárias, levou a alguns desafios como conflitos agrários com comunidades tradicionais, além de impactos ambientais e queda da qualidade do solo na fronteira agrícola no estado, ocorrendo a migração do gado e da agricultura para outras regiões.
O estado tem uma economia muito pujante, baseada no uso do solo. Essa visão equilibrada de um modelo de desenvolvimento para o estado é um desafio que está posto e que a gente precisa acompanhar ao longo do tempo. É preciso uma produção com sustentabilidade. Que seja com uso mais eficiente da terra, recuperação de áreas que já estão degradadas para outros usos. Existem muitas iniciativas que estão em andamento, grandes políticas nacionais que estão sendo estruturadas para isso. Essas coisas precisam andar de mãos dadas, comenta Walter De Simoni.
Estado lidera emissões com 14,6%
Mato Grosso é o maior emissor, tanto na pecuária quanto na agricultura, com 92,4 MtCO2 (tonelada métrica de dióxido de carbono) em 2023, representando 14,6% das emissões agropecuárias nacionais. O estado possui o maior rebanho bovino do país e é o maior consumidor de fertilizantes sintéticos nitrogenados. Goiás é o segundo maior emissor na agropecuária, com 61,8 MtCO2. O anuário indica que Mato Grosso elevou suas emissões líquidas do setor agropecuário em 107% em 2023 com relação a 2000, enquanto em Goiás houve um aumento de 40%.
As emissões líquidas de CO2 referem-se à liberação de dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa na atmosfera, principalmente pela queima de combustíveis fósseis, desmatamento e atividades industriais. As emissões de carbono estão diretamente ligadas às mudanças climáticas. O aumento da concentração de CO2 intensifica o efeito estufa, resultando no aquecimento global. O que provoca o derretimento de calotas polares, elevação do nível do mar, eventos climáticos extremos (secas, enchentes, furacões) e perda de biodiversidade.
O estudo
O Anuário Estadual de Mudanças Climáticas 2025 reúne dados sobre emissões de gases de efeito estufa (GEE), riscos climáticos e as principais políticas de mitigação e adaptação adotadas em nível subnacional. O objetivo é orientar políticas públicas e destacar as oportunidades de desenvolvimento sustentável no contexto das mudanças climáticas.