Dois meses após assumir um cargo comissionado, Maria Clara, 25 anos, descobriu que estava grávida. A notícia, que a princípio deveria ser motivo de alegria, tornou-se um pesadelo. Foram dias e mais dias de preocupação e ansiedade com medo da reação do seu chefe imediato e dos próprios colegas de trabalho. O que vão pensar? Vou perder o emprego? O depoimento é fictício, mas indagações desta natureza, com certeza, fazem parte da história de vida de muitas mulheres, inclusive no Ministério Público do Estado de Mato Grosso.
A coordenadora do Programa Vida Plena, Claire Vogel Dutra, destaca que essa foi uma das preocupações apontadas por servidoras na Pesquisa de Clima Organizacional e em um levantamento do Sindicato dos Servidores do MPMT, realizados no ano passado. “A preocupação em perder o emprego e outras formas de abusos emocionais relacionados à condição de ser mulher são problemas reais que precisam e estão sendo enfrentados”, assegurou.
Segundo ela, algumas estratégias para contemplar as singularidades das gestantes estão sendo estudadas para constar no projeto de igualdade de gênero. Esclareceu ainda que às servidoras comissionadas está sendo assegurada a estabilidade provisória, prevista nos arts. 6º, 7º, XVIII e 39, §3º da Constituição Federal de 1988 c/c art. 10, II, “b”, Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), caracterizada pela impossibilidade de se dispensar arbitrariamente ou sem justa causa a servidora gestante desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Para garantir este direito, vem sendo realizada, neste período, nomeação de profissional em substituição.
Explicou também que o Programa Vida Plena tem como proposição a implementação do projeto institucional de combate ao assédio e outros tipos de violência gerados a partir de condutas machistas. Além disso, a Administração Superior tem buscado ampliar os direitos humanos das mulheres integrantes da instituição.
Entre as conquistas, ela cita a concessão da licença maternidade, nos casos de nascimento prematuro, a partir da alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe (o que ocorrer por último). A mudança foi regulamentada pelo Ato Administrativo 973/2020 e possibilita um tempo maior de convivência entre a mãe a criança, a amamentação e os primeiros cuidados.
Enfatiza também que desde 2014 o MPMT oferece o auxílio-creche. “Esse auxílio constitui um importante direito para a entrada e permanência das mulheres no mercado de trabalho, visto que precisam fazer arranjos familiares para conciliar os cuidados domésticos com o trabalho produtivo”, observou.
CONDUTAS MACHISTAS: A analista assistente social do MPMT, Renata Teixeira, alerta que muitas vezes no ambiente de trabalho ou até mesmo em casa, mulheres são vítimas de condutas machistas. Ela cita como exemplo situações como interrupção da fala e do raciocínio (mansplaining e manterrupting).
O mansplaining acontece quando um homem explica coisas óbvias à mulher, muitas vezes com um tom paternalista, como se ela não fosse intelectualmente capaz de entender algo, desconsiderando seu conhecimento sobre a questão. Já o manterrupting acontece quando homens interrompem falas de mulheres, seja para silenciar a temática falada ou interpelar em assuntos que elas dominam.
“Ambas as formas são estratégias de silenciamento e desqualificação de ideias. Isso acontece por causa do machismo, preconceito que desvaloriza socialmente a mulher, como a tendência de ver homens como líderes e mulheres como subordinadas”, explica Renata Teixeira.
Ela alerta também que abusos emocionais relacionados à condição de ser mulher acontecem com o objetivo de fazer todos pensarem que a trabalhadora não é capaz ou está fora de si, perdendo sua autonomia e autoridade. “Estes abusos se dão principalmente por meio de falas machistas de desqualificação. O que está em jogo nestas ações é a manipulação psicológica para desqualificação da mulher”.