A abertura foi realizada pelo presidente do TJMT, desembargador José Zuquim Nogueira, que destacou a relevância do momento e a responsabilidade institucional do Judiciário mato-grossense diante das diretrizes traçadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na ADPF nº 347, que reconheceu a existência de um estado de coisas inconstitucional nas prisões brasileiras.
“É importante que a gente ouça todas as pessoas que fazem parte do sistema penitenciário para fazer um plano com dignidade. É o momento de repensar nosso sistema falho, ineficaz, inclusive no que se refere ao tratamento humano do reeducando e também da possibilidade de reinserção na sociedade”, afirmou Zuquim.
“Temos que estar conscientes de que o preso está impedido do exercício da liberdade plena, mas não pode ser sujeito à tortura ou maus-tratos. Isso só fomenta o ódio e a reincidência criminal. É hora de discutir com seriedade e fazer a sociedade acordar para seu papel fundamental nesse processo”, completou.
Zuquim reforçou o pioneirismo do Judiciário estadual na iniciativa e comparou o plano a uma semente plantada. “Hoje nós estamos lançando no solo uma semente, buscando o quê? Germinação e crescimento. Para ela se tornar frondosa, precisa ser cuidada. O Judiciário se propõe a isso”.
O Plano Pena Justa, desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é considerado um marco na história do sistema penal brasileiro, com mais de 300 metas nacionais a serem cumpridas até 2027. O plano visa consolidar um sistema penal centrado na dignidade humana, no uso eficiente dos recursos públicos e na promoção da segurança coletiva.
“Essa audiência é muito importante porque vamos ouvir a sociedade. Ela também tem que estar envolvida na recuperação dos nossos reeducandos. Precisamos colher informações e experiências, algumas bem-sucedidas, outras nem tanto, para aprimorar o sistema”, disse.
“Temos que trabalhar para que haja respeito à dignidade do ser humano que cumpre pena. É isso que deve orientar o funcionamento do sistema prisional”, completou Perri.
O juiz Geraldo Fidelis, coordenador do GMF-MT, lembrou que o STF determinou que cada estado desenvolvesse seu próprio plano, respeitando as particularidades locais.
Fidelis destacou ainda que a iniciativa surge de uma constatação gravíssima. “O plano nasce da realidade do sistema penitenciário brasileiro, onde os direitos mais básicos estavam sendo violados. O STF reconheceu esse estado de coisas inconstitucional e determinou a criação de soluções concretas. E não adianta fingir que está tudo bem. É preciso olhar no olho do problema e enfrentá-lo com coragem”, enfatizou.
Segundo ele, Mato Grosso já tem um esboço técnico do plano, mas ele precisa ser aprimorado com base na realidade trazida pelos participantes da audiência. A entrega da versão final está prevista para este mês de julho.
Também presente à mesa de abertura, o secretário de Estado de Justiça, Hugo Bruzulato Teixeira, afirmou que o objetivo central da audiência é ouvir a população.
“Acreditamos na ressocialização por meio do trabalho, da educação, e esperamos um dia muito produtivo, com propostas que nos ajudem a avançar em direção a um sistema prisional mais humano”, completou o secretário.
A audiência pública foi cuidadosamente estruturada para garantir participação democrática e representativa. Foram selecionadas 40 pessoas com base em critérios de diversidade, como raça, gênero, identidade LGBTI, etnia indígena e vínculo com o sistema prisional. As falas foram organizadas em torno de quatro eixos temáticos, apresentados ao longo do dia:
Pela manhã:
EIXO 1 – Controle da Entrada e das Vagas do Sistema Prisional
Trata de questões como superlotação, sobrerrepresentação da população negra e o uso excessivo da pena privativa de liberdade.
EIXO 2 – Qualidade da Ambiência, dos Serviços e da Estrutura Prisional
Aborda problemas como a arquitetura inadequada, maus-tratos, deficiência nos serviços e desvalorização dos servidores penais.
No período da tarde:
EIXO 3 – Processos de Saída da Prisão e da Reintegração Social
Foca na qualificação da soltura, na reinserção no mercado de trabalho e no suporte social aos egressos.
EIXO 4 – Políticas de Não Repetição do Estado de Coisas Inconstitucional
Discute ações para prevenir novas violações, com foco no combate ao racismo estrutural e no fortalecimento de políticas públicas.
A programação inclui participação híbrida, com transmissão ao vivo pelo canal do TJMT no YouTube, tradução simultânea em Língua Brasileira de Sinais (Libras), além da realização da Feira de Egressos, no saguão do Auditório Gervásio Leite, no TJMT, onde pessoas que passaram pelo sistema prisional expõem seus produtos e compartilham histórias de superação.
O evento segue até às 17h, com escuta ativa e colheita de propostas, que irão compor a versão final do Plano Estadual Pena Justa de Mato Grosso, a ser entregue ainda neste mês.
O Comitê de Políticas Penais do Estado de Mato Grosso é coordenado pelo juiz Geraldo Fernandes Fidelis Neto, coordenador do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF/MT) e pelo secretário de Estado de Justiça, Vitor Hugo Bruzulato Teixeira.