Fechado há pouco mais de três anos, o casarão onde funcionou a antiga Casa Orlando, na esquina do Calçadão da Galdino Pimentel com a Rua Sete de Setembro, no Centro Histórico de Cuiabá, pode ter perdido parte de sua característica original. A possível perda é resultado de uma reforma cujo projeto de recuperação não foi aprovado pelo Instituto do Patrimônio e Artístico Nacional (Iphan/MT). O órgão informou que irá encaminhar uma equipe de fiscalização ainda nesta semana ao local.
Edificado em dois pavimentos, o sobrado em estilo eclético é datado do fim do século 19. Na semana passada, o administrador do grupo “Cuiabá de Antigamente”, no Facebook, Francisco das Chagas Rocha, com autorização dos responsáveis que se encontravam no local, entrou na casa e verificou que todo o piso do casarão foi removido.
"Estava tudo revirado. Tiraram todo o piso sextavado e antigos da época da construção da casa", comentou. "Depois disso, conversei com a superintendente do Iphan (Amélia Hirata) que disse que a obra não tem autorização do órgão, mas que iria ver se haveria alguma documentação anterior solicitando (a reforma)", acrescentou.
A reportagem do Diário esteve no local ontem e também constatou vários pisos entulhados, muitos quebrados, e o reboco das paredes removido deixando expostas as pedras cangas e os tijolinhos, que foram usados na construção. No prédio, havia um rapaz responsável pelo casarão, que informou que a obra está paralisada. Do lado de fora, containers cheios de lixo. A reportagem não conseguiu manter contato com os atuais proprietários do imóvel.
Chagas frisa a importância da reforma, mas também a necessidade da preservação das características coloniais do sobrado. "É importante que se mantenha as características originais. Chegaram a dizer que tiraram o piso para a levar Minas Gerais para restaurar. Mas, eu conversei com (empresário) Ricardo Palma Arruda, que é quem mais preserva casarões em Cuiabá, que compra e reforma, sobre o que está acontecendo na Casa Orlando e ele disse que essa história de mandar para Minas Gerais é conversa fiada por que esse piso quando é retirado geralmente danifica", informou.
Procurada pela reportagem do Diário, o Iphan/MT informou que recebeu duas solicitações para intervenções no imóvel, uma em 2015 e outra em 2016. "A última pretendia a recuperação do imóvel original, reforço de cobertura, reparo de paredes, construção de cinco salas no pavimento térreo e três no pavimento superior, construção de banheiros. Não houve aprovação do Iphan visto que ambas foram devolvidas para adequação do projeto, especialmente, para detalhamento da proposta", frisou. O Iphan-MT garantiu ainda que está atento ao caso e que já está prevista uma fiscalização a partir desta semana no casarão.
De acordo com informações do site "Almanaque Cuyabá de Cultura Popular" a presença da família Orlando na capital iniciou-se com a vinda de Francesco Orlando, nascido na Itália. Ele foi casado com a cuiabana Balbina do Amarante, irmã do coronel Manoel Corsino do Amarante. Ainda, conforme o site, o prédio foi construído pelos irmãos italianos, João e José Sardi, sendo que em 1873, junto com os irmãos Giuseppe e Vicenzo Orlando, Francesco fundou a firma "Orlando Irmãos e Cia".
Em 1959, os proprietários retornaram para a Itália, deixando o comércio sobre a gerência de Egídio Laraya e Giovanino Pecora. Naquele mesmo ano, o estabelecimento tinha como gerente o senhor Humberto Santa Lucia, que permaneceu no posto até 1978, quando a Casa Orlando foi extinta, encerrando suas atividades após 150 anos presente no comércio cuiabano.
Antes de fechar, no imóvel funcionou uma loja de materiais esportivos por vários anos. “Após 37 anos no casarão, tive que desocupar em junho de 2015 e amargando prejuízos com a alegação que o prédio seria reformado, o que não foi feito até hoje”, comentou Armando Omais, dono da Olímpica Esportes.
Em matéria intitulada "Três irmãos italianos erguem prédio arrojado e eclético", o Diário mostra que os irmãos Francesco, Giuseppe e Vicenzo Orlando, chegaram a capital a fim de trabalhar no comércio e na exportação da borracha. Logo, os três instalaram-se no endereço que até hoje é conhecido como a Casa Orlando.
"Edificada em dois pavimentos num terreno de esquina, o casarão teve seu pavimento térreo concebido para abrigar o comércio da família", revela a reportagem. "Há um certo arrojo, até então não percebido em construções mais antigas nas quais predominavam a mão-de-obra desqualificada dos escravos", acrescenta.
Conforme a publicação, a casa Orlando é caracterizada pelo ecletismo, que emergiu em Mato Grosso, especialmente na capital, após o incremento das relações com o resto do país e o fim da Guerra do Paraguai. "Ecletismo nada mais é do que a conciliação das características coloniais com elementos importados em decorrência do desenvolvimento tecnológico e do intercâmbio com o mundo", conta. "É a conciliação da busca de tudo que era melhor com a ideia compulsiva de progresso, fazendo com que tudo que fosse de novo e utilizável na Europa chegasse encaixotado aqui no Brasil por meio de navios", completa.
O Centro Histórico da capital mato-grossense conta com aproximadamente 400 imóveis tombados em conjunto (Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico da capital), sendo apenas um deles tombado também isoladamente. Neste último caso, trata-se da Igreja do Rosário e São Benedito (tombado em 1975).
Esses bens, estão situados em uma área tombada, que compreende, basicamente as Ruas Pedro Celestino (antiga Rua de Cima), Ricardo Franco (do Meio) e a Galdino Pimentel/7 de Setembro (de Baixo) e imediações das Ruas 27 de dezembro, Cândido Mariano, Avenida Mato Grosso, entre outros. Imóveis nessa região só podem ser reformados com o projeto aprovado pelo Iphan, como é o caso da Casa Orlando.
Benedito Add?r
Domingo, 20 de Maio de 2018, 10h20Benedito Add?r
Domingo, 20 de Maio de 2018, 09h09