Opinião Sexta-Feira, 13 de Junho de 2025, 17h:08 | Atualizado:

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Suzimaria de Souza Artuzi

A Recuperação judicial começa, mas o crédito some: o drama das empresas

 

Suzimaria de Souza Artuzi

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Suzimaria artuzi

 

Quando uma empresa entra em crise, a recuperação judicial pode ser a única saída. O objetivo é dar fôlego ao negócio, reorganizar as dívidas e retomar o crescimento. Mas, na prática, mesmo após a recuperação ser aprovada, muitas empresas continuam sem acesso ao dinheiro de que precisam para se manter vivas.

O resultado? Uma falsa esperança que pode se transformar em novo sufoco: sem crédito, não há recuperação real.

1. Recuperação Judicial Sob Bloqueio Financeiro

Logo após o deferimento, a empresa obtém proteções legais como a suspensão das cobranças. Mas, na prática, instituições financeiras e fornecedores retraem seu apoio: cortam limites de crédito, rescindem contratos e impõem condições difíceis. Muitos passam a tratar a empresa como “quase falida”, mesmo com respaldo judicial. É como liberar o oxigênio, mas manter todos os outros suportes cortados.

2. DIP: Permissão Legal, Realidade Prática Distante

A Lei nº 11.101/2005, atualizada pela Lei nº 14.112/2020, introduziu os artigos 69-A a 69-F, que autorizam o financiamento DIP (Debtor-In-Possession), um instrumento que permite que empresas em recuperação obtenham crédito novo com garantias específicas.

Porém, na prática, poucas instituições financeiras se arriscam a oferecer esse tipo de operação, por falta de regulamentação própria e segurança jurídica. O resultado? A empresa fica juridicamente protegida, mas economicamente fragilizada.

3. Impactos que Extrapolam a Empresa

A falta de crédito afeta mais que o próprio empresário:

• Credores: ficam sem receber;

• Funcionários: correm risco de perder seus postos;

• Cadeia produtiva: é prejudicada pela quebra de parceiros;

• Judiciário: investe tempo em processos que podem terminar em falência evitável.

4. Estratégias Reais para Quem Está em Crise

Para superar esse cenário, é preciso ir além do pedido judicial:

1. Antecipe o acesso ao crédito: negocie com parceiros, investidores e fornecedores ainda antes de entrar com o pedido judicial.

2. Elabore um plano viável e transparente, com metas claras de faturamento e pagamento.

3. Transforme ativos em garantias reais: imóveis, equipamentos, contratos ou recebíveis podem ser usados para obter recursos.

4. Comunique-se diretamente com stakeholders, mostrando que a empresa está em recuperação — e não falência — e tem condições de cumprir seus compromissos.

5. Conte com apoio jurídico qualificado para apresentar projetos estruturados de financiamento ao juiz.

6. Diversifique as fontes de crédito, buscando parcerias com fintechs, fundos, cooperativas ou investidores.

5. Fontes Alternativas de Crédito

Algumas opções que vão além do crédito tradicional:

• Fundos “distressed”, que financiam empresas em reestruturação (ex.: Jive Investments, G5 Partners).

• Fintechs de crédito estruturado, com análise rápida e garantias diversas (ex.: Nexoos, BizCapital).

• Factoring e FIDC, para antecipar recebíveis.

• Garantias fiduciárias, utilizando ativos da empresa mesmo em recuperação.

• Adiantamentos de clientes estratégicos, em troca de descontos ou benefícios futuros.

• Equity rescue, com investidores aportando capital em troca de participação.

6. Conclusão

A recuperação judicial não pode ser vista apenas como uma pausa nas cobranças. Muito menos como um alívio automático. O deferimento do processamento representa, sim, um fôlego jurídico importante, mas ele não garante a sobrevivência econômica da empresa.

Para que a recuperação seja de fato eficaz, o empresário precisa compreender que a verdadeira reconstrução começa com a reorganização interna do negócio. Isso inclui, de forma prioritária, a manutenção de uma contabilidade clara, atualizada e confiável. Empresas que apresentam confusões contábeis, documentos inconsistentes ou ausência de registros operacionais correm sério risco de perder a confiança do Judiciário, dos credores e até de potenciais financiadores.

Não é razoável esperar que instituições financeiras, investidores ou fornecedores confiem numa empresa que não consegue demonstrar minimamente como opera, quanto fatura, o que deve e como pretende pagar. A recuperação exige transparência, responsabilidade e, acima de tudo, uma postura madura diante da crise.

Portanto, mais do que buscar crédito, o empresário precisa mostrar que a empresa tem condições de se recuperar com seriedade. E isso passa, inevitavelmente, por gestão profissional, contabilidade organizada, plano factível e execução comprometida.

A recuperação judicial pode ser um novo começo. Mas ela só cumpre esse papel quando vem acompanhada de verdadeiras mudanças internas e não somente da espera do Poder Judiciário!

Elaborado por Suzimaria Maria de Souza Artuzi - Advogada proprietária do Escritório Advocacia Souza Artuzi, contadora, mediadora judicial inscrita no CNJ e TJMT, Administradora Judicial em Processos de Recuperação Judicial e Falências no TJMT. É Perita Contábil em processos cíveis no TJMT. Pós-graduada em Direito Tributário, Pós-graduada em Direito Processual Civil, associada ao Instituto Brasileiro da Insolvência (IBAJUD), foi Tesoureira da OAB 22ª Subseção de Primavera do Leste – MT nas gestões 2016 à 2021, é Membro da Comissão de Estudos da Recuperação Judicial e Falências da OAB/MT Gestão 2025/2027, Membro da Comissão de Direito Bancário da OAB SP, do Instituto Brasileiro de Insolvência (Ibajud), do CRM (Centro de Mulheres da Reestruturação Empresarial), do Iwirc Brazil, Diretora de Mídias Sociais do #hastagporelas, e atualmente Presidente da Comissão de Estudos e Recuperação Judicial da 22ª Subseção da OAB Primavera MT.

Referências Bibliográficas:

1. BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, extrajudicial e falência do empresário.

2. BRASIL. Lei nº 14.112, de 24 de dezembro de 2020. Altera a Lei nº 11.101/2005 para dispor sobre o financiamento DIP.

3. SACRAMONE, Marcelo Barbosa Fortes. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. São Paulo: Saraiva, 2022.

4. COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. São Paulo: Thomson Reuters, 2021.

5. OLIVEIRA, Pamela Gubiani de; MACHADO, Luís Antônio Licks Missel. “A contabilidade e a recuperação judicial”. Revista Perspectiva Contábil, SEER/FACCAT, 2015.

 

 





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