Opinião Terça-Feira, 11 de Maio de 2021, 11h:03 | Atualizado:

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Gonçalo de Barros Neto

Fatos e ilusões

 

Gonçalo de Barros Neto

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Uma das preciosidades para o macro e micro sistema de Justiça é o testemunho. Mas, tem o testemunho importância epistemológica? As conclusões formuladas a partir de testemunhos têm valor na teoria do conhecimento? 

Um dos mais importantes pensadores da ciência moderna, David Hume enfrentou essa questão, a qual passou a largo de muitos outros. 

No seu ensaio sobre os milagres, na seção X da sua obra “Investigações Sobre o Entendimento Humano", Hume mostra que a crença nos milagres não é fundamentada, vez que se baseia no testemunho e, a partir deste, aceita uma ruptura no funcionamento das leis naturais. Essa posição vem sendo considerada como um reducionismo epistemológico, visto concluir que para se saber algo com fundamento é preciso que o próprio sujeito conhecedor tenha acesso direto à ocorrência empírica à qual esse conhecimento se refere ou, ainda, consiga desenvolver por si o raciocínio que levou à conclusão defendida. 

Prossegue Hume, afirmando que, nas questões de fato, a experiência é o único guia, e assim mesmo falível. Trabalha-se com a questão de confiabilidade e de probabilidade, apesar de frisar a importância do testemunho, considerando-o necessário à vida humana. 

A confiança no testemunho não decorre de um raciocínio automático e “a priori” com a realidade, mas na probabilidade considerando a realidade. 

Contudo, a partir do séc. XX, filósofos têm se debruçado sobre o valor epistemológico do testemunho (Coady, por exemplo). Não precisa ir muito longe, bastando lembrar que a reflexão científica parte muitas vezes do testemunho de outros cientistas.

Assim, que diferença há entre as afirmações “eu vi” e “me contaram”? 

No processo judicial haverá importância quanto às inferências resultantes a partir da indução e dedução de tudo o que se encontra na quadra da demanda, em especial se as afirmações acima respondem ou não à mesma pergunta. Se satisfatoriamente responderem, não haverá diferença substancial entre elas.  

Indiscutível é a existência de um “gênio maligno” (Descartes) incomodando os operadores do Direito no sentido de induzir dúvidas e criar ilusões. Vencê-lo será tarefa de quem busca, endogenamente, a verdade formal (a real sempre dependerá de aproximação para mais ou para menos).  

No espectro das delações premiadas, as coisas tendem a complicar ainda mais em razão dos interesses políticos maiores e subjacentes aos processos, que nunca são de partes bem definidas, mas a definir.  

O testemunho produz conhecimento e é importante para a epistemologia, disso parece não haver mais dúvidas na melhor filosofia. 

No Direito, em que é a figura mais emblemática, seu grande valor é indiscutível, mesmo considerando o alto grau de subjetividade. A diferença estará na capacidade dos agentes que o operam no descortinar das situações apresentadas. A competência fará toda a diferença e será dela a cereja do bolo, ainda que envenenado por acidez verborrágica e documental dos que trilham o despreparo intelectual e humano. 

É por aí...

GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO é graduado em Filosofia e Direito pela UFMT, onde foi professor concursado, especialista pela Universidade Pública de Lisboa, MBA/FGV, mestrando em Sociologia (UFMT), autor da página Bedelho.Filosófico do Facebook e Instagram (email: [email protected]). 

 





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