Opinião Segunda-Feira, 13 de Julho de 2015, 08h:46 | Atualizado:

Segunda-Feira, 13 de Julho de 2015, 08h:46 | Atualizado:

Gonçalo Barros Neto

Justiça, ainda que tardia

 

Gonçalo Barros Neto

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Qual seria a diferença entre julgar com justiça e julgar com equidade? O julgar com justiça pressupõe a lei como fundamento, incluindo o próprio processo de formalização de normas e os princípios que o informam, dentre eles se destaca a independência dos poderes. 

Julgar com equidade tem por origem o predicado da razão. Se estiver a julgar os fatos pela razão, o que me informa como princípio não é a lei posta, positivada, mas a capacidade que tenho em distinguir o certo do errado. 

Vê-se, portanto, que julgar com justiça é tarefa para especialista, pois, o justo é normativo, vale dizer - legal. Daí o porquê de se ter Tribunais de Justiça. Por outro norte, se os fatos me vêm a julgamento e os apreendo pelo filtro da equidade, o que se tem é a razão, devendo o julgador, que não precisa ser especialista do Direito, decidir entre o certo e o errado ou verdadeiro e o falso. 

No júri, por exemplo, o que há de certo ou errado fica a cargo do povo, representado no conselho de sentença. O justo, com o juiz togado. Quando a razão decide, cabe ao justo dosar a intensidade. Quando a equidade se manifesta pela tolerância do comportamento do agente, o justo nada pode fazer, a não ser quedar-se e se conformar, visto que o Estado não pode ser maior que o cidadão. 

O ser enquanto comunidade faz seu julgamento e o realiza a cada piscar de olhos. Prescinde do Direito. De forma sumária, utiliza o conhecimento adquirido, em especial pelos sentidos, e o inato para apenar seu semelhante. É o que há pela natureza das coisas.

O operador do Direito, nesse aspecto, segue a palavra da lei. Julga como especialista, não tendo a seu favor a escusa da ignorância ou da inapetência intelectual. Pode considerar a lei injusta? Sim, claro. Decidir entre o justo e o injusto, eis sua tarefa. 

Contudo, lhe é defeso julgar por equidade. E por quê? Porque a razão, para ele, já está na lei, que tem sua representação maior no povo, representado pelo Parlamento.

Aconselho, sobre o tema versando, aos que gostam e não têm preconceitos em face dos filósofos, como se possível fosse tê-los contra os fundadores da civilização, que erraram por sua época, mas acertaram, e muito, no conjunto, a leitura da magnífica obra de Hobbes, ‘Diálogo entre um Filósofo e um Jurista’, em especial no capítulo ’O Rei é o Juiz Supremo’.

Os ’modismos’ no Direito, como a reiteração subjetiva, o ’alternativismo’, a citação de princípios constitucionais de conteúdo aberto (a dignidade humana é um exemplo, vem servindo a tudo sem que se saiba, com objetividade científica, o seu conteúdo e alcance), têm seu limite no exercício da leitura, da boa leitura. 

O especialista em Direito pode entender pela injustiça na aplicabilidade de determinada norma a um determinado fato concreto? Repito, a resposta é afirmativa, sempre o será. Longe de considerá-lo a ’boca’ da lei. Mas ele também não é o príncipe que a tudo pode. 

O certo e o errado já estão contidos na lei, segundo a vontade do representante do povo. A justeza pode ser iníqua a seus olhos? Sim, mas ainda assim é justa. Lembremos: a equidade tem muitas faces e moradas.

A injustiça tem sempre como parâmetro a normatividade em seu conjunto, daí a inconstitucionalidade. Mas da razão, a lei só se afasta por obra do legislador e nunca do entendimento dos que a operam no e perante os tribunais. 

É por aí...

GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO é juiz de Direito em Cuiabá.

[email protected]





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Comentários (1)

  • Artur Campos Oliveira

    Segunda-Feira, 13 de Julho de 2015, 11h08
  • Profunda reflexão. Após ter lido recentemente "Retórica-Aristóteles", vou ler a obra recomendada pelo ilustre articulsta. Concordo com a afirmação de que o juiz pode aplicar a letra da lei - positivismo (como também pode deixar de aplicar) para fazer justiça - Streck). A teoria de Montesquieu do juiz como "a boca que pronuncia a letra da lei", de há muito está superada pelo da racionalidade de Aguillera pois aquela seria usar remédios velhos em doenças novas. Também porque aquele personagem nunca existiu, e nunca existiu porque a tal "boca da lei" é uma ficção.
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