O empresário do agronegócio, Cesar Jorge Sechi, acusado de mandar matar o advogado Renato Gomes Nery, ao ser preso na última sexta-feira (9), recebeu os policiais civis de forma fria, debochada e irônica. Em uma entrevista coletiva realizada nesta segunda-feira (12), o delegado Caio Albuquerque, da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), revelou que Cesar alegou que tudo não passa de um equívoco.
A morte de Renato Nery teria custado R$ 200 mil. "A gente percebe, pelo comportamento dele, que ele acredita que nada vai ficar comprovado e que até conseguirá a liberdade. Mas temos elementos suficientes para afirmar que ele é um dos mandantes. Temos provas que podem ser até documentais, além de falas de pessoas próximas a ele. No começo, a investigação é muito esparsa, mas no final as coisas vão se afunilando. É natural que um vá entregando o outro... Essa ironia será desmistificada. Por trás dessa ironia do empresário, está a consciência de que a verdade chegou", destacou Caio Albuquerque, que informou ainda que o empresário vem mantendo a posição de que houve um equívoco desde os depoimentos.
A Polícia Civil de Mato Grosso concluiu, na sexta-feira (9), a primeira etapa do inquérito que apura o homicídio do advogado Renato Nery. A PC identificou o caseiro de uma chácara em Várzea Grande, Alex Roberto Queiroz, e o policial militar Heron Teixeira Pena Vieira (cabo) como envolvidos diretamente na execução do crime, com detalhamento específico da atuação de cada um deles.
Os dois foram indiciados pelo crime de homicídio qualificado pela promessa de recompensa e por recurso que impossibilitou a defesa da vítima. As investigações da DHPP identificaram um casal, moradores do município de Primavera do Leste, como mandantes do crime.
Tratam-se dos empresários do agronegócio Cesar e Junienere Goulart Bentos. A motivação do crime foi uma disputa de terra avaliada em R$ 500 milhões.
Eles foram delatados pelo cabo Heron Teixeira, que não teria recebido todo o valor combinado para intermediar o homicídio de Renato Nery. Ambos tiveram a prisão temporária decretada pela Justiça, e as ordens foram cumpridas na última sexta-feira.
De acordo com as apurações, o policial militar foi o intermediário contratado para realizar o “serviço”. Ele conseguiu a arma de fogo usada no homicídio e foi quem a repassou ao caseiro da chácara, que pilotou a motocicleta Honda Fan até o local do crime e efetuou os disparos que atingiram o advogado. Durante as diligências, foi constatado que tanto o militar quanto o caseiro monitoraram a vítima por vários dias.
Também foi comprovado que, no dia anterior ao homicídio (4 de julho), o caseiro parou com a moto próximo ao escritório do advogado, no mesmo horário e exato local de onde atirou na vítima no dia 5 de julho. Nesses dois dias, o caseiro conduziu a moto Honda Fan.
As provas demonstraram que o crime foi premeditado e que a intenção era assassinar o advogado no dia 4. Porém, por algum motivo alheio, o crime não se consumou na data planejada, provavelmente devido a uma circunstância inesperada.
No dia 5 de julho, após cometer o homicídio em frente ao escritório de advocacia, na Avenida Fernando Corrêa da Costa, em Cuiabá, o executor percorreu cerca de 30 quilômetros até chegar à chácara localizada no bairro Capão Grande, em Várzea Grande. Todo o trajeto da motocicleta foi registrado por diferentes câmeras instaladas nas vias públicas.
No dia 8 de julho, a equipe da DHPP conseguiu acessar a última câmera, que captou imagens da moto a menos de 2 quilômetros da chácara. Diante dessa descoberta, no dia 10 de julho, todo o efetivo da DHPP foi empregado para realizar buscas na região do bairro Capão Grande, com o objetivo de localizar a motocicleta, que até então era a principal pista da investigação.
O delegado Bruno Abreu, que presidiu o inquérito, explicou que essa movimentação intensa de policiais civis nas proximidades da chácara causou temor aos dois suspeitos quanto à localização da arma de fogo e alcance das autorias. “As evidências indicam que o intuito era abandonar a arma usada no homicídio, fazendo com que a situação de confronto se mostrasse real e, com isso, levasse à possível incriminação das pessoas abordadas na ocorrência do suposto confronto registrado no dia 11 de julho”, disse Bruno Abreu.
Com a conclusão desse inquérito e os indiciamentos dos dois envolvidos, o caseiro e o militar seguem presos preventivamente à disposição da Justiça. Os autos foram encaminhados ao Judiciário e ao Ministério Público Estadual para oferecimento de denúncia.
DELAÇÃO À VISTA
Entre o casal apontado como mandante, a mulher aceitou colaborar com a investigação e irá prestar depoimento, acompanhada de advogado. O homem segue negando o crime e permaneceu calado durante todo o depoimento. A conduta dos dois será apurada em um inquérito complementar.
Outros quatro militares foram indiciados em outro inquérito da DHPP que apurou o confronto entre criminosos e a Polícia Militar, ocasião em que foi encontrada a arma utilizada no assassinato do advogado. A suposta ocorrência foi registrada sete dias depois do homicídio.
A investigação tramitou de forma distinta e simultânea ao inquérito sobre o homicídio de Renato Nery. Ao contrário da versão apresentada pelos militares, de que as pessoas abordadas na ocorrência faziam uso de arma de fogo, constatou-se que aquelas pessoas não estavam armadas na ocasião.
A investigação apurou, com base em exames periciais e outras provas, que as armas apresentadas pelos militares foram colocadas na cena do crime após o suposto confronto. Os quatro envolvidos foram ouvidos mais de uma vez sobre a ligação da arma com o homicídio do advogado, mas os militares reservaram-se ao direito de permanecer em silêncio.
Vale lembrar que, até o momento, não há indícios de participação direta dos demais militares na execução do homicídio do advogado. O inquérito sobre o confronto, concluído na semana passada, aponta o envolvimento dos quatro no sentido de ocultar a impunidade do crime anterior, pelo fato do grupo ter descartado a arma de fogo usada no homicídio de Renato Nery.
A DHPP instaurou um inquérito complementar para esclarecer outros fatos ocorridos após o homicídio do advogado. Um dos pontos será o pagamento feito ao militar e ao caseiro, bem como a identificação da pessoa que efetuou o pagamento, além de rastrear por onde o armamento passou até aparecer na cena do suposto confronto e averiguar as condutas de outras pessoas que atuaram como intermediárias do homicídio.
Renato Nery foi assassinado aos 72 anos, com vários tiros de pistola calibre 9 milímetros, no dia 5 de julho do ano passado (2024), em frente ao seu escritório, na capital. Ele foi socorrido e submetido a uma cirurgia em um hospital privado de Cuiabá, mas morreu horas depois do procedimento médico. Desde a ocorrência, a DHPP realizou inúmeras diligências investigativas, com levantamentos técnicos e periciais, a fim de esclarecer a execução do advogado.