Cidades Domingo, 20 de Setembro de 2015, 23h:16 | Atualizado:

Domingo, 20 de Setembro de 2015, 23h:16 | Atualizado:

PROFESSOR OFENDIDO

Advogado não consegue indenização de cursinho de Direito em Cuiabá

Juiz alega que não se comprovou nenhum prejuízo a imagem

RAFAEL COSTA
Da Redação

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O juiz substituto da 10ª Vara Cível de Cuiabá, Fábio Pettengil, rejeitou pedido de indenização por dano moral ao advogado e professor Alfredo José de Oliveira Gonzaga por considerar ofensiva uma propaganda da Esud (Escola Superior de Direito de Mato Grosso). Conforme narrado na petição inicial, Gonzada afirmou ter sido professor e coordenador pedagógico da instituição no período de 2004 a dezembro de 2008, oportunidade em que obteve elevados níveis de aprovação e de satisfação dos alunos.

Ele alegou que atuando como coordenador das disciplinas de Penal e Processo Penal,  produziu material didático para aplicação nos cursos preparatórios para o Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),  alcançando média de aprovações sempre iguais ou superiores a 85%. Porém, a partir do último trimestre do ano de 2008, por decisão da diretoria da empresa, foi encerrada as turmas presenciais.

Segundo ele, a partir daí, ressaltou que a decisão administrativa gerou grave ofensa à sua honra e imagem como professor. Isso porque a instituição de ensino ordenou a divulgação e distribuição de propaganda  ofensiva a todos os professores da área penal.

O anúncio informava que as aulas seriam tele-presenciais, a partir do Exame de Ordem 01/2009, pois os índices de aprovação do curso presencial representou um fracasso, ao atingir somente 15% de aprovação. Ofendido com a propaganda, Gonzaga alegou a publicidade seria “mentirosa e abusiva”, e ainda feriu a sua honra pois atingiu a um público de 1,5 mil alunos da escola no período e desvalorizar à sua capacidade profissional.

Em contestação, a Escola Superior de Direito alegou que Gonzaga se desligou da instutição porque tinha a pretensão de abrir seu próprio negócio educacional, concorrendo com seu antigo empregador. Além disso, sustentou que “nunca foi do feitio do diretor da empresa negativar a imagem, ou maldizer seus antigos empregados, inexistindo qualquer ofensa à honra no caso em concreto”

Na decisão judicial, o magistrado considerou estranha a decisão da instituição em ofertar uma propaganda negativa contra si mesma. Porém, não restou comprovado nos autos do processo nenhuma espécie de dano moral. “É certo que a notícia do baixo índice de aprovação atingiu a imagem e credibilidade do autor, porém uma outra indagação se faz necessária para solucionar a contenda: esse anúncio era falso? Alterou ou mascarou a realidade? Ou somente foi um tiro no próprio pé dado pela empresa demandada, que saiu a revelar e propagar seus fracassos? É é estranho que um curso preparatório faça publicidade negativa de si mesmo e de seu índice de aprovados, mas daí a concluir que tal publicidade é enganosa vai uma distância imensa”, diz um dos trechos.

 

ÍNTEGRA DA DECISÃO

Trata-se de ação indenizatória movida em face de alegada violação à honra objetiva (reputação) do requerente, que teria sido violado em seus direitos personalíssimos por conduta ilícita atribuída à ré.

Afirma o peticionante que foi professor e coordenador pedagógico da requerida no período de 2004 a dezembro de 2008, obtendo nesse espaço de tempo grandes níveis de aprovação e de satisfação dos clientes/alunos da escola em que laborava.

Salienta que como coordenador das disciplinas de Penal e Processo Penal da requerida produziu material didático para aplicação nos cursos preparatórios para o Exame da Ordem dos Advogados do Brasil, sendo que nesse mister alcançou-se retumbante sucesso, com média de aprovações sempre iguais ou superiores a 85%, mas que, a partir do último trimestre do ano de 2008, por decisão da Diretoria da empresa, decidiu-se por encerrar as turmas presenciais.

Salienta, ainda, que essa decisão foi imotivada e culminou com grave ofensa à sua honra/imagem como professor, porque não se contentando com encerrar o curso que vinha sendo bastante eficaz, a direção da requerida acabou por confeccionar, divulgar e distribuir propaganda claramente ofensiva a todos os professores da área penal do ESUD, anunciando que as aulas seriam tele-presenciais, a partir do Exame de Ordem 01/2009, uma vez que os índices de aprovação do curso presencial dessas disciplinas havia sido um fracasso, com somente 15% de aprovação.

Aduz, assim, que tal publicidade, claramente mentirosa e abusiva, ofendeu-o em sua honra, tanto no aspecto objetivo, porque divulgada há, no mínimo, 1500 pessoas (alunos da escola no período), quanto no âmbito subjetivo, porque veiculadora de desvalor à sua capacidade profissional.

Calha, registrar, ainda, que anteriormente ao ajuizamento da ação indenizatória (demanda principal), propôs o requerente medida cautelar preparatória, a fim de obstar a veiculação de publicidades, anúncios, folders, chamadas televisivas denegrindo a imagem do autor como professor, assim como sua exclusão do quadro de docentes do curso preparatório comercializado pela ré, que era veiculado no sítio eletrônico dela.

Foi deferida a medida liminar preparatória, não havendo a ré apresentado defesa na ação cautelar, que, após a propositura da principal, foi apensa a estes autos.

Na ação principal a requerida apresentou contestação, levantando preliminar de ilegitimidade passiva, porque a seu juízo a pessoa jurídica jamais poderia cometer qualquer ofensa contra a honra/imagem de ninguém, porque não age por vontade própria.

No mérito, argumenta que, na verdade, o professor/requerente se desligou da escola/requerida porque tinha a pretensão de abrir seu próprio negócio educacional, concorrendo com seu antigo empregador, salientando, ainda, que nunca foi do feitio do diretor da empresa negativar a imagem, ou maldizer seus antigos empregados, inexistindo qualquer ofensa à honra no caso em concreto.

Manifestou-se o autor sobre a defesa e, ato contínuo à frustrada tentativa de conciliação, dispensou a produção probatória, quedando-se a ré silente sobre eventual interesse na instrução do feito.

É o relatório.

Fundamento e Decido.

Antes de adentrar ao cerne da controvérsia, calha assinalar que serão aqui analisadas as duas ações verbalizadas pelo autor, proferindo-se sentença única, para a demanda cautelar e para a principal.

Dito isso, é preciso que, de plano, seja afastada a preliminar brandida pela ré, porque à toda evidência a tese de que a pessoa jurídica nada mais é do que a extensão de seus sócios é algo tão longínquo e ultrapassado que não merece maiores encômios.

Já se acha superada a dicotomia entre “negativistas” e os adeptos das chamadas teorias da personificação da pessoa jurídica, porque de há muito tempo prevalece em nosso sistema positivo o entendimento de que elas vivem de modo autônomo, independente, dotadas de direitos e deveres distintos dos de seus membros.

Colhe-se da boa doutrina:

“Todo ordenamento jurídico é destinado a regular a vida dos indivíduos. Não se pode negar que o Direito tem por finalidade o homem como sujeito de direitos. No entanto, assim como se criam institutos jurídicos em prol dos indivíduos, tais como a propriedade, os direitos obrigacionais, os direitos intelectuais, criam-se pessoas jurídicas como forma de se atribuir maior força ao ser humano, para realizar determinadas tarefas, as quais, sozinho ou em um grupo amorfo de indivíduos sem comando e estrutura, seriam inconvenientes ou impraticáveis. 

Da mesma forma que o Direito atribui à pessoa natural direitos e obrigações, restringindo-os em certos casos, também existe essa atribuição para as pessoas jurídicas. Há para cada tipo de pessoa certas condições objetivas e subjetivas prescritas pelo ordenamento. Portanto, o conceito de pessoa jurídica é uma objetivação do ordenamento, mas uma objetivação que deve reconhecer tanto a personalidade da pessoa física, quanto da jurídica como criações do Direito. Desse modo, encara-se a pessoa jurídica como realidade técnica”(VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: Parte Geral, 9ª. ed. São Paulo: Atlas, 2009, v. 1, p 231

Rejeito, pois, a questão isagógica e passo ao juízo de fundo.

Nesse diapasão, o simples compulsar dos autos revela que a controvérsia judicial se restringe, exclusivamente, a definir se o anúncio veiculado pela ré, no qual dizia que as aulas das disciplinas de Direito Penal e Processual Penal do curso preparatório ao Exame de Ordem que se iniciaria em 26/01/2009, seriam ministradas pelos professores da rede tele-presencial “Prima”, em virtude de baixo índice de aprovação (15%) da turma anterior, é capaz de produzir danos extrapatrimoniais à pessoa do autor.

Primeiramente é de se reconhecer ser truísmo concluir que a pecha de “baixo índice de aprovação” pespegada a um curso preparatório para concursos e exames, é realmente deletéria e depõe contra a confiabilidade e a reputação da escola.

E, do mesmo modo, esse rótulo atinge aos professores deste “cursinho”, afinal o produto principal comercializado por empresas do gênero é, exatamente, a qualidade/expertise do corpo docente em alcançar resultados confiáveis e efetivos.

Destarte, é mesmo presumível que o corpo docente das disciplinas da seara penalista da ESUD passou a ser visto com desconfiança ao menos pela comunidade acadêmica frequentadora dessa espécie de escola preparatória, uma vez que sobre eles recaiu o encargo desabonador de terem obtido somente 15% de aprovação no Exame de Ordem do final do ano de 2008.

Destaque-se, inclusive, ser meio ininteligível o comportamento da requerida, porque veiculou publicidade que depunha contra ela própria, sendo de se presumir as razões do fracasso dessa empresa em anos seguintes, como é de notório conhecimento social.

Entretanto, e é esse o nó górdio da questão judicializada, ainda que a publicidade tenha sido negativa, que a mensagem de baixo índice de aprovação tenha comprometido a credibilidade do curso e dos professores da área de Direito Penal, a mim não parece possível fixar qualquer obrigação de indenizar, ou seja, reconhecer a incidência da responsabilidade civil, sem que estejam presentes todos os elementos caracterizadores desse dever jurídico.

Estamos a dizer que, para a caracterização do dever de indenizar são necessários pelo menos: conduta voluntária e ilícita ou violadora de deveres de garantia impostos pela lei ou por contrato e o dano como resultado desse agir contrário ao Direito (nexo de causalidade).

Pois bem, no caso em riste, já se disse que os danos experimentados pelo autor e pelos demais professores da área de Direito Penal do curso preparatório réu são presumíveis (ou seja, se verificam in re ipsa), porque é mesmo indesejável e maléfica a marca de pior índice de aprovação dentre as disciplinas oferecidas pela escola.

Entretanto, a questão é investigar se esse dano presumido decorre de um ato ilícito ou proibido pelo Direito, que possa ser atribuído à ré.

Vale dizer: é certo que a notícia do baixo índice de aprovação (15% em Direito Penal) atingiu a imagem/credibilidade do autor, porém uma outra indagação se faz necessária para solucionar a contenda: esse anúncio era falso? Alterou ou mascarou a realidade? Ou somente foi um “tiro no próprio pé” dado pela empresa demandada, que saiu a revelar e propagar seus fracassos?

A resposta a tais indagações é impossível, ao menos a quem não seja diretamente envolvido no imbróglio judicializado, porque nos autos não há nada que esclareça tal fato.

A única passagem em que se fala sobre o índice de aprovações em Direito Penal no Exame de Ordem do ano de 2008, é quando em sua inicial, o autor admite que “o Exame de Ordem 2008.2 CESPE/OAB, teve uma aprovação em direito penal, EM TODO BRASIL E NÃO SOMENTE NO ESTADO DE MATO GROSSO, inferior aos certames anteriormente aplicados...” (sic – fl. 12/TJ).

Ora, se o próprio autor reconhece que o índice de aprovação foi “inferior aos anteriores”, não é possível concluir, sem qualquer prova, que o anúncio veiculado pela empresa ré foi inverídico.

Repita-se: é estranho que um curso preparatório faça publicidade negativa de si mesmo e de seu índice de aprovados, mas daí a concluir que tal publicidade é enganosa vai uma distância imensa.

Sem prova de que o ato reputado ilícito (anúncio da baixa aprovação), fosse de fato mentiroso, inverídico, irreal, não é possível acolher a pretensão vestibular, porque ausente um dos pressupostos da obrigação de indenizar.

Cabe salientar que não é toda situação desagradável pela qual passamos cotidianamente que se mostra passível de reparação, pois há de se ter um mínimo de tolerância frente aos desgostos, dissabores, infortúnios a que estamos sujeitos.

Nesse sentido, para que se configurasse o dano moral a ensejar indenização, necessário se fazia que o ofendido demonstrasse que a lesão por ele reclamada adveio de um comportamento do réu contrário ao Direito, como bem leciona a jurisprudência:

“Para o deferimento de indenização por danos morais é necessário examinar a conduta do agente causador do fato, verificar sua reprovabilidade e a potencialidade danosa da conduta em relação ao patrimônio imaterial da vítima, sopesando a situação em face do sentimento médio da população, objetivando reprimir a prática de condutas que atinjam a honra, a imagem e outros direitos inerentes à personalidade”(TRF 4ª Região. Apelação Cível. 200171120011770).

Não demonstrado o ato ilícito, inexiste dever de indenizar, devendo a ação principal ser julgada improcedente.

Doutro lado, no que concerne à tutela de garantia (cautelar), como bem salientado no relatório, deferida a medida liminar, para que cessasse a publicidade dos folders, e se excluísse o nome do autor como professor da instituição de ensino, divulgado no site da empresa, a ré quedou-se inerte quanto ao ônus de se defender, cabendo, assim, concluir que anuiu aos argumentos iniciais, os quais, inclusive, foram acolhidos liminarmente e produziram seus efeitos, esgotando-se a finalidade da medida acautelatória.

Em face do exposto, com base no art. 105 do CPC, sendo conexas as ações cautelar e principal, aprecios-as de modo único e simultâneo, e, nos moldes do art. 269, I, do CPC, julgo procedente a ação cautelar e improcedente a principal, acolhendo, tão somente, os pedidos acautelatórios vertidos na ação tombada sob n. 2009/39 (suspensão da a veiculação da publicidade nos folders do curso para Exame da Ordem 2009/1, bem como determinação da a exclusão do nome do autor do sitio eletrônico mantido pela empresa), a fim de confirmar a liminar deferida in initio littis e que já esgotou sua finalidade, até mesmo porque, como é de sabença pública, a escola requerida nem atividades educacionais desenvolve mais.

Ocorreu, in casu, hipótese sui generis de sucumbência recíproca, sendo o auto vencedor na demanda cautelar e vencido na ação principal, devendo, assim, ser sopesada a distribuição dos ônus sucumbenciais, que divido em 75% para ele e 25% para o réu.

Arbitro os honorários advocatícios em R$ 3.500,00, os quais deverão ser repartidos aos patronos das partes, na proporção inversa da fixação da responsabilidade pelas custas processuais.

Traslade-se cópia desta sentença para os autos em apenso.

P.R.I.C.

Cuiabá, 3 de setembro de 2015. 

FABIO PETENGILL

Juiz de Direito Substituto





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