O conselheiro Antônio Joaquim, do Tribunal de Contas do Estado (TCE), determinou a suspensão de uma licitação de R$ 18 milhões, feita pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT). Segundo a empresa que denunciou supostas irregularidades no certame, haviam medidas restritivas, que beneficiariam apenas duas concorrentes, que acabaram vencendo o processo licitatório.
A Representação de Natureza Externa (RNE) foi proposta pela empresa Rosemberg Carriel Viana ME (Ortopédica Novelli), que apontou supostas irregularidades em um pregão eletrônico promovido pela SES-MT tendo como objeto a contratação de empresa especializada no fornecimento de próteses sob medida de membros inferiores e superiores, incluindo a confecção, montagem, alinhamento e assistência técnica de aparatos ortopédicos.
Os equipamentos, assim como a garantia dos recursos de tecnologia assistiva, deveriam ser fornecidos para posterior concessão aos usuários da oficina ortopédica do CRIDAC/CERIII pelo valor total anual estimado de R$ 18.258.067,75. A empresa apontava, no entanto, a existência de requisitos no edital que limitavam a competitividade, como a exigência de que as licitantes tenham sede ou filial em Mato Grosso.
De acordo com a ação, a exigência favoreceu duas empresas localizadas em Cuiabá: Wellington Leandro Barbosa da Silva (ITOP) e Geneilson Gomes de Oliveira (COP - Centro de Órteses e Próteses), criando um direcionamento no certame. Outro item questionado era a obrigatoriedade das empresas participantes de terem fisioterapeutas em seus quadros, afirmando ser desnecessário e desproporcional para o objeto da licitação, pois a prestação dos serviços pode ser feita por técnicos ortopédicos.
Por fim, a empresa apontava que as duas empresas vencedoras apresentaram preços significativamente acima da tabela do Sistema Único de Saúde (SUS) e de pregões anteriores, sugerindo superfaturamento e prejuízo ao erário. Como exemplo, citou que a SES adquiriu, em 2021, próteses transfemurais por R$ 3.249,00, e agora vai pagar R$ 6,4 mil, valor registrado na ata da licitação, o qual está acima da tabela do SUS, e que, para confecção do dispositivo, gasta-se apenas R$ 1,8 mil.
Em sua defesa, a SES apontou que a exigência de sede ou filial em Mato Grosso se deve para garantir o atendimento eficiente, de alta qualidade, contínuo e frequente dos pacientes que necessitam de próteses sob medida, assegurando a manutenção e ajuste com prontidão, minimizando períodos de espera e, consequentemente, complicações de saúde e custos adicionais.
Foi pontuado que as próteses ortopédicas demandam manutenção regular, de modo que uma empresa local facilita a realização de serviços preventivos e corretivos, permitindo um acompanhamento mais próximo e ágil, o que é essencial para evitar falhas que possam comprometer a mobilidade e a qualidade de vida dos pacientes.
Com relação à exigência de fisioterapeuta no quadro de funcionários da empresa participante, foi detalhado que o fornecimento de próteses sob medida envolve uma série de etapas críticas que impactam diretamente a funcionalidade e a qualidade de vida dos usuários, de modo que a presença do profissional visa garantir melhor padrão de controle de qualidade, assegurando que as próteses não sejam adequadas apenas do ponto de vista técnico, mas que também promovam a funcionalidade e a qualidade de vida dos pacientes, minimizando riscos e otimizando resultados.
Na decisão, o conselheiro destacou que a jurisprudência admite a restrição geográfica, desde que devidamente justificada, de modo a comprovar que a localização da empresa é indispensável à execução satisfatória do objeto do futuro contrato e que os apontamentos feitos pela SES para a medida são adminissíveis.
“Conforme consta no edital e documentos anexos, os aparatos ortopédicos sob medida passam por algumas etapas antes da entrega final, como a avaliação, medição, confecção de molde negativo, confecção de molde positivo, confecção do encaixe da prova, prova e ajustes, as quais podem demorar até 60 dias para se chegar ao produto adequado ao paciente. Além do mais, a empresa a ser contratada deverá prestar assistência técnica e dar garantia das suas entregas. Logo, entendo, neste momento de exame sumário, que a proximidade geográfica da sede ou da filial da empresa que fornecerá as próteses com o local onde os pacientes serão atendidos - Oficina Ortopédica do CRIDAC/CERIII – é fator positivo que repercute no tempo de entrega do produto final e, por consequência, no tratamento e recuperação das pessoas necessitadas, que é o mais importante”, diz a decisão.
No entanto, o conselheiro pontuou que a exigência de contratação de profissional de fisioterapia seria indevida, já que a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 198/2002 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que disciplina o funcionamento das empresas de Ortopedia Técnica, Confecções de Palmilhas e Calçados Ortopédicos e de Comercialização de Artigos Ortopédicos, não prevê a imposição.
“Posto isso, considero que a SES-MT, ao incluir no certame a cláusula com exigências não previstas na norma regulamentadora do órgão competente para disciplinar a matéria, extrapolou sua competência e criou regra restritiva, em clara afronta ao art. 9º, I, “c” da Lei 14.133/2021. Portanto, reputo presente a probabilidade do direito nesse ponto”, destacou.
Por fim, o conselheiro analisou os apontamentos de supostos preços superfaturados, destacando que também ficou evidente a falta de competitividade no certame. Por conta disso, ele acatou o pedido de liminar e determinou a suspensão do Pregão Eletrônico realizado pela SES.
“Decido no sentido de: conhecer a representação de natureza externa; adotar tutela provisória de urgência a fim de determinar ao secretário de Estado de Saúde de Mato Grosso, Sr. Juliano Silva Melo, que: de forma imediata, suspenda o Pregão Eletrônico 76/SES/MT/2024 e todos os atos dele decorrentes, até o julgamento de mérito da representação; ou alternativamente, caso entenda pertinente o prosseguimento da licitação, retifique a Cláusula 11.52 do Anexo I do Edital, no sentido de deixar mais claro o âmbito de abrangência da restrição geográfica imposta, bem como a Cláusula 11.50 do Anexo I do Edital, para que deixe de ser exigido fisioterapeuta como responsável técnico ou funcionário das empresas participantes”, completou.