Diferentes caminhos são trilhados por trabalhadores em busca da própria sobrevivência. No caso da haitiana Ivone Angrane, 30, o trabalho informal foi a alternativa para garantir o sustento em Cuiabá, depois de percorrer 4,2 mil km ao deixar a terra natal. Em Mato Grosso, 236 mil pessoas trabalham sem vínculo empregatício para garantir meios de custear necessidades básicas de subsistência, como alimentação e moradia. Esse agrupamento inclui trabalhadores domésticos. Dados mais recentes, levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) e referentes ao 1º trimestre de 2018, mostram que a informalidade no mercado de trabalho persiste.
No 1º trimestre de 2017, o total de mato-grossenses sem vínculo empregatício formal somava 238 mil. Com base nos números trimestrais verifica-se que entre 2017 a 2018 esse contingente de trabalhadores sem registro em carteira e com atuação na iniciativa privada passou de 162 mil para 167 mil, avanço de 3,08%. Os trabalhadores domésticos sem registro em carteira somavam 76 mil no fim do 1º trimestre de 2017, quantitativo que diminuiu para 69 mil ao término dos 3 primeiros meses deste ano.
Outra parcela de trabalhadores sem vínculo empregatício é formada por aqueles que decidiram se tornar os próprios patrões. Nessa condição estão 385 mil pessoas em Mato Grosso, número 3,49% superior àquele verificado no 1º trimestre de 2017, quando somava 372 mil. Trabalhadores estrangeiros reforçam essa estatística, facilmente confirmada durante uma visita ao centro comercial de Cuiabá.
No centro histórico da Capital matogrossense, nativos e imigrantes dividem o espaço das calçadas para expor e vender seus produtos. Esta é a rotina do cuiabano Edelson dos Santos, 25, que encontrou no comércio informal uma saída para incrementar a renda familiar. Casado e pai de 3 filhos, durante o período de férias escolares o primogênito o acompanha nas vendas. “Tenho um emprego como vigilante, mas o salário é pouco e minha mulher não trabalha fora porque precisa cuidar das crianças”, justifica. O filho caçula do casal tem 4 anos. Os outros 2 completaram 6 e 8 anos. “Às vezes vou para o interior, aqui perto de Cuiabá mesmo, para vender. Costuma ser até melhor”.
Desemprego e saudade
A atividade comercial mantida pela haitiana Ivone e outros concorrentes e colegas que atuam na informalidade é marcada por sobressaltos. Segundo ela, quase diariamente fiscais da prefeitura recolhem mercadorias dos ambulantes esparsos pelo centro de Cuiabá. Para reavêlas, somente mediante o pagamento de multa. Desde que Ivone deixou o Haiti, 3 anos se passaram. Ao desembarcar na Capital, motivada pela esperança de conquistar uma vida financeiramente mais confortável, obteve assistência durante 3 meses da Casa do Migrante. Chegou a ser contratada como auxiliar de serviços gerais em uma confeitaria, onde ajudava inclusive na produção. “Chegava às 7h e não tinha hora para sair”, relembra. “Fui contratada por um salário de R$ 800, mas recebia menos. Fiquei 1 ano lá”.
Aconselhada por outros colegas imigrantes decidiu pela venda ambulante. Diz que agora fatura um pouco mais. Para apaziguar a saudade dos familiares haitianos, incluindo os 3 filhos com idades de 5, 7 e 13 anos e que ficaram com a avó, Ivone tem como aliados a internet e o celular. “Meu marido está aqui comigo, mas sinto saudade e vontade de vê-los (os filhos)”. A haitiana repete a atitude de parte dos estrangeiros que obtém alguma renda fora do país e mensalmente faz remessas financeiras para os familiares que ficaram para trás. No caso dela e de milhares de conterrâneos, aventurar-se em um território estranho foi a opção para sobreviver ao aprofundamento dos problemas sociais no Haiti, agravados após terremoto que culminou na morte de aproximadamente 200 mil pessoas no país, em janeiro de 2010.
Decisão semelhante foi tomada por outros 2 senegaleses ouvidos pela reportagem e que optaram pelo anonimato. Segundo eles, outros 50 imigrantes vindos do país africano tentam ganhar a vida em solo cuiabano. Entre os pedestres que circulam pelo centro histórico de Cuiabá os imigrantes expõem e comercializam produtos variados, fornecidos por um atacadista. Um deles admite que sente vontade de voltar ao Senegal para rever a família, mas a renda ainda é insuficiente. Quando o faturamento permite faz remessas financeiras para ajudar mãe e irmãos. O contato com os familiares, dos quais está distante há 2 anos, é mantido por meio de aplicativos de mensagens instantâneas. “Para morar aqui divido o aluguel com outro colega”.
Organização e apoio
Para regulamentar a situação de trabalhadores que atuam com o comércio informal em Cuiabá, a Secretaria Municipal de Agricultura, Trabalho e Desenvolvimento Econômico concluiu um mapeamento que identificou a existência de 500 pontos de comércio de rua. Para recolocar os ambulantes serão entregues inicialmente 30 Termos de Permissão de Uso (TPUs) nos próximos 15 dias. O atendimento pleno será demorado, prevê o secretário Vinycius Hugueney, já que são muitos ambulantes e muitas TPUs para serem confeccionadas por poucos técnicos lotados na secretaria. “Alguns pontos (de comércio) são próximos de onde o ambulante está irregular”.
Para obter a TPU e ser inserido no mapeamento, o ambulante pode comparecer à secretaria e realizar o cadastramento gratuito. Segundo Hugueney, após receber a TPU, o vendedor ambulante terá que efetuar pagamento anual com valor baseado na área pública ocupada, cotada por metro quadrado. No sentido de organizar o comércio ambulante, a Pasta também promove capacitação sobre empreendedorismo e fará a identificação visual padrão por meio de uma logomarca comum. Trabalhadores estrangeiros são incluídos nesse processo de organização do comércio informal na Capital, desde que possuam documentos necessários e se enquadrem nas normas exigidas pelo município.
Em relação à política de assistência aos imigrantes, a prefeitura de Cuiabá informou que desde a chegada do 1º grupo de venezuelanos, formado por aproximadamente 100 famílias, foi firmada parceria com o governo de Mato Grosso e a Casa do Migrante para atendimento a essas pessoas. Com o suporte de empresas privadas na inserção dos estrangeiros no mercado de trabalho, 85% dos adultos provenientes da Venezuela conseguiram uma colocação profissional.
Em relação à parceria, a prefeitura esclarece que fornece alimentos e custeia despesas com água e energia elétrica na Casa do Migrante, além de prestar assistência social e de saúde. Informa que é assegurado aos estrangeiros o acesso a toda a rede de assistência da Capital, inclusive aos programas do governo federal, a partir do cadastramento no CadÚnico, bem como às ações dos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), inclusão no mercado de trabalho por meio do Sistema Nacional de Emprego (Sine) e atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Rog?rio
Segunda-Feira, 23 de Julho de 2018, 12h26Lima
Segunda-Feira, 23 de Julho de 2018, 11h31Ana Raquel
Segunda-Feira, 23 de Julho de 2018, 09h42fabio
Segunda-Feira, 23 de Julho de 2018, 09h41