Um e-mail entregue pela Camargo Corrêa ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) mostra que houve contato entre as empreiteiras que formaram o cartel e um representante da Eletronuclear. O contato foi para tratar do acordo feito entre elas para a divisão da obra antes da licitação. A Camargo Corrêa fez acordo de leniência e confessou a prática de cartel em Angra 3, e declarou ter atuado junto com as empresas Andrade Gutierrez, Odebrecht, Queiroz Galvão, EBE, Techint e UTC Engenharia, que tocam juntas a obra.
A mensagem eletrônica está incluída no “Histórico de Conduta”, texto tornado público pelo Cade na última sexta-feira, quando foi feita a divulgação do acordo de leniência. O e-mail foi enviado no dia 12 de novembro de 2013 por um diretor da Odebrecht a executivos da Camargo, Andrade Gutierrez e UTC, e relata uma conversa ocorrida na Eletronuclear na véspera. Segundo os representantes da empreiteira que fizeram o acordo de leniência, a mensagem comprovaria que um representante da estatal, não identificado, foi avisado que os dois consórcios que disputavam os lotes na licitação já tinham acordado de se unir após o certame. A obra seria realizada no mês seguinte.
“A conversa foi muito boa, esclarecemos que toda a execucao (efetiva) se darah atraves da figura da fusao dos 2! (sic)”, escreveu o executivo da Odebrecht.
O diretor da empreiteira afirma que, até aquele momento, o “conceito” ainda não estava claro para os servidores da Eletronuclear contatados. À época ele disse que a estatal concordaria com a união posterior dos dois consórcios, para depois levar adiante os dois contratos em disputa. Essa permissão constava no edital. O executivo diz ainda que o acordo precisava ser ratificado como “Dr Salvador”. Segundo informação prestada pela Camargo Corrêa, trata-se de Luiz Manuel Messias, superintendente da Eletronuclear.
A combinação prévia entre as empresas envolveu uma série de reuniões. Ficou acertado que um dos consórcios venceria os dois contratos em disputa, oferecendo preço próximo ao teto do que seria aceito. Pela regra do edital, era preciso abrir mão de um deles para o outro consórcio. Posteriormente, os dois grupos se uniriam e dividiram os dois contratos.
Os documentos entregues pela Camargo Corrêa mostram também que após a conclusão da licitação, os grupos empresariais reunidos pelos dois consórcios resistiram juntos à pressão da Eletrobras, controladora da Eletronuclear, para que fosse concedido um desconto maior. A estatal queria de 10% a 20% de redução no preço em relação ao valor da licitação. As empresas resistiram e os contratos foram firmados com desconto de 6%, percentual que estava previsto no edital no caso de os consórcios vencedores dos dois contratos se unirem para tocar a obra.
O diretor-geral da Eletrobras, Valter Cardeal, foi quem participou das negociações sobre o desconto. Nos e-mails trocados pelos executivos das empreiteiras, Cardeal é chamado de “sua santidade” e “eclesiástico”. Não é esclarecido como as empreiteiras conseguiram resistir à pressão pelo desconto maior.
A construção de Angra 3 já foi alvo de ao menos duas delações premiadas no âmbito da Operação Lava-Jato. Na semana passada, o presidente licenciado da empresa, o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, foi preso. Ele é acusado de receber propina de R$ 4,5 milhões.