No artigo de ontem escrevi sobre a péssima qualidade e o sucateamento do serviço público federal e, por extensão, nos estados, por conta do famoso “aparelhamento do Estado”, introduzido pelas gestões do Partido dos Trabalhadores no governo do país, e copiadas no país inteiro em governos estaduais e municipais de todos os partidos políticos.
Recebi contribuições fortes e revoltadas. A maioria, contudo, de pessoas que se sentem vítimas dos péssimos serviços públicos brasileiros, que pioram na inversão dos aumentos de impostos pagos pelos cidadãos. Pelas manifestações, não posso deixar de imaginar o terrível resultado de uma pesquisa isenta, sobre a percepção social em relação à qualidade de todos os serviços públicos prestados no Brasil inteiro.
O aparelhamento do Estado consiste em preencher todos os cargos de direção, os chamados DGA (Direção Geral e Assessoramento), com filiados comandados por partidos políticos, ou por sindicalistas cooptados pelos partidos. O sistema é conhecido como “porteira fechada”, quando um partido recebe a doação de um ministério, de uma secretaria de estado ou de uma prefeitura com direito de ocupar todos os cargos comissionados.
Citei o caso do Ministério dos Transportes, mas cabe em qualquer outro. O Brasil construiu nos anos 1950 e 1990, uma forte cultura de grandes obras de infraestrutura. Hoje, dificilmente seria capaz de repetir, mesmo com computadores que fazem todos os cálculos técnicos antes feitos à mão, e das máquinas eficientes de hoje. Falta o essencial: gente capaz. As universidades formam engenheiros incapazes e aqueles antigos que sempre ensinaram os jovens foram jogados no lixo pelo sistema de aparelhamento de todos os órgãos ligados à infraestrutura.
Recuperar a capacidade técnica dos engenheiros vai levar, no mínimo, uma década. Em 1973 começou-se em Mato Grosso a construção da rodovia Transpantaneira, um projeto do governador José Fragelli, tocado pelo agrônomo Gabriel Muller, conhecido como “o Gigante do Pantanal”, e uma equipe de jovens engenheiros recém-formados ou recém-chegados ao estado. O projeto era estratégico. A exemplo das grandes rodovias como a Transamazônica, que integrava o Norte do Brasil, a Transpantaneira pretendia ligar Cuiabá, cortando o Pantanal, chegar a Corumbá, onde se interligaria com a ferrovia Noroeste do Brasil, com a rodovia BR-262, até Vitória e com as interligações possíveis ao longo da sua extensão.
Por falta de recursos a obra foi paralisada às margens do rio Cuiabá, em Porto Jofre, na divisa com Mato Grosso do Sul e nunca mais foi retomada. Mas aqueles jovens engenheiros que conheceram o Pantanal e arranjaram soluções que não constavam de nenhum livro, foram afastados na atualidade, fora os aposentados e os que morreram.
Perdeu-se extraordinária cultura de fazer obras difíceis em lugares difíceis como a Amazônia, o Pantanal e outras regiões novas. Mas o aparelhamento elegeu muita gente para cargos parlamentares, que aumentaram essa cultura. A corrupção, o inchamento da máquina pública e a perda do sentido primordial do serviço público, ficam para outros artigos.
ONOFRE RIBEIRO é jornalista em Mato Grosso
L?cia
Quarta-Feira, 26 de Fevereiro de 2014, 10h51