Opinião Segunda-Feira, 26 de Maio de 2025, 13h:13 | Atualizado:

Segunda-Feira, 26 de Maio de 2025, 13h:13 | Atualizado:

Olicelia Poncioni

Bebê reborn, o que a psiquiatria tem a dizer dessa onda? É um “surto coletivo”?

 

Olicelia Poncioni

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Olicelia Poncioni

 

Pasmen, mas eles não surgiram nesta década, existem há mais de três décadas. Os bebês reborn são bonecos hiper-realistas, confeccionados artesanalmente para se assemelhar a recém-nascidos, tanto na aparência quanto no peso, textura e características físicas. Surgiram na década de 1990, nos Estados Unidos, como uma vertente da arte do realismo. Porém, rapidamente transcenderam o status de simples objetos artísticos para se tornarem objetos de forte investimento emocional.

O interesse por bebês reborn cresceu significativamente no Brasil, com picos de busca conforme dados do Google Trends registrados em outubro e dezembro de 2024, e novamente em abril de 2025.

Do ponto de vista psiquiátrico, é importante avaliar caso a caso, a psiquiatria não julga, ela acolhe, ouve e analisa cada indivíduo e os sentimentos, sintomas associados, bem como o contexto em geral, a história de vida, os traumas sofridos e com isso faz um diagnóstico, que é individual, a análise psicopatológica não é feita com base no comportamento coletivo. Os transtornos mentais são multifatoriais e muito complexos em sua gênese. Por isso, é preciso muito cuidado antes de sair falando em “surto coletivo”, pois surtos psicóticos são caracterizados por um conjunto de sintomas e sinais extremamente graves, que põe em risco a vida da pessoa e de terceiros, alguns transtornos mentais cursam com surtos psicóticos, porém esse termo se tornou banalizado e é utilizado pelas pessoas quando se nota qualquer alteração diferente ou maior no comportamento. Portanto, é fundamental não tornar patológico, ou seja, doença os comportamentos adversos como crimes bizarros ou incluir automaticamente os indivíduos que utilizam bebês reborn, como doentes mentais, porque nem tudo é doença mental. No caso desses últimos, o contexto, a motivação e o impacto funcional devem ser criteriosamente avaliados.

Existem motivações psicológicas, que devem ser analisadas por especialista capacitado, psiquiatras e/ou psicólogos, com critérios e cuidados na escuta. Esses fatores podem estar relacionados à:

Satisfação de Necessidades Emocionais: Para muitas pessoas, especialmente mulheres, os bebês reborn funcionam como substitutos simbólicos, preenchendo lacunas emocionais, traumas ou perdas.

Elaboração de Luto: Estudos mostram que mulheres que sofreram perda gestacional, neonatal ou infertilidade podem encontrar nos reborns uma forma de processar o luto e a dor.

Regressão Benigna: Para algumas pessoas, cuidar do boneco ativa aspectos regressivos, promovendo conforto, segurança e apego, sem necessariamente configurar patologia.

Podendo também apresentar possíveis vínculos psicopatológicos, com sintomas mais graves como quadros delirantes ou alucinações, o que necessita uma intervenção medicamentosa de urgência. Embora a posse de bebês reborn, na maioria dos casos, não configure transtorno, há situações em que seu uso pode ser expressão ou manutenção de quadros psiquiátricos. Descrevo abaixo alguns transtornos que podem cursar com essas alterações em sensopercepção:

Transtorno Depressivo Maior: Utilização como tentativa de preenchimento afetivo frente a anedonia ou isolamento.

Luto Complicado ou Transtorno de Luto Prolongado: Quando o indivíduo substitui permanentemente o investimento psíquico em um bebê perdido pelo boneco, sem elaboração adequada do luto.

Transtorno de Personalidade Dependente: Forte necessidade de cuidado, proteção e dependência emocional.

Fenômenos Dissociativos: Em quadros mais graves, pode ocorrer dificuldade em discriminar fantasia e realidade.

Fetichismo ou Parafilia: Em casos isolados, embora pouco documentados, pode haver uso com conotações fetichistas.

É fundamental destacar que, quando ligados à fatores emocionais, na maior parte dos casos, o uso dos reborns está mais relacionado à busca de conforto emocional do que à psicopatologia. Porém deve-se analisar uma outra vertente que cresce muito com essas condutas, pois fenômeno dos bebês reborn transcendeu o universo terapêutico e artístico para se tornar também um fenômeno econômico e midiático nas redes sociais, com impactos significativos na geração de renda, na busca por visibilidade e na construção de imagem e influência digital. E até no contexto político, quando vemos órgãos públicos preocupados em criar regras e leis para regulamentar essas práticas, podendo aí trazer um reforço positivo a esse comportamento, pois gera visualização nas mídias. Essa preocupação política deveria estar concentrada em necessidades mais urgentes em saúde mental com políticas públicas.

Alguns dados são importantes para nos dar uma dimensão desse universo rentável, vejamos:

Aqui está uma análise sobre a viralização nas mídias sociais, os ganhos financeiros e de imagem associados aos bebês reborn, incluindo dados atualizados:

Fenômeno da viralização: TikTok: Há milhares de perfis dedicados a rotinas de cuidado com reborns (banho, troca, alimentação), No TikTok, hashtags como #rebornbaby, #reborncommunity e #rebornmom acumulam mais de 5 bilhões de visualizações combinadas (dados de 2024). Alguns vídeos ultrapassam 100 milhões de visualizações, especialmente quando simulam situações do cotidiano materno. YouTube: Canais que fazem “rotinas com reborn”, com bebês reborn chegam a ter mais de 1 milhão de inscritos, com vídeos ultrapassando 30 milhões de views. Exemplo é o perfil de Influenciadoras como "Kelly Maple" (EUA) ultrapassaram 2,6 milhões de inscritos no YouTube, sendo referência no segmento. Instagram e Facebook: Existem grandes comunidades, com perfis que acumulam entre 300 mil e 900 mil seguidores, atualmente está na casa de milhões, focando em ensaios fotográficos, vídeos de cuidado e até “role-playing” (interpretação de papéis como mães/pais dos bonecos). Gerando para os criadores de conteúdo Ganho Financeiro, de Imagem, Fama e Reconhecimento: Artistas e cuidadores de reborns tornam-se celebridades digitais, participando de entrevistas, documentários e programas de TV. Construção de Comunidades: Existe uma forte cultura de comunidade digital, onde o status social se mede por número de seguidores, engajamento e autenticidade dos bebês reborn apresentados. O reconhecimento dentro dessas comunidades gera prestígio e ascensão social digital, similar ao de nichos como gaming, moda e beleza.

Criadores de conteúdo com reborns no TikTok, YouTube e Instagram faturam com: AdSense e visualizações: Canais no YouTube podem gerar US$ 3.000 a US$ 15.000 mensais apenas em receita de anúncios. Patrocínios: Marcas de roupas infantis, brinquedos e produtos para mães e bebês simulados fazem parcerias pagas. Venda de cursos, mentorias e lives fechadas. Alguns influenciadores reborn reportam faturamento anual superior a US$ 200 mil (aproximadamente R$ 1 milhão) somando vendas e monetização digital.

E para os seguidores? Por que viraliza? Apelo visual do hiper-realismo; Gatilho emocional associado à maternagem; Curiosidade e choque cultural; Entretenimento e fetichização da estética do bebê.

•             Impacto na economia (mercado dos Reborn): Venda de Bonecos

O valor de um bebê reborn pode variar entre R$ 1.500 e R$ 15.000, dependendo do grau de realismo, do artista e dos materiais utilizados.

Artistas renomadas (que produzem o boneco) reportam rendas mensais que ultrapassam R$ 50.000, com filas de espera de 3 a 6 meses para encomendas.

Além da Economia Criativa e Produtos Agregados, como: Há venda de acessórios (roupas, chupetas magnéticas, mamadeiras especiais, carrinhos, berços). Workshops de pintura reborn chegam a custar entre R$ 3.000 e R$ 8.000 por curso.

Comércio de materiais para fabricação: moldes de silicone, olhos de vidro, cabelos especiais (mohair de alpaca) movimentam um mercado global estimado em US$ 1,3 bilhão anuais (dados de 2023 - Art Doll Association).

Dados de Mercado e Impacto Social crescente: Pesquisa da Grand View Research (2023): O mercado global de bonecos hiper-realistas, incluindo reborns, deve crescer 8,7% ao ano até 2030.

No Brasil, segundo levantamento da Associação Brasileira de Artistas Reborn (ABAR) (2023):

Existia cerca de 5.500 artistas profissionais ativos.

O mercado movimentava anualmente cerca de R$ 80 milhões.

Um levantamento do TikTok Brasil em 2024 mostra que conteúdos com #bebereborn geraram mais de 240 milhões de visualizações no país, com um crescimento de 150% nos últimos dois anos.

O Que a Ciência Diz? O fenômeno dos bebês reborn é relativamente recente no campo da pesquisa científica, e a maior parte dos estudos está nas áreas de psicologia, antropologia e sociologia, com poucos trabalhos na psiquiatria clínica. Existem algumas pesquisas já publicadas, mas são necessários estudos mais atualizados.

•             Análise Crítica:  A psiquiatria não julga. Mas do ponto de vista psiquiátrico, é fundamental a sociedade e comunidade científica estudar melhor esse fenômeno mundial crescente, avaliando e analisando criteriosamente o contexto, a motivação e o impacto funcional. Levando em consideração que cada indivíduo é único, apresentando características psicodinâmicas que devem ser agregadas, antes de ser pré-conceituada, podendo tanto ter um efeito simbólico especialmente em contextos de privação afetiva, para promover uma organização psíquica e estabilidade emocional, quanto ganhos no âmbito pessoal como fama ou financeiro. O tema ainda é subexplorado na psiquiatria, sendo um campo promissor para investigações sobre luto, solidão, saúde mental feminina e processos simbólicos. Na prática clínica: Profissionais devem abordar o tema com empatia, evitando julgamentos, buscando compreender o papel simbólico que o reborn exerce na vida do paciente, tratando adequadamente cada caso.

Dra Olicelia Poncioni  - Medica Psiquiatra- Formada pela UFMT em 1994 CRM2845 RQE 2862.Título de Especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria e Associação Médica Brasileira. Com 30 anos de experiencia atuando na rede pública  e privada em Cuiabá, ambulatório, urgência e emergência. Preceptora da Residencia Médica em Psiquiatria CIAPS/SES. Preceptora do internato do curso de Medicina da UNIC. Chefe do Serviço de Psiquiatria Hospitalar do HMC.





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Comentários (3)

  • Cuiabano

    Terça-Feira, 27 de Maio de 2025, 14h13
  • Psiquiatria tem que dizer para esse povo! Pra elas pegarem, 3 balaios de roupas e ir lavar, é isso que essas incapazes tem que fazer! Oh povo sem futuro.
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  • Só observo

    Terça-Feira, 27 de Maio de 2025, 14h05
  • Demência coletiva de alguns, somados a necessidade da imprensa em transformar isso em circo para tirar o foco do ROUBO a 11 milhões de idosos.
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  • Dhanna Cassetari

    Terça-Feira, 27 de Maio de 2025, 06h57
  • Já estou na terceira gravidez reborn. Ser mamãe é tudo de bom! Ah, também sou mãe de pet.
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