O momento que se vive é de emoção. Um estado de alma que destrói o pensamento critico e atola o cidadão num pântano de onde lhe é muito difícil se mover. Essa transformação da consciência em emoção despolitiza os debates que necessitam ser feitos e leva as pessoas a reagir em vez de agir. Desconstrói uma ação informada e ponderada fazendo os indivíduos se expressarem por impulsos condicionados, igual cachorro salivando quando vê comida. Pior, nesse confinamento da mente a raça humana não só perde a capacidade de dialogo como ganha graves ataques há democracia, aos direitos humanos, há igualdade na diferença, numa clara demonstração de retrocesso intelectual que nada contribui para o legado civilizacional.
Prosperidade e paz são objetivos que saíram também do discurso da esmagadora maioria dos políticos revelando assim tratar-se de algo que não mais se encontra nas suas agendas de trabalho. Por mera incapacidade ou deliberado desprezo em concretizar prementes medidas de âmbito social, esses políticos recorrem a promessas populistas de fácil e agradável efeito aos ouvidos das pessoas, contrapondo-se assim a todo um árduo trabalho inerente há construção de uma sociedade. Perdidos na incompetência do seu despreparo e completamente reféns das fontes de financiamento, a sua inação passa a palavra para vozes raivosas promotoras de uma sociedade preconceituosa onde predomine a lei do mais forte.
Nesta triste produção teatral onde uma plateia comodamente instalada assiste há atuação cômica de políticos e atores públicos desprovidos do mais elementar talento, o verdadeiro drama do quotidiano vai-se exibindo lá fora, na rua, numa importante ação afirmativa de militância social capaz de exercer forte pressão sobre as instituições democráticas. Os problemas que originaram as manifestações populares espontâneas que ocorreram no Brasil em Julho de 2013 não estão sendo resolvidos bem pelo contrário, vão se agravando e com eles desenvolvem-se em praças públicas, um pouco por todo o mundo, mobilizações populares com pertinentes lutas em defesa do meio ambiente, na defesa de direitos, da mulher, do negro, de LGBT, pelo trabalho e pela terra, contra a mercantilização dos serviços públicos, contra a corrupção, no fundo, enumeras questões que aos poucos vão refinando a sociedade forçando-a há inclusão desse capital social.
Há muito tempo que os parlamentos e os governos não estavam tão preocupados com as vozes das ruas. A falta de dinheiro na vida das populações, onde tudo tem de ser pago, não se sabe bem a quem, onde é injetado direto na veia um hiperconsumismo desnecessário e onde o ultraje é regra de governação, os protestos ganharão envergadura e preposição igual ao insuportável que a situação se apresente. E nessa escalada, o blá blá blá de que não existe alternativa ao modelo vigente deixa de ser uma preocupação minimamente equacionada.
Independentemente do maior ou menor potencial de ruptura social e institucional que cada país atravessa, alternativas sempre existem e muitas delas fazem já parte integrante de propostas políticas e econômicas concretas. Porém, a atual cultura do medo que instiga a sociedade é um dissuasor para quaisquer perspectivas alternativas e serve também de adubo a misticismos que se trancam no desconhecimento e na ausência de compreensão daquilo que são as necessidades básicas, garantes dos mínimos de dignidade para a condição humana. Precisa-se urgente de pessoas maiúsculas capazes de inspirar na renovação e confiança e assim se caminhar na construção de uma sociedade com as pessoas e para as pessoas, sem exceção ou exclusão.
Rui Perdigão – Administrador, consultor e presidente da Associação Cultural Portugueses de Mato Grosso