Opinião Sexta-Feira, 25 de Julho de 2025, 16h:36 | Atualizado:

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Bruno Ferreira Alegria

Mortes em Cirurgias Plásticas

 

Bruno Ferreira Alegria

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Bruno Ferreira Alegria

 

Desde o protagonismo e referência do Dr. Ivo Pitanguy, o Brasil segue cada vez mais consolidado como um dos líderes mundiais em cirurgias plásticas, com mais de 2 milhões de procedimentos realizados apenas no ano de 2024, de acordo com a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS). Notadamente, agregado ao aumento do acesso aos procedimentos médicos estéticos e reparadores, cresce também a atenção para casos trágicos de óbitos durante ou após cirurgias plásticas, como é o caso do que vem sendo noticiado em Mato Grosso, mas também em grandes centros como São Paulo. Muitos desses casos geram comoção pública, com famílias e a sociedade apontando o dedo para médicos e clínicas, frequentemente ignorando os riscos inerentes a qualquer procedimento cirúrgico.

O Brasil é referência global em cirurgia plástica, não somente pela quantidade de procedimentos, mas também pela qualidade de seus profissionais. Neste cenário, o destaque é a lipoaspiração, o procedimento mais comum no país, com 289.766 casos em 2024, e também o que apresenta maior associação com óbitos, correspondendo a 61,8% das mortes relacionadas a cirurgias plásticas, conforme dados da ISAPS. Uma série de fatores, combinados ou isolados, podem ocasionar consequências danosas aos pacientes, incluindo-se aí o óbito. Desde enfermidades ou condições preexistentes, de cunho fisiológico ou comportamental, falhas em aparelhos, erros humanos dos diversos profissionais inseridos no procedimento (médicos, enfermeiros, técnicos, biomédicos e etc.), ambiente hospitalar adequado, e não menos importante, os riscos naturais da intervenção cirúrgica, relatados e reconhecidos na própria literatura médica. Infelizmente, tem-se percebido um aumento generalizado pela busca por culpados frequentemente recaindo sobre médicos e clínicas, mas é crucial considerar que qualquer intervenção cirúrgica, por mais simples que pareça, carrega riscos típicos.

No dia 07 de julho de 2025, a empresária Natália Cavanellas, de 40 anos, faleceu durante uma cirurgia plástica no Hospital San Gennaro, na Mooca, zona leste de São Paulo. O procedimento, realizado pelo cirurgião plástico Edgar Lopez, envolvia lipoaspiração, injeções nos glúteos e ajustes em próteses mamárias previamente implantadas. Segundo o boletim de ocorrência, Natália sofreu uma parada cardiorrespiratória durante a fase final da cirurgia, no momento da aplicação de injeção na região glútea. Apesar das tentativas de reanimação, ela não resistiu e faleceu na sala de cirurgia. A suspeita inicial da equipe médica é de uma embolia gordurosa, uma complicação rara, mas conhecida na literatura médica, que ocorre quando gotas de gordura entram na corrente sanguínea e obstruem vasos no pulmão, cérebro ou coração. A equipe do médico Edgar Lopez afirmou que o procedimento foi realizado em ambiente hospitalar adequado, com todos os exames pré-operatórios em conformidade e seguindo protocolos de segurança. O cirurgião, especializado em cirurgia plástica pela Universidade Santa Cecília (Unisanta), é conhecido por sua clínica de alto padrão em Moema e por ser referência em lipo HD e mamoplastia. 

O fato é que cirurgias plásticas, como qualquer procedimento invasivo, apresentam riscos que vão além da habilidade do cirurgião. Complicações como tromboembolismo pulmonar, hemorragias, infecções e reações adversas à anestesia, por exemplo, podem ocorrer mesmo em condições ideais. No caso de Natália Cavanellas, a suspeita de embolia gordurosa reforça a possibilidade de uma complicação inerente ao procedimento, embora a investigação ainda esteja em curso. No entanto, a sociedade frequentemente busca atribuir responsabilidade a médicos ou clínicas, mesmo quando laudos periciais não confirmam o erro médico.

Em uma análise jurídica, especificamente vinculada à responsabilidade criminal, destaca-se a busca pela atribuição de responsabilidade na ocorrência de homicídio culposo, aquele em que não há a intenção no resultado morte. Para que haja a caracterização desta hipótese, é necessária a certeza de que o óbito decorra de imperícia, imprudência ou negligência do profissional de saúde. A imperícia é a espécie em que o profissional não estaria apto para realizar o procedimento, como por exemplo a ausência de formação, de especialidade com registro no Conselho profissional, etc. A forma de imprudência, implica em fazer algo que não deveria ter sido feito, como o caso de prolongar o procedimento cirúrgico para realizar mais intervenções, ir além do que os protocolos recomendam no desempenho das técnicas empregadas ou operar mesmo sabendo que as condições do ambiente hospitalar ou instrumentos estão limitadas. Já a negligência é a condição em que o profissional se omite quando na verdade, deveria ter agido, como não seguir os protocolos e técnicas, não solicitar todos os exames pré-operatórios, omitir ou de algum modo não informar de forma objetiva os riscos e cuidados aos pacientes antes da cirurgia, ignorar os marcadores durante a operação ou não acompanhar a recuperação no pós-operatório. Ausentes as condições de imprudência, negligência ou imperícia, não há que se falar em responsabilidade por erro médico, restando assim a análise em cada caso, das demais hipóteses que implicam nos riscos inerentes ao procedimento.

O fato é que, vociferar em redes sociais enquanto famílias seguem enlutadas e profissionais abalados, produz como resultado apenas danos à honra e à imagem dos pacientes, médicos e estabelecimentos hospitalares. A sociedade em geral, bem como os profissionais, estabelecimentos médico-hospitalares e os próprios pacientes, possuem mecanismos para evitar da melhor forma tragédias desta natureza. Médicos, profissionais da saúde e unidades hospitalares, precisam se alinhar cada vez mais as regras e procedimentos dos seus Conselhos profissionais, das unidades hospitalares, das técnicas empregadas em cada especialidade, e sobretudo, contar com um profissional da advocacia para proporcionar consultorias preventivas e assessoria jurídica. Pacientes devem buscar informações sobre a formação dos médicos, sobre a intervenção cirúrgica, como também garantias de que a unidade hospitalar cumpre as normas legais para a realização do procedimento antes mesmo do ocorrido. Familiares nas hipóteses de um resultado negativo, devem acompanhar a atuação das autoridades, da perícia oficial, e, no melhor dos casos, também se valer de um profissional da advocacia para acompanhar e dar o seguimento que melhor se adeque ao caso, no limite da justiça. A opinião pública é muito útil quando age como alerta para os pontos aqui mencionados. Do contrário, pressionar por uma responsabilização imediata sem que tudo tenha se esclarecido, apenas implica em mais sofrimento a todos envolvidos.

Bruno Ferreira Alegria é advogado, Doutor em Ciências Jurídicas e Ciências Sociais, sócio fundador do escritório Ferreira Alegria Advogados Associados.





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