Chico Ferreira
O juiz Jean Garcia de Freitas Bezerra, da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, negou uma série de pedidos de anulações feitos pela defesa do ex-vereador da capital, Paulo Henrique de Figueiredo (MDB), alvo da Operação Ragnatela. Na decisão, o magistrado apontou que as buscas e apreensões e colheitas de prova foram feitas com autorização judicial e devidamente embasadas, aproveitando ainda para agendar a audiência de instrução e julgamento da ação penal para setembro.
A primeira fase da Operação Ragnatela foi realizada em junho de 2024 e cumpriu mais de 40 mandados de prisão e busca contra suspeitos de integrar a maior facção criminosa de Mato Grosso, responsável pela realização de shows nacionais em casas noturnas. As investigações identificaram que os criminosos participavam da gestão das casas noturnas e, com isso, o grupo passou a realizar shows de cantores nacionalmente conhecidos, custeados pela facção criminosa em conjunto com um grupo de promoters.
Paulo Henrique foi preso no dia 20 de setembro de 2024, quando ainda exercia mandato de vereador, pelos crimes de organização criminosa, lavagem de capitais, corrupção ativa e corrupção passiva, em uma decisão do Núcleo de Inquéritos Policiais (Nipo). A medida se deu durante a Operação Pubblicare, que investiga a influência do parlamentar na liberação de licenças na Prefeitura de Cuiabá e sua ligação com a facção criminosa Comando Vermelho, e é desdobramento da Operação Ragnatela.
A prisão foi substituída no dia 25 de setembro por medidas cautelares, como o afastamento da função de vereador na Câmara Municipal de Cuiabá por 180 dias, além do uso de tornozeleira eletrônica. O dispositivo, no entanto, foi retirado no início de fevereiro deste ano, após o recebimento da denúncia oferecida pelo Ministério Público de Mato Grosso.
Nos autos, a defesa do ex-vereador alegou, em preliminares, que as provas obtidas por meio de registros financeiros, bancários e conversas captadas através de interceptações telefônicas devem ser desconsideradas, por se tratarem de provas ilícitas, uma vez que foram colhidas de maneira irregular, se caracterizando como “fishing expedition” (pescaria probatória).
De acordo com a defesa, os policiais agiram com excessiva liberdade nas investigações, realizando diligências de maneira genérica, com o objetivo de examinar os conteúdos dos celulares recolhidos. A partir disso, segundo os advogados, os agentes teriam solicitado nova medida de busca e apreensão sem a devida delimitação de objeto, sendo que os dados pretendidos já haviam sido obtidos anteriormente, durante a Operação Ragnatela.
Na decisão, o juiz apontou que a análise dos autos revela que todas as diligências investigativas foram precedidas de prévia autorização judicial, devidamente fundamentada, com exposição clara dos indícios de materialidade e autoria, bem como da necessidade e pertinência das medidas requeridas no contexto da apuração criminal.
“As medidas cautelares requeridas foram motivadas por elementos concretos colhidos na fase inicial da operação policial — notadamente, na denominada “Operação Ragnatela” — que apontavam para a existência de possível ramificação do esquema sob apuração, o que justificou a adoção de novas diligências voltadas à obtenção de provas adicionais. Não se verifica, portanto, qualquer ilegalidade ou ilicitude nas provas obtidas, inexistindo nulidade a ser reconhecida neste momento processual”, diz a decisão.
O ex-vereador também alegou suposta nulidade na extração dos dados de seu celular. A defesa sustentou a quebra da cadeia de custódia, uma vez que não foram utilizados os mecanismos necessários e adequados de obtenção de dados, pois os investigadores não realizaram a extração por meio de software, apenas tiraram fotos dos celulares e, de forma manual, realizaram a análise dos dados das conversas de áudio e textos.
No entanto, segundo o juiz, não foram juntados elementos que indiquem a falta de preservação e confiabilidade dos atos que compõem a cadeia de custódia, desde a posse, movimentação, localização e armazenamento do material apreendido. O magistrado pontuou ainda que não foi apontado, concretamente, que a forma utilizada pelos policiais para extraírem os dados dos aparelhos celulares apreendidos tenham comprometido a fidedignidade das informações colhidas, tratando-se de meras conjecturas.
“Nesse enquadramento fático, não aportou aos autos indicativos de que houve adulteração da prova a ponto de invalidá-la, pelo que não há falar em quebra da cadeia de custódia. Posto isto, ainda que se possa falar em irregularidade na forma de extração dos dados celulares, aludidas desconformidades não comprometeram a higidez da prova colhida, dada a segurança fornecida pelo próprio aplicativo de trocas de mensagens, descartando-se quaisquer alterações no seu conteúdo. Assim, a despeito da alegada ausência de elementos acerca da conservação dos dados celulares e da forma manual de extração de dados levada a efeito pelos investigadores, não foi minimamente demonstrada qualquer violação dos aparelhos celulares e dos dados extraído a impactar na higidez da prova colhida, pelo que não há falar em quebra de cadeia de custódia”, pontuou o magistrado.
Por fim, os advogados de Paulo Henrique de Figueiredo tentaram anular as buscas e apreensões, alegando que elas teriam sido realizadas de forma genérica e exploratória, fundamentadas exclusivamente na iniciativa da autoridade policial ou de seus agentes, sem a devida individualização ou justificativa concreta. A alegação, no entanto, foi refutada pelo magistrado, que apontou que as medidas de busca e apreensão foram regularmente autorizadas por decisão judicial, a qual analisou e reconheceu a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade em desfavor do acusado, justificando, portanto, a adoção das diligências investigativas.
A tese também foi rejeitada pelo magistrado, que refutou ainda o argumento de excesso na acusação, destacando que a narrativa apresentada na denúncia está de acordo com os elementos colhidos na fase de investigação, estando respaldada em informações concretas que estão à disposição da defesa. Na decisão, o juiz aproveitou para agendar a audiência de instrução e julgamento para setembro.
“Diante do exposto, rejeito todas as preliminares arguidas. Em arremate, não ocorrendo quaisquer das hipóteses previstas no artigo 397 do CPP, que autorizariam a absolvição sumária dos acusados, em obediência ao disposto no artigo 399 do mesmo diploma legal, designo audiência de instrução e julgamento para o dia 10/09/2025, às 13:30h”, finalizou.