O conselheiro interino do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Isaías Lopes Cunha, acolheu a Representação de Natureza Externa proposta pela empresa Nissan do Brasil Automóveis Ltda contra a Secretaria de Estado de Saúde (SES), por desrespeitar a ordem cronológica de pagamentos, permitindo que contratos mais recentes sejam pagos antes dos mais antigos. A empresa cobra R$ 379 mil do Executivo, referente a venda de 10 veículos.
A decisão foi publicada no Diário de Contas desta sexta-feira (22). Na decisão, o conselheiro decidiu por aplicar multa no valor R$ 779,28 (6 UPF's/MT) aos ex-secretários João Batista Pereira da Silva, Eduardo Bermudez e Luiz Soares, além de vários servidores públicos que atuaram na Secretaria de Saúde.
De acordo com a representação, a SES adquiriu de 10 veículos, por meio de Adesão à Ata de Registro de Preços, no valor de R$ 94.900,00, cada automóvel, durante a gestão do ex-governador Pedro Taques. Entretanto, efetuou o pagamento de apenas seis veículos, restando quatro sem pagar.
Somados, os dez veículos custaram ao Estado R$ 949 mil. Deste total, o Estado pagou R$ 569 mil, restando uma dívida de R$ 379 mil, que, até hoje não foi quitada.
Na decisão, o conselheiro relacionou uma série em restos a pagar, “em liquidação”, cujos empenhos foram emitidos em data posterior à 2014, por diversos fornecedores. “Inicialmente, ressalta-se que a regra é de que as despesas públicas devam ser executadas e pagas no exercício e, excepcionalmente, podem ser deixadas obrigações a pagar no exercício seguinte, desde que haja suficiente disponibilidade de caixa”, diz trecho da análise.
Além disso, as despesas orçamentárias legalmente empenhadas e não pagas no fim do exercício devem ser inscritas em restos a pagar e constituir a dívida flutuante do ente.
Anteriormente, esta mesma Representação foi admitida em decisão proferida pelo conselheiro Gonçalo Domingos de Campos Neto, momento em que também foi determinada a citação do ex-secretário Estadual de Saúde, João Batista Pereira da Silva.
Nos autos, João alegou que a presente demanda decorre de processo de Adesão Carona à Ata de Registro de Preços nº 0385/2013, da Universidade Federal de Dourados (MS), e que o pedido de aquisição dos veículos proveio da Superintendência de Vigilância em Saúde. Ele reconheceu que a concessionária cumpriu a entrega dos dez veículos e que o Estado deveria formalizar o pagamento das quatro unidades restantes, haja vista que todos eles foram devidamente recebidos e fazem parte do patrimônio do Estado.
O ex-secretário afirmou que “o não pagamento decorreu da elaboração do Relatório de Auditoria Controladoria Geral do Estado (CGE), que classificou as despesas concernentes aos veículos como ‘reprovadas’, em razão de terem sido realizadas sem cobertura contratual, e que, diante dos fatos apresentados, se faz necessário reconhecer a presente despesa e determinar o respectivo empenho sob dotação orçamentária correspondente, para efetivação do pagamento”.
Posteriormente, o TCE sugeriu a citação de todos os envolvidos, Eduardo Luiz Conceição Bermudez (ex-Secretário de Estado de Saúde), João Batista Pereira da Silva (ex-Secretário de Estado de Saúde), Luiz Antônio Vitório Soares (Secretário de Estado de Saúde), Josiane Fátima de Andrade (ex-secretária adjunta de Administração Sistêmica da Secretaria de Estado de Saúde), Wanderson de Jesus Nogueira (ex-ordenador de Despesas), João Afonso Costa Marques (ex-ordenador de Despesas), Maura Lopes de Souza (ex-ordenadora de Despesas), WisleyRone Clemente (ex-ordenador de Despesas), e Florinda Lafaete da Silva Ferreira Lopes (ex-ordenadora de Despesas), para que se manifestassem nos autos acerca da suposta irregularidade apontada.
Josiane Fátima de Andrade alegou, inicialmente, que seu período de atuação na secretaria foi entre 1º de setembro de 2015 e 2 de maio de 2016, e que, com a saída de seu antecessor, houve acúmulo de processos e que o contrato em questão referente ao pagamento das notas fiscais, por apresentar problema quanto à ausência de formalização contratual, foi remetido à Superintendência Administrativa para providências e correção das inconsistência.
Já Florinda Lafaete da Silva Ferreira Lopes, ex-secretária adjunta de Administração Sistêmica, afirmou, em síntese, que a autorização para o pagamento dos R$ 379 mil restantes ocorreu antes de sua gestão, iniciada em março de 2017.
Eduardo Luiz Conceição Bermudez, ex-secretário de Saúde, alegou que ocupou o cargo entre outubro de 2015 e julho de 2016, e requereu que os Secretários que estiveram no comando da pasta desde o início de instauração do processo de aquisição dos veículos fossem chamados a prestar os devidos esclarecimentos.
Em junho de 2018, o conselheiro Isaías já havia proferido decisão decretando a revelia de João Batista, João Afonso Costa Marques, Wisley Rone Clemente, Wanderson de Jesus Nogueira e Maura Lopes de Souza. Na nova decisão, o conselheiro reiterou a decretação da revelia dos citados.
O conselheiro ainda citou diversos entendimentos do Tribunal de Contas da União e do próprio TCE-MT de que os gestores devem observar a ordem cronológica para efetuar pagamentos de restos a pagar. Em relação a argumentação de que o pagamento total dos veículos não foi concluído em razão da orientação da CGE por não haver os termos do contrato, Isaías Lopes da Cunha frisou que este documento "era dispensável". "Portanto, as alegações da defesa de que não efetuou opagamento pendente, em razão da ausência de contrato, não merecem proposperar, até mesmoporque, neste caso, o contrato foi substituído pelas notas de empenho".
Apesar da situação prever multas aos gestores, o membro da Corte de Contas colocou que não há instrumento legal para que o órgão obrigue o Estado pagar a empresa. Esse assunto deve ser debatido no Judiciário. "Destarte, esclareço que não compete a este Tribunal deContas determinar ao gestor o pagamento dos créditos inadimplidos junto a terceiros, tendo emvista que a tutela de interesses privados compete ao Poder Judiciário, conforme se observa dejurisprudência extraída do Boletim Consolidado, edição de fevereiro de 2014 a junho de 2019, deste Tribunal".
Ao final, após determinar a multa aos gestores da época, o conselheiro orientou os atuais gestores a observarem a ordem de pagamento dos restos a pagar. “Por conseguinte, registra-se que a Administração Pública, quando do adimplemento de suas obrigações, deverá obedecer a ordem cronológica da sua exigibilidade, e que o seu desrespeito configura crime”, destacou.