Em decisão unânime, dada num recurso de agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Estadual (MPE), a 1ª Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) determinou o bloqueio de R$ 161,2 milhões nas contas das empresas e dos seus respectivos sócios envolvidos no esquema de pagamento de propina à agentes públicos para travar a licitação do sistema de transporte intermunicipal do Estado. Esse valor é apontado como prejuízo causado aos cofres públicos em decorrência de um esquema de pagamento de propina para favorecer empresas do transporte rodoviário interestadual que operam em Mato Grosso.
O bloqueio atinge 10 empresas. São elas: Verde Transpotrtes Ltda, R$ 75.144.009,60; Viação Sol Nascente Ltda, R$ 1.397.725,46; Viação Eldorado Ltda, R$ 28.738.955,00; Empresa de Transportes Andorinha S/A, R$ 8.862.855,15; Expresso Rubi, R$ 18.308.623,73; Viação São Luiz LTDA, R$ 597.075,83; Viação Xavante Ltda, R$ 13.986.227,57; Rápido Chapadense Viação Ltda, R$ 2.435.993,00; Orion Turismo Ltda, R$ 4.735.518,51; e Transportes Jaó Ltda, R$ 7.087.250,87.
O processo contra 21 pessoas físicas e jurídicas tramita na Vara Especializada de Ação Civil Pública e Ação Popular desde dezembro de 2019. O juiz Bruno D’Oliveira Marques, responsável pelo caso, negou o pedido para bloquear as contas do Grupo Verde Transportes, o que levou Ministério Público a recorrer ao Tribunal de Justiça com agravo de instrumento. A nova decisão colegiada é do dia 23 de agosto deste ano, quando os magistrados concluíram o julgamento do agravo. O acórdão foi publicado no dia 31 de agosto.
Inicialmente, em janeiro de 2020, Bruno Marques acolheu parcialmente o pedido do MP e decretou a indisponibilidade dos bens de apenas três denunciados: Carla Maria (R$ 324 mil), Francisco Gomes de Andrade Lima Neto (R$ 640 mil) e da Pro Nefron Nefrologia Clínica e Terapia Renal Substitutiva (R$ 1,2 milhão). O MPE pediu aditamento para estender o bloqueio também ao procurador aposentado Francisco Gomes de Almeida Lima Filho, o Chico Lima Chico Lima. Em novo despacho do dia 30 de junho do ano passado, o magistrado acolheu esse pedido e bloqueou R$ 2,2 milhões do procurador Chico Lima. Contudo, voltou a negar pedido bloquear as contas do Grupo Verde.
No recurso ao Tribunal de Justiça, o MPE defendeu a necessidade da reforma da decisão do juiz Bruno Marques que deixou de atender o pleito liminar por completo. O autor entende que parte dos pedidos tem natureza tributária, de modo a ser perseguido mediante ação diversa da ação de responsabilização por ato de improbidade administrativa. Dessa forma, pedio a concessão de efeito ativo para determinar o bloqueio de bens dos denunciados, de forma solidária, pelo valor total atribuído à causa, que é de 161.294.235,35. Os fatos que resultaram na propositura da ação são descobramentos da Operação Rota Final, do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco).
Conforme os documentos constantes no processo, houve uma negociação para pagamento de propina no valor de R$ 6 milhões para edição do Decreto 2.499, de 20 de agosto de 2014, firmada entre Francisco Gomes de Andrade Lima Filho, à época procurador do Estado que atuava junto à Casa Civil, e o Sindicato das Empresas de Transporte de Mato Grosso (Setromat), à época presidido por Julio Cesar Sales Lima. De acordo com a denúncia do MPE, a edição do decreto, fruto do suposto pagamento de propina, assegurou a atuação precária das empresas denunciadas e garantiu a obtenção de lucros em detrimento do pagamento devido de impostos à Fazenda Estadual, bem como das taxa de regulação, fiscalização e controle, o que, possivelmente, resultou dano ao erário.
O relator do agravo, o juiz convocado para julgar em 2ª instância, Yale Sabo Mendes, concordou com o Ministério Público. “Embora a r. decisão recorrida tenha entendido que esse dano não tem natureza de improbidade administrativa, não podendo ser perseguido por meio dessa ação, mas sim por intermédio de execução fiscal, tenho que tal fundamento não se adequa ao noticiado na exordial e comprovado através dos documentos carreados aos autos”, contrapôs o relator.
Segundo o juiz Yale Sabo, se não fosse a prática do ato ímprobo, as empresas não teriam mantido por extenso lapso temporal terreno fértil para a sonegação tributária, “o que conseguiram não só pela edição do decreto, mas também por causa de toda a parafernália de estratégias que contou com a omissão dos agentes estatais para a não finalização e concretização da concessão das linhas intermunicipais de passageiros, deixando o estado nesse ponto em terreno praticamente estéril quando à arrecadação de tributos”.
Para o relator, a documentação apresentada pelo Ministério Público permite concluir que o ato dos denunciados causou danos à administração, considerando que há indícios suficientes da prática de atos de improbidade administrativa que ofenderam os princípios da legalidade, moralidade administrativa e impessoalidade, não sendo crível presumir nessa fase que a conduta dos requeridos esteve desprovida de má-fé ou dolo.
“Isto porque, verifica-se indícios da possível ocorrência das fraudes apontadas pelo Ministério Público, por parte dos Agravados, posto que com a edição do Decreto n.º 2.499, de 20 de agosto de 2014, fruto do suposto pagamento de propina, assegurou a atuação precária das empresas requeridas e, por conseguinte, garantiu a obtenção de lucros em detrimento do pagamento devido de impostos à Fazenda Estadual, bem como das Taxa de Regulação, Fiscalização e Controle, o que, possivelmente, resultou dano ao erário”, colocou Yale Sabo.
O voto do relator foi acolhido integralmente pelos demais julgadores. “Estando o pedido de indisponibilidade de bens, acompanhado da robustez necessária apta a ensejar de plano a concessão da medida, ou seja, com demonstração de indícios fortes da responsabilidade do agente na execução do ato ímprobo, deve ser deferida a liminar. Recurso conhecido e provido, para deferir a pretensão liminar, e decretar a indisponibilidade dos bens dos Agravados, até o limite do prejuízo ao erário”, diz trecho do acórdão.