Relator das investigações da trama golpista, o ministro Alexandre de Moraes se irritou com o ex-comandante do Exército durante o primeiro dia de depoimento das testemunhas de defesa e acusação do processo que pode levar à prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro. Moraes interrompeu a fala de Freire Gomes, quando o general comentava o papel do ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos nas discussões de um golpe de Estado para manter Bolsonaro no poder.
“Quero advertir a testemunha, ela não pode omitir o que sabe. Vou dar a testemunha a chance de dizer a verdade, não pode agora perante o STF falar que não lembra, que talvez, que eu estava focado só no que pensava. A testemunha é general do Exército, foi comandante do Exército, consequentemente está preparado para lidar sob tensão, tanto no interrogatório da polícia quanto aqui”, disse Moraes.
A advertência de Moraes se deve à diferença entre as informações prestadas peloo ex-comandante à Polícia Federal, durante as investigações sobre a trama golpista, e o depoimento em juízo.
“Solicito que antes de responder, pense bem. Vossa Senhoria disse à Polícia Federal que o depoente (o próprio comandante) e o brigadeiro Baptista Junior falaram de forma contundente ao conteúdo exposto (da tentativa de golpe), que não teria suporte jurídico para tomar qualquer atitude, que o almirante Garnier (ex-comandante da Marinha) teria se colocado à disposição do presidente da República, ou o senhor falseou a verdade na polícia ou está falseando a verdade aqui.”
Antes da intervenção de Moraes, Freire Gomes respondia a um questionamento do procurador-geral da República, Paulo Gonet, se Garnier havia se colocado “à disposição para implantar essas medidas”, em referência ao plano golpista de Bolsonaro.
“Tivemos diversas reuniões. Obviamente que cada um expressava sua opinião quando solicitado pelo presidente", começou Freire Gomes. "Acredito que o senhor se refere a essa conversa em que expus pra ele a importância de avaliar todas as condicionantes, inclusive o dia seguinte da tomada de uma decisão que fosse, estava focado na minha lealdade de ser franco ao presidente sobre o que pensávamos. Baptista Junior foi contrário a qualquer coisa naquele momento. O que o ministro da Defesa fez foi ficar calado, e o almirante Garnier apenas demonstrou um respeito ao comandante em chefe das Forças Armadas e não tinha opinião naquele momento.”
A defesa de Freire Gomes chegou a pedir que trechos do depoimento do general à Polícia Federal fosse exibidos na tela da videoconferência, o que foi rechaçado por Moraes.
Após a intervenção do ministro, Gonet voltou a questionar a Freire Gomes se Garnier havia se colocado à disposição dos planos golpistas de Bolsonaro.
“Com 50 anos de Exército jamais mentiria. Eu e o brigadeiro Baptista Junior nos colocamos contrário ao assunto, e que eu estava focado no que eu falei, não me recordo efetivamente da posição do ministro da Defesa, e o almirante Garnier ficou com essa postura de ficar com o presidente. Eu não posso inferir o que ele quis dizer com o estar com o presidente Eu não omiti dado. E afirmo: ele disse que estava com o presidente, a intenção do que ele quis dizer com isso não me cabe.”
As audiências desta segunda-feira marcam o início da instrução (fase de coleta de provas) da ação penal aberta após Bolsonaro, Braga Netto e outros seis denunciados do chamado “núcleo crucial” irem para o banco dos réus por envolvimento numa articulação para impedir a posse de Lula e do vice Geraldo Alckmin.
A audiência não está sendo transmitida nem pela TV Justiça nem pelo YouTube. Os jornalistas que acompanham a audiência estão em um salão anexo ao do Supremo Tribunal Federal (STF) assistindo por videoconferência, mas também não podem gravar nem áudio e nem imagem.
Nesta segunda-feira, serão ouvidos o ex-comandante do Exército general Marco Antônio Freire Gomes, Clebson Ferreira de Paula Vieira, ex-integrante do Ministério da Justiça, Adiel Pereira Alcântara, ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal, e Éder Lindsay Magalhães Balbino, responsável por empresa contratada pelo PL para fiscalizar as eleições.
No início da maratona de depoimentos, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, questionou Éder sobre a confecção do relatório usado pelo PL para tentar anular o resultado das eleições presidenciais de 2022.
As defesas de Braga Netto e Anderson Torres o questionaram se ele teve contato com os ex-ministros da Defesa e da Justiça, respectivamente, em uma tentativa de se afastar do episódio, usado por Gonet para acusar o grupo de golpe de Estado. Éder disse que não conversou com eles durante a confecção do documento.
A expectativa no Supremo é de aliados de Bolsonaro é que o julgamento que vai definir a condenação ou absolvição de Bolsonaro ocorra até outubro.
Carlos Nunes
Quarta-Feira, 21 de Maio de 2025, 07h09