A Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) acatou um recurso proposto pela defesa do ex-chefe da Defensoria Pública de Mato Grosso, André Luiz Prieto, e revogou um decreto de revelia que havia sido imposto em um processo em que ele é réu. Com isso, será aberto novo prazo para que ele apresente as alegações finais na ação penal em que ele responde por peculato, no caso conhecido como ‘farra das passagens’ envolvendo o órgão que ele comandava.
O juiz Jean Garcia de Freitas Bezerra, da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, havia decretado a revelia de André Luiz Prieto, investigado em uma ação. Com a decisão, a defesa dele deveria ser feita justamente por um integrante da Defensoria Pública, já que o magistrado entendeu que a não apresentação de defesa através de memoriais finais era uma estratégia protelatória.
André Luiz Pietro comandou a Defensoria Pública de Mato Grosso e, no período em que esteve a frente do órgão, o Ministério Público de Mato Grosso (MP-MT) aponta que ele teria participado de uma fraude na contratação da Mundial Viagens e Turismo Ltda. Segundo o órgão ministerial, foram superfaturadas 104 horas de aeronave bimotor, sendo pago a quantia de R$ 1.550,00 por cada hora e, assim, compondo prejuízo parcial na ordem de R$ 161,2 mil.
Consta ainda na inicial que foram superfaturadas 30 horas de aeronave monomotor, sendo pago a quantia de R$ 1.190,00 por cada hora e, assim, compondo prejuízo parcial na ordem de R$ 35,7 mil. Além de André, a ação movida pelo Ministério Público de Mato Grosso (MP-MT) cita o então chefe de gabinete de Prieto, Emanoel Rosa de Oliveira, e a empresa contratada para fazer os voos, que tem como sócio Luciomar Araújo Bastos.
Na ação, era apontado que André Luiz Prieto, que inicialmente advogava em causa própria, foi intimado para apresentação das alegações finais, mas que deixou transcorrer o prazo sem entregar a peça. Após a constituição de novo advogado em 11 de dezembro de 2024, o prazo foi novamente concedido, porém, mais uma vez, não houve juntada do material aos autos.
Posteriormente, foi feita a intimação pessoal de André Luiz Prieto para constituição de novo advogado e apresentação das alegações finais, mas o ex-chefe da Defensoria não foi localizado no endereço informado nos autos. Em sua decisão, o magistrado de primeiro piso apontou que após a análise do histórico processual, ficou constatado que a postura do réu é nitidamente protelatória à regular tramitação do processo.
Ao apelar da decisão, o ex-defensor geral afirmava que não foi devidamente intimado para ofertar os memoriais finais na ação penal, mas que mesmo assim, o juízo decretou sua revelia e determinou a remessa dos autos à Defensoria Pública para que o defendesse. André Luiz Prieto apontou que a oficial de justiça não conseguiu intimá-lo porque foi a sua residência em horário comercial, período em que se encontrava em seu local de trabalho.
Ele voltou a alegar que reside no mesmo local há aproximadamente 15 anos e que, antes mesmo de decretar a revelia, o magistrado de primeiro piso deveria ter determinado sua intimação por meio de edital, o que não ocorreu. André Luiz Prieto afirmou ainda que a apresentação da defesa final pela Defensoria Pública gerou manifesto prejuízo à sua defesa técnica.
Na decisão, o relator do habeas corpus, o desembargador Paulo Sérgio Carreira de Souza, que durante a tramitação da ação penal, em junho de 2024, André Luiz Prieto apresentou uma questão de ordem, ocasião em que pediu o trancamento da ação penal, por ausência de justa causa, pois havia sido absolvido na ação civil pública de improbidade administrativa que apurava os mesmos fatos. À ocasião, o juiz de primeiro piso negou o pedido, determinando a intimação para que ele apresentasse memoriais finais.
O ex-defensor geral propôs uma nova apelação àquela decisão, tendo na mesma oportunidade constituído um novo advogado. Foi citado pelo relator que a oficial de justiça tentou intimar André Luiz Prieto tanto de maneira presencial, quanto por meio telefônico, porém, sem sucesso.
No entendimento do relator, havendo pendência de apresentação dos memoriais finais, o fato de o acusado, que advogava em causa própria, ter comparecido em juízo posteriormente para postular o trancamento da ação penal já seria suficiente para que o processo fosse remetido à Defensoria Pública para o oferecimento das derradeiras alegações.Também foi refutada a tese de que o ex-defensor residia no mesmo condomínio há 15 anos, já que o funcionário da portaria informou que André Luiz Prieto não figurava na lista de moradores.
Ele chegou a alegar que a residência estava no nome de sua empresa, mas o magistrado apontou que a administração condominial detém o controle da identificação nominal das pessoas físicas que efetivamente ocupam as unidades sob sua gestão. “A rotina condominial — que envolve a entrega de correspondências, alimentos, encomendas e notificações administrativas etc. — demanda a identificação precisa dos ocupantes de cada residência, circunstância que enfraquece a tese defensiva. Em suma, evidentemente, não prospera a alegação defensiva de que Juízo a quo tolheu-lhe a possibilidade de ofertar os memoriais finais em tempo e modo adequados. Diante do exposto, em sintonia com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, denego a ordem”, diz o voto do relator.
No entanto, o desembargador Rui Ramos Ribeiro divergiu deste entendimento, apontando que a oficial de justiça, em vez de ir à unidade do condomínio discriminada no mandado para efetivar o ato ou, pelo menos, confirmar se o destinatário residia ou não no local, apenas passou na portaria. O magistrado entendeu que é preciso considerar que o condomínio nem sempre dispõe de lista de moradores atualizada, e o porteiro não é pessoa capacitada para fornecer essa informação.
“O oficial de justiça deve se dirigir à unidade condominial, a qual pertence o imóvel indicado no mandado. Ainda que se alegue que o paciente foi intimado em diversas ocasiões, o magistrado que preside o processo superou a questão e proferiu uma nova decisão que determina a intimação pessoal. Não há insurgência contra essa determinação judicial. Nesse sentido, e considerando que este processo já apresenta uma série de sobressaltos, entendo por bem determinar a restituição do prazo para a apresentação das alegações finais.”, opinou.
O desempate se deu através do voto do desembargador Jorge Luiz Tadeu Rodrigues, que também entendeu que a intimação não seria válida, já que o oficial de justiça compareceu a uma portaria e o porteiro, que talvez não conhecesse bem a lista de moradores e simplesmente informou que o ex-defensor geral não constava na lista. “O porteiro poderia ter consultado a lista de forma superficial e se enganado, e, ainda assim, dar-se-ia o ato por realizado. Não entendo assim. Em alguns casos, Vossas Excelências são testemunhas, declaro a nulidade somente a partir do defeito desse ato. Assim, para seguir minha coerência, acompanho o voto divergente para que a ação seja retomada a partir deste momento, e o paciente seja intimado, a partir de hoje, para a apresentação das alegações finais”, opinou.