Treze posseiros e produtores rurais foram denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) suspeitos de envolvimento em invasões na terra indígena Marãiwatséde, na região nordeste de Mato Grosso. A área, de 165 mil hectares, fica entre as cidades de Alto Boa Vista, São Félix do Araguaia e Bom Jesus do Araguaia e por 20 anos foi disputada entre a União e posseiros. A região foi demarcada pelo governo federal como terra indígena xavante. A denúncia foi divulgada na terça-feira (15).
De acordo com o MPF, entre os anos de 2012 e 2013, 97 famílias foram retiradas da terra xavante após decisão judicial do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou a imediata retirada dos não-índios do local. A denúncia contra o grupo surgiu após essa retirada dos posseiros que passaram a atrapalhar o processo para liberar a área e tentaram por diversas vezes reocupar as terras.
Conforme o MPF, as 13 pessoas foram denunciadas pelos crimes de invasão de terras públicas, resistência, associação criminosa, incêndio, roubo, corrupção ativa, incitação ao crime e crime de dano. Alguns dos denunciados faziam parte da Associação dos Produtores Rurais de Suiá-Missú (Aprosum). O G1 não conseguiu contato com representantes da associação.
Os denunciados teriam formado uma ‘organização’ que cometeu diversos crimes, entre eles ameaças contra policiais rodoviários e militares que trabalhavam na retirada dos posseiros, invasão e destruição de uma sede da Fundação Nacional do Índio (Funai) e diversas ameaças a líderes que apoiavam a causa indígena na região do Araguaia.
Rodovias foram bloqueadas, carros oficiais destruídos e ocorreram conflitos entre os posseiros e policiais. Uma operação da Polícia Federal, em agosto de 2014, prendeu os principais líderes do grupo.
“Aglomerados no Posto da Mata com incentivo, apoio e financiamento de grandes fazendeiros e políticos da região, um grupo de posseiros decidiu resistir de todas as formas possíveis ao cumprimento da ordem judicial. A partir daí, uma série de fatos criminosos se sucederam, todos promovidos pela associação criminosa denunciada, visando impedir de todas as maneiras a ação dos órgãos federais que auxiliaram a Funai no plano de desintrusão da terra indígena", esclareceu o MPF no texto da denúncia.
A região conhecida como ‘Posto da Mata’ denominava o núcleo urbano onde viviam alguns moradores. Segundo o MPF, os ‘líderes’ do grupo tentavam convencer a opinião pública de que o retorno do povo xavante ao território prejudicaria supostos direitos de pequenos produtores rurais e famílias humildes.
No entanto, as investigações demonstraram que se tratava, na verdade, de uma ação articulada para manipular grupos populares para defender os interesses de grandes produtores rurais e políticos da região, que tinham fazendas dentro dos limites de Marãiwatsédé.
O grupo denunciado coagia e mobilizava famílias até de outras cidades para transportá-las, com todos os seus pertences, para dentro da terra indígena. Os invasores recebiam apoio logístico, lonas e alimentação do grupo criminoso, que lhes prometia ainda glebas de terra no interior da área indígena.
“As manifestações e os crimes foram efetivamente orquestrados, coordenados, financiados estimulados pela associação criminosa da qual fazem parte todos os denunciados, conforme comprovado nos autos e cabalmente demonstrado na análise de cruzamento de ligações telefônicas’, afirmou o MPF na denúncia.
Ainda de acordo com a denúncia, o grupo também impediu a saída de posseiros da área, ameaçando queimar veículos e gado de ex-posseiros que tentassem sair da região.
De acordo com a Funai, o povo xavante ocupa a área Marãiwatsédé desde a década de 1960. Nesta época, a Agropecuária Suiá-Missú instalou-se na região. Em 1967, índios foram transferidos para a Terra Indígena São Marcos, na região sul de Mato Grosso, e lá permaneceram por cerca de 40 anos.
A Funai diz que em 1992- quando iniciaram-se os estudos de delimitação e demarcação da Terra Indígena - Marãiwatsédé começou a ser ocupada por não índios. O ano de 1998 marcou a homologação, por decreto presidencial, da Terra Indígena.
No entanto, diversos recursos impetrados na Justiça marcaram a divisão de lados entre os produtores e indígenas. Em 2012 ,durante a desintrusão judicial, houve confronto no primeiro dia de operação. Ainda em janeiro de 2013, Marãiwatsédé foi devolvida oficialmente aos indígenas.
Um ano após, em janeiro de 2014, as famílias decidiram voltar para a área alegando não terem recebido a assistência prometida pela União. Em abril do mesmo ano, após nova invasão, chegou ao fim a nova reintegração de posse realizada pelos agentes federais.