Em decisão unânime, a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso jugou extinto sem resolução de mérito um habeas corpus que tentava derrubar todas as decisões da 7ª Vara Criminal de Cuiabá relativas à Operação Zircônia. A estratégia dos investigados sob acusação de integrar uma organização criminosa que falsificava diplomas e certificados por intermédio de três faculdades de Cuiabá, hoje réus em ação penal, era retirar o caso da Justiça comum e transferir para a Justiça Federal. Contudo, essa tentativa não deu certo.
A defesa da professora e empresária, Maria Madalena Carniello, e do empresário Victor Hugo Carniello Delgado, que se apresentava como “reitor” das faculdades envolvidas no esquema, alegou que a 7ª Vara Criminal de Cuiabá “é absolutamente incompetente para processar e julgar a ação penal ajuizada em 1º grau, na medida em que, considerando que referidos pronunciamentos judiciais interferem diretamente no exercício da atividade comercial de instituições de ensino superior devidamente regulamentadas pelo Ministério da Educação, compete à Justiça Federal o processamento do feito”.
No entanto, tal argumento foi rejeitado pelo relator do habeas corpus, o desembargador Gilberto Giraldelli, cujo voto foi acolhido integralmente pelos demais julgadores. Eles também mantiveram a eficácia das medidas cautelares diversas da prisão decretadas pela juíza Ana Cristina Mendes contra os réus e também a decisão que determinou a suspensão das atividades econômicas, o bloqueio das contas e o sequestro de bens das empresas investigadas, em especial, a Faculdade Poliensino.
Conforme o acórdão do julgamento, as teses alegadas pela defesa no habeas corpus não foram submetidas à análise da magistrada de 1ª instância, de modo que apreciá-las em sede de habeas corpus no Tribunal de Justiça, configuraria indevida supressão de instância. O parecer do Ministério Público Estadual (MPE) também foi nesse sentido, para extinguir o habeas corpus sem exame de mérito.
O relator Gilberto Giraldelli concordou com a tese de supressão de instância e enfatizou que o processo deve ser examinado uma vez perante a instância primitiva e reexaminado pelas cortes superiores. “A condição da autoridade coatora é que determina a competência para o julgamento do writ nas instâncias superiores, sendo evidente que, inexistindo apreciação da matéria pelo juiz singular, impossível considerá-lo como responsável por eventual constrangimento ilegal”, escreveu o relator em trecho de seu voto.
“Partindo dessas premissas e considerando que, na hipótese, inexiste comprovação inequívoca de que a alardeada incompetência do juízo da 7ª Vara Criminal de Cuiabá/MT foi enfrentada em primeira instância, entendo ser incabível a sua apreciação diretamente por esta instância revisora, uma vez que isto configuraria indevida supressão de instância. Oportuno ressaltar, por fim, que os demais pedidos formulados nesta impetração apontando uma suposta ilegalidade do juízo coator, no que pertine à concedida substituição da prisão preventiva anteriormente decretada, por cautelares diversas da prisão tais como a apreensão de bens, monitoramento eletrônico entre outras, tem como causa de pedir a mesma alegada incompetência do juízo de primeiro grau”, votou Gilberto Giraldelli. O julgamento do HC foi realizado no dia 8 de dezembro de 2021.
Por fim, o relator enfatizou que inexistindo flagrante ilegalidade a ser sanada pelo Tribunal de Justiça e restando evidente a inexistência de manifestação do juízo da 7ª Vara Criminal de Cuiabá acerca da matéria arguida no habeas corpus, inadmissível seu prosseguimento, sendo de rigor sua extinção, em consonância com a Procuradoria-Geral de Justiça em seu parecer. O HC também buscava beneficiar os réus: Gilberto Louzada de Matos, Marcos Diego de Almeida Gonçalves e Nagila Caroline Teixeira de Araújo.
OPERAÇÃO ZIRCÔNIA
Na Operação Zircônia, deflagrada em 27 de maio de 2021 pelo Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), foram cumpridas 50 ordens judiciais expedidas pela juíza Ana Cristina Mendes, da 7ª Vara Criminal de Cuiabá. Dentre elas, 19 foram mandados de busca e apreensão expedidos para Cuiabá e Várzea Grande, além de uma ordem judicial cumprida no estado de Minas Gerais envolvendo um homem, apontado responsável por uma suposta “parceria” com as três faculdades de Cuiabá.
Também foram cumpridas ordens de bloqueio e sequestro de veículos e dinheiro nas contas dos investigados até o valor de R$ 910 mil. Os alvos são apontados pelo Gaeco como integrantes de uma organização criminosa especializada na oferta, realização de cursos e emissão de diplomas, históricos escolares e certificados de conclusão de cursos de ensino superior sem a devida autorização do Ministério da Educação.
As empresas utilizadas no esquema eram o Centro Universitário Poliensino Ltda ME, IEP Instituto Educacional Polieduca Brasil Ltda ME (Polieduca Brasil), VHER Cursos Educacionais Ltda EPP (MC Educacional). Para dar ares de legalidade e enganar estudantes que decidiam fazer algum curso ou especialização oferecida por eles, o grupo criminoso utilizava indevidamente o nome do Centro Universitário Internacional (Uninter), instituição de ensino com sede em Curitiba (PR). À época, a Uninter afirmou que adotou todas as medidas cabíveis ao tomar conhecimento de que a instituição estava sendo usada pela organização criminosa que atuava em Cuiabá.
De acordo com o Gaeco, cerca de 130 diplomas e 110 históricos escolares falsos foram emitidos pela organização criminosa, com prejuízos na ordem de quase R$ 1 milhão causado a dezenas de alunos que pagavam por cursos de nível superior, estudavam e ao final recebiam diplomas e históricos falsos.