Sob o entendimento de que um governo somente se legitima democraticamente diante de uma oposição que irá questionar todos os seus atos e buscará um consenso comum em prol do bem-estar da sociedade, a desembargadora Nilza Maria Pôssas de Carvalho, do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MT), votou para reformar uma sentença que cassou o mandato do vereador por Primavera do Leste (231 km de Cuiabá), Luis Costa (PDT). Ele foi acionado na Justiça Eleitoral por ter publicado vídeos com fake news e críticas contra o prefeito Leonardo Bortolin (MDB), que disputava a reeleição no pleito de 2020 e sagrou vitorioso.
Na condição de relatora de dois recursos, um interposto pelo vereador cassado, que continua exercendo o mandato normalmente, e outro interposto pelo também vereador Elton Baraldi, o Nhonho (MDB), autor da ação julgada procedente, a desembargadora afirmou que cassação do mandato eletivo é uma punição muito severa. Segundo a magistrada, as provas constantes nos autos não sustentam a cassação imposta pela juíza Lidiane de Almeida Anastácio Pampado, da 40ª Zona Eleitoral, no dia 2 de agosto deste ano. Nilza Carvalho afirmou ainda que o assunto principal, no caso o possível cometimento de fraudes na campanha, deve ser questionado pelo meio processual correto.
Ou seja, uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije), mas o vereador aliado do prefeito ajuizou uma Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime), via processual inadequada. O voto da relatora foi acompanhado pelo juiz-membro do TRE, Jackson Francisco Coleta Coutinho.
Contudo, um pedido de vista do juiz Gilberto Lopes Bussiki, adiou a conclusão do julgamento iniciado nesta terça-feira (23). Dessa forma, na retomada do julgamento na próxima sessão.
Além do voto-vista de Bussiki, também serão registrados os votos dos juízes Luiz Octávio Saboia Ribeiro, Clara Mota Pimenta e Persio Landim, bem como o presidente do TRE-MT, desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha. Foram colocados em pauta dois recursos eleitorais contra a sentença da juíza Lidiane Pampado que julgou procedente a Aime proposta pelo vereador emedebista, aliado do prefeito de Primavera do Leste.
O advogado André William Chormiak fez a defesa do vereador Nhonho (MDB), autor da ação e defendeu a manutenção da sentença. Representando o vereador cassado, Luis Costa, o advogado Luciano Felício Fuck fez a sustentação oral e afirmou que o caso em questão não tratou de ataques à democracia ou ao sistema eleitoral em si, mas uma disputa de narrativas políticas entre situação e oposição no município de Primavera do Leste.
Classificou o caso como uma “contenda política” e pediu que o recurso seja provido para julgar totalmente improcedente a ação de impugnação de mandato eletivo. A Procuradoria Regional Eleitoral deu parecer para reformar a sentença.
Conforme o procurador, Erich Masson, as lives foram realizadas por Luis Costa no exercício da atividade parlamentar e houve algumas informações falsas transmitidas dele na campanha, mas devidamente tratadas nas representações. Ressaltou que ele foi multado por ter descumprido as determinações e enfatizou que a Justiça tem meios de coibir o excesso no uso da liberdade de expressão, podendo, inclusive, limitar o uso das redes sociais.
ERRO TÉCNICO
Ou seja, a Procuradoria reconheceu as fake news, mas avaliou não ser caso de cassação de mandato, por ser uma sanção gravíssima. Segundo a desembargadora Nilza Carvalho, a conduta do vereador Luis Costa deveria ter sido questionadas por meio de uma Aije e não de Aime, como fez o autor que junto vários links de publicações do vereador que faz oposição ao prefeito de Primavera do Leste com supostas declarações fraudulentas.
Por sua vez, a relatora afirmou que a maioria das publicações está dentro do tolerável da crítica ou questionamento das ações praticadas pela Prefeitura de Primavera do Leste. “Vê-se então nos vídeos carreados aos autos se constata que o impugnado agiu no exercido do mandato fazendo uso de suas prerrogativas fiscalizadoras como vereador”, afirmou a desembargadora afirmando que o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral foi acertado, ao se manifestar pelo provimento do recurso que pede a reforça da sentença que cassou o vereador.
Segundo ela, “não existirá democracia sem oposição, é salutar e necessária a realização do contraponto, do questionamento, da fiscalização, e até mesmo da sugestão de soluções”. A magistrada reconheceu que o vereador Luis Costa foi condenado em quatro representações por propaganda eleitoral irregular, pois as propagandas continham manchetes caluniosas difamatórias oriundas de fake news contra o prefeito Leonardo Bortolin.
Mas esclareceu que o foco é saber se as condenações por fake news configuram fraude eleitoral e se seriam suficientes para cassar o mandato eleitoral. “A assertiva não é de fácil resposta, pois estamos diante de um fenômeno novo, as fake news que ainda não existem ferramentas adequadas para mensurar o dano causado na seara eleitoral”, votou a desembargadora citando jurisprudências do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com entendimento de não ser a Aime um meio adequado processual para solução da situação colocada em julgamento.
Nilza Pôssas Carvalo enfatizou que o objeto da ação é a fraude e o meio processual para questionar uso indevido dos meios de comunicação e possíveis abusos, com exceção do econômico, é a Aije, conforme prevê o artigo 22 da Lei complementar 64/90. Ela concordou com a juíza da 40ª Zona Eleitoral quanto à existência da fraude e vídeos publicados para favorecer determinado candidato determinado candidato em detrimento de outro.
“No entanto, entendo que tais condutas , embora nocivas, não tiveram aptidão para afetar a normalidade, a higidez ou legitimidade das eleições o que por consequência afasta a sanção de cassação do diploma”, ponderou a desembargadora. “Em consonância com o parecer ministerial, voto pelo provimento do recurso interposto por Luis Pereira Costa reformando a referida sentença em face do exposto e por consequência voto por prejudicado o recurso aviado por Elton Baraldi por perda superveniente de interesse de agir e do objeto”, votou a relatora.